Princípios do Equador – A crescente preocupação das instituições financeiras com o meio ambiente
Antonio José L. C. Monteiro*
Eduardo de Campos Ferreira*
No contexto da responsabilidade objetiva ambiental, conceito mundialmente estabelecido em que a responsabilização por danos ambientais independe da aferição de qualquer modalidade de culpa, as instituições financeiras tendem a analisar detalhadamente cada empreendimento a ser financiado, principalmente visando evitar o risco potencial de responsabilização do agente financeiro por eventuais danos causados ao meio ambiente pelo empreendedor. No Brasil, esse risco ainda é remoto, visto que não há regulamentação específica nem jurisprudência firmada responsabilizando o agente financeiro pelo dano causado pelo empreendimento financiado. No entanto, o risco é remoto mas não é de ser inteiramente descartado.
Assim, o interesse em financiar grandes empreendimentos tem um limitador natural no interesse de não assumir os riscos sócio-ambientais da atividade financiada, de modo que havendo um risco mínimo que seja de assunção de qualquer responsabilidade derivada da atividade financiada, as instituições financeiras têm optado pela não concessão de crédito.
De outro lado, restando comprovado que a atividade a ser financiada adotará meios adequados de controle dos impactos ambientais, o próprio financiamento se transforma em publicidade favorável ao financiador, atrelando o nome da instituição financeira aos empreendimentos ambientalmente responsáveis.
Além disso, as instituições financeiras assumem outro importante papel no controle das atividades sob o ponto de vista ambiental, ao exigir as competentes licenças e autorizações como condição para a concessão de empréstimos e financiamentos.
Em 4 de junho de 2003 foi lançada a primeira versão do que se denominou “Princípios do Equador”, por meio da qual as instituições financeiras adotaram requisitos para a concessão de financiamentos aos grandes empreendimentos, de valor igual ou superior a 50 milhões de dólares.
Esses empreendimentos somente têm apoio financeiro caso determinadas imposições sócio-ambientais sejam respeitadas pelo empreendedor. Assim, além das exigências advindas da legislação de cada um dos países em que os empreendimentos estão localizados, as instituições financeiras submetem os projetos aos seus próprios requisitos de controle ambiental, tudo visando garantir a sustentabilidade do empreendimento.
Em 6 de julho de 2006 as grandes instituições financeiras mundiais (“Equator Principles Financial Institutions – EPFI”) aprovaram a segunda versão dos Princípios do Equador, ampliando ainda mais o rol de projetos submetido à uma análise ambiental mais rigorosa para a concessão de financiamentos.
A nova versão dos Princípios do Equador, que já foi adotada por mais de 50 dos principais grupos financeiros mundiais, apresenta algumas mudanças significativas na análise da sustentabilidade ambiental dos projetos a serem financiados.
A primeira e principal mudança adotada pelas instituições financeiras foi a ampliação significativa do escopo desse novo protocolo, já que atinge um número muito maior de projetos, dado que estão submetidos a essa nova versão do protocolo os projetos que envolvem investimentos na faixa de 10 milhões de dólares. Ao mesmo tempo, estão também submetidos a esse controle de sustentabilidade os pedidos de assessoramento financeiro.
A maior amplitude de alcance da nova versão dos Princípios do Equador está diretamente relacionada à crescente preocupação das grandes instituições financeiras com os empreendimentos de infra-estrutura em países emergentes. Muitas vezes as exigências extrapolam as legislações locais justamente para evitar a proliferação de empreendimentos não ambientalmente sustentáveis em países onde a legislação é mais permissiva.
As modificações mais significativas introduzidas na nova versão dos Princípios do Equador aprovada em julho de 2006 foram1 :
-Escopo – Enquanto a versão inicial enfocava o financiamento de projetos com investimento mínimo de 50 milhões de dólares, a versão vigente atinge o financiamento e a consultoria financeira de projetos já na faixa de 10 milhões de dólares;
-Avaliação Ambiental – A nova versão dos Princípios do Equador exige dos empreendedores a realização de uma Avaliação Sócio-Ambiental (“Social and Environmental Assessment – SEA”), englobando os impactos sociais e ambientais da atividade, incluindo também a proteção aos direitos humanos, à saúde e segurança da comunidade, e até aspectos trabalhistas. A versão de 2003 se restringia a exigir a realização de estudo ambiental (“Enviromental Assessment - EA”);
-Parâmetros ambientais e sociais – As instituições financeiras agora exigem que a Avaliação Sócio-Ambiental inclua o compromisso de o empreendedor cumprir as exigências legais do país em que estará localizado. No caso de empreendimentos localizados nos chamados países emergentes, o empreendedor deverá ainda cumprir as diretrizes sócio-ambientais estabelecidas pelo International Finance Corporation – IFC;
-Plano de Gerenciamento Sócio-Ambiental – Na versão atual, os empreendimentos caracterizados como Classe A ou B, considerados de alto e médio impacto sócio-ambiental, terão de manter um Plano de Gerenciamento Sócio-Ambiental (“Social and Environmental Management System”), estabelecendo um cronograma de ações corretivas e/ou capazes de minimizar os riscos e impactos ambientais;
-População impactada – Os projetos ambientalmente impactantes localizados em países em desenvolvimento e/ou subdesenvolvidos devem consultar a comunidade afetada pelo empreendimento, incluindo populações indígenas, garantida sempre independência e isenção nesse processo de consulta. O empreendimento também deverá contar com mecanismos de aferição dos pleitos da comunidade e do atendimento respectivo (“Grievance Mechanism”);
-Auditoria independente – A Avaliação Sócio-Ambiental, o Plano de Gerenciamento Sócio-Ambiental e o Grievance Mechanism deverão ser aprovados por um auditor externo independente, sem qualquer tipo de vínculo com o empreendedor;
-Relatórios Anuais – As instituições financeiras deverão publicar, ao menos anualmente, relação dos projetos submetidos aos Princípios do Equador e devidamente aprovados.
Os Princípios do Equador vão paulatinamente assumindo um importante papel de “controle não governamental” das atividades social ou ambientalmente impactantes. Ao privilegiarem a concessão de crédito às atividades social e ambientalmente sustentáveis, criam um novo parâmetro de desenvolvimento e de resto minimizam o risco, que já é palpável em outros países, de os agentes financeiros responderem pelos danos advindos das atividades que financiam.
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1Fonte: “Financiers and the Environment: Equator Principles II”, Client Briefing, publicado em 31.7.2006, William L. Thomas e Nigel Howorth, Clifford Chance (disponível em www.cliffordchance.com)
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*Advogados do escritório Pinheiro Neto Advogados
* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.
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