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Incentivo fiscal, desinformação e hipocrisia

O privilégio é o vilão; o incentivo, do verbo incentivar, observadas as regras estabelecidas, é impulsionador do progresso, aqui e em qualquer lugar civilizado do mundo.

1/11/2023

Vivemos numa quadra da história na qual as questões tributárias assumem um protagonismo que seria muito desejável não viesse camuflado com a desinformação característica do mundo moderno, onde tudo se sabe e nada é corretamente analisado.

A bola da vez são as propositadamente chamadas “renúncias fiscais”, as quais tiveram uma ampla divulgação pelo Governo Federal, especialmente dando nome aos bois de quem as usufrui.

Ora, então onde está a desinformação?

Reside, em primeiríssimo lugar, na própria alcunha que se atribui: renúncia. Como se um mero favor do Estado ao particular seja. Particular esse, em geral, abastado e poderoso, a denotar que os ricos estão a desfrutar de benesses que os menos favorecidos não têm o direito de chegar perto.

É uma falácia, mas chama a atenção sobretudo num momento em que o governo precisa arrecadar mais para cumprir a meta de resultado primário atrelada ao novo arcabouço fiscal. Como referência, dados da Receita Federal/PLOA 2024 apontam que o total de subsídios e desonerações previsto na proposta de lei orçamentária para o próximo ano passa de R$ 520 bilhões, 14,8% maior que o fixado para 2023.

O que chamam de renúncia fiscal é, na grande maioria dos casos, na verdade, uma contrapartida que o Governo concede aos particulares, em troca de uma atividade privada que vise permitir o fomento do país, pois o próprio Governo não possui meios nem recursos para tanto.

Ilustrando. Uma grande empresa multinacional, instalada num grande e financeiramente saudável (na medida do possível) centro urbano, é instada pelo Poder Público a se mudar para algum ponto no rincão desse nosso país continental.

Essa empresa levará o progresso. Gerará empregos. Fomentará a economia da região, de forma direta e indireta.

Porém, temos o conhecido e famigerado “custo Brasil”, que fará com que essa empresa se veja longe das facilidades logísticas, do mercado consumidor, enfim, do que a fez se instalar originalmente justamente naquela cidade.

O que propõe, então, o Governo, seja Federal, estadual e municipal?

Vá e eu, em contrapartida, te concedo um incentivo fiscal. Diferença abissal e evidente entre a renúncia, que se denomina na divulgação, e o que se verifica na prática.

Temos, portanto, na essência, um verdadeiro contrato administrativo, celebrado entre o privado e o público, com direitos e obrigações como sói acontecer em qualquer dos contratos da vida cotidiana.

Direitos = Estado, experimentar o fomento de uma região que não o seria por seus próprios meios; particular, obtém um incentivo fiscal para igualar as condições de competitividade em detrimento do seu descolamento.

Obrigações = Estado, garantir que o incentivo seja honrado, não criando obstáculos nem mudando a regra do jogo no seu curso; particular, cumprir o que previa e expressamente previsto, seja a geração de empregos, seja o aumento de produção, seja a diminuição de preço, seja o que for.

É disso, e somente disso que se trata.

Entretanto, o Estado, em todas as suas esferas, é pródigo em não cumprir com suas obrigações e ao particular cabe somente espernear, em geral sem qualquer eco na sociedade, pois é ele o lado rico da relação.

Fez investimentos milionários e o tal incentivo não foi honrado? Paciência.

Gerou milhares de empregos e um fiscal da receita resolveu não permitir a contrapartida pois a empresa preencheu e entregou o formulário azul, quando deveria ser o preto com bolinhas amarelas? Faz parte.

Mas, agora, em virtude de uma ensandecida necessidade de arrecadar, resolveu-se vilanizar os incentivos fiscais, como se fossem eles a mola que move o país para o atraso, para a pobreza, que impede o progresso e, ao contrário, só privilegia uns poucos.

Os privilégios são, em sua grande maioria, odiosos e devem, sim, ser atacados e exterminados.

Não há qualquer sentido cívico e ético que possa permitir situações de evidente escracho com a sociedade, como, meramente por exemplo, pensões vitalícias e sucessórias, vales-paletó, moradia, caixão e que tais.

Inclusive os incentivos fiscais aos quais as empresas não estejam honrando suas obrigações. Que seja extinto e executado o contrato, com todas as consequências legais e práticas.

Mas também, que se faça o debate correto e justo, sabendo separar o correto do incorreto.

O privilégio é o vilão; o incentivo, do verbo incentivar, observadas as regras estabelecidas, é impulsionador do progresso, aqui e em qualquer lugar civilizado do mundo.

Leonardo Gallotti Olinto
Sócio do Daudt, Castro e Gallotti Olinto Advogados.

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