A questão da restituição de indébito tributário sempre foi objeto de intensos debates no cenário jurídico brasileiro. Recentemente, o STF trouxe um novo entendimento sobre o tema ao julgar o recurso extraordinário 1.420.691 em agosto, estabelecendo a tese associada ao tema 1.262.
O julgamento do tema 1.262 pelo STF
O STF, por consenso unânime, estabeleceu a tese de que:
"Não se mostra admissível a restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do artigo 100 da Constituição Federal".
Esta decisão reforça a impossibilidade de se buscar a restituição de indébito tributário por via administrativa quando ele já foi reconhecido judicialmente.
A distinção com o tema 831
Em um primeiro momento, poderíamos argumentar a existência do julgamento do tema 831, relatado pelo Ministro Fux, que prescreve que "o pagamento dos valores devidos pela Fazenda Pública entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva deve observar o regime de precatórios previsto no artigo 100 da Constituição Federal".
Poderíamos entender que estaria válido, então, o pleito de restituição do indébito com origem nos fatos geradores anteriores à ação judicial.
No entanto, durante o julgamento do tema 1.262, foi ressaltada a distinção entre os dois temas. O tema 1.262 trata da possibilidade de restituição administrativa dos valores cobrados a maior nos 05 anos que antecederam a impetração do mandado de segurança. Já o tema 831 se restringia ao período atinente à data da impetração e da concessão de ordem mandamental.
Implicações Práticas
A decisão do STF no tema 1.262 tem implicações significativas para a prática tributária. A partir de agora, mesmo que o fato gerador que deu origem ao indébito seja anterior ao reconhecimento judicial, não será mais possível realizar o pedido administrativo de restituição dos valores.
Esta decisão, que se distingue do tema 831, reforça a necessidade de observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do artigo 100 da Constituição Federal, para qualquer pedido de restituição de indébito tributário reconhecido judicialmente, independente do momento de constituição.
A compensação como alternativa à restituição de indébito tributário reconhecido judicialmente
Embora o STF tenha estabelecido a impossibilidade de restituição administrativa de indébito tributário reconhecido judicialmente, uma nova orientação da Receita Federal do Brasil - RFB reafirma a possibilidade de compensação de tais créditos.
Recentemente, a Solução de Consulta número 164 de 7 de agosto de 2023, emitida pela RFB, reafirmou a possibilidade de compensação de créditos tributários decorrentes de ação judicial. Segundo a Solução de Consulta:
“O crédito tributário decorrente de ação judicial pode ser executado na própria ação judicial para pagamento, via precatório ou requisição de pequeno valor, ou ainda, por opção do sujeito passivo, ser objeto de compensação com débitos tributários próprios na via administrativa”.
Procedimentos administrativos
Ao optar pela compensação na via administrativa, o contribuinte deve seguir o disciplinamento da matéria pela RFB, conforme Instrução Normativa 2.055 de 2021. A declaração de compensação será recepcionada pela RFB somente depois de prévia habilitação do crédito pela Delegacia da Receita Federal do Brasil - DRF ou pela Delegacia Especializada da RFB com jurisdição sobre o domicílio tributário do sujeito passivo.
Implicações práticas da compensação
Esta orientação oferece uma alternativa aos contribuintes que, cientes da subsistência do negócio com recolhimentos de tributos futuros, podem se valer da compensação como forma de "recuperar" valores pagos indevidamente. É uma opção especialmente relevante para empresas com fluxo constante de obrigações tributárias, permitindo uma gestão mais eficiente dos recursos.
Conclusão
Embora a restituição administrativa de indébito tributário reconhecido judicialmente esteja vedada, a compensação mantem-se como uma alternativa viável e recentemente esclarecida pela RFB. Esta opção, que deve ser realizada sob os procedimentos administrativos específicos, oferece uma via para os contribuintes recuperarem créditos tributários, alinhando-se às necessidades de um ambiente empresarial dinâmico.
De toda sorte é importante não descartar a via do precatório. Este mecanismo continua sendo uma opção relevante em determinados cenários. Por exemplo, se o contribuinte não possui débitos futuros que possam ser compensados, a obtenção de um precatório pode ser a melhor — ou talvez a única — forma de recuperar os valores pagos indevidamente.
Além disso, os precatórios podem ser estrategicamente utilizados em transações tributárias. Estas são negociações entre o contribuinte e a Fazenda Pública que, em algumas situações, permitem o uso de precatórios para abater dívidas tributárias. Portanto, mesmo com as novas diretrizes e possibilidades, o precatório não perdeu seu lugar no palco das opções disponíveis para a gestão de créditos tributários.
Em resumo, a saga tributária é repleta de reviravoltas e estratégias. Cada mecanismo — seja a compensação ou o precatório — tem seu próprio conjunto de vantagens e limitações, e a escolha entre eles deve ser feita com base em uma análise cuidadosa do perfil e das necessidades do contribuinte.