A mesma legislação que impõe deveres também oferece um escudo: o da boa-fé.
Quando se fala em sociedades anônimas, imagina-se imediatamente os titãs da indústria e do comércio, as instituições financeiras, com seus arranha-céus corporativos e salas de reuniões de alto nível. Por trás dessas entidades poderosas, estão os administradores – diretores e conselheiros que orquestram as operações diárias e decisões estratégicas. Mas, você já parou para pensar na responsabilidade que esses indivíduos carregam?
Antes de mergulharmos mais fundo, é crucial entender os deveres específicos que a lei das S.A. impõe aos administradores. Primeiramente, eles têm o dever de diligência, que significa agir cuidado e zelo, de forma informada e com avaliações compatíveis com o que decide. Segundo, existe o dever de lealdade, que obriga o administrador a colocar os interesses da empresa acima de interesses pessoais ou de terceiros.
Estes dois deveres fiduciários formam a espinha dorsal da conduta ética e profissional que se espera desses líderes empresariais.
No Brasil, o mapa que guia e às vezes complica a vida desses administradores é a lei 6.404/76, popularmente conhecida como Lei das Sociedades Anônimas. Este documento legislativo não é apenas um conjunto de regras; é praticamente um manual de sobrevivência no mundo corporativo. Ele estabelece os deveres e responsabilidades desses profissionais, desde o modo como devem conduzir suas funções até as penalidades para quem decide, intencionalmente ou não, sair da linha.
Frequentemente, esses administradores são celebrados por seus sucessos e inovações. Contudo, eles também podem ser os vilões da história se suas ações resultarem em prejuízos para a empresa ou, pior ainda, diretamente para os acionistas. E neste ponto, a lei das S.A. é suficiente para satisfazer às necessidades de responsabilização dos responsáveis por malfeitos e ilícitos. Ela estabelece que administradores podem ser pessoalmente responsabilizados por qualquer ato que cause danos à empresa, viole a lei ou desrespeite o estatuto social.
No entanto, vale ressaltar que a lei não é um monstro à espreita, pronta para punir qualquer passo em falso. A mesma legislação que impõe deveres também oferece um escudo: o da boa-fé. Se um administrador agir de acordo com um processo de tomada de decisão informado, e se suas ações forem pautadas pela lealdade e diligência, ele pode ser isento de responsabilidade, mesmo se as decisões tomadas não resultarem nos melhores desfechos para a empresa.
Muitos se perguntam se o Código Civil não deveria ser a bússola para navegar essas águas turbulentas. A verdade é que ele também aborda a responsabilidade de administradores, mas seus artigos estão mais sintonizados com outros tipos de sociedades, como as limitadas. Portanto, na arena das sociedades anônimas, a lei das S.A. é a verdadeira rainha jurídica para impor a responsabilização, quando necessário for.
Em resumo, ser um administrador de uma sociedade anônima é caminhar entre as responsabilidades e deveres fiduciários de forma consciente e equilibrada. Os erros podem ser custosos, mas a lei também permite espaço para a governança consciente e decisões de boa-fé. Afinal, no mundo dos negócios, assim como na vida, nem tudo é pode ser avaliado de forma maniqueísta e radical.
E, assim, os administradores continuam a navegar no mar agitado do universo corporativo, com a lei das S.A. servindo tanto como seu farol orientador quanto seu guardião vigilante. Embora os princípios do Direito Civil possam ser úteis para entender o Direito Empresarial em um sentido mais amplo, as regras específicas para sociedades anônimas são consideradas mais adequadas para tratar da responsabilização de administradores dessas empresas. A responsabilização de administradores em sociedades anônimas possui particularidades próprias que visam refletir essa complexidade. Por exemplo, administradores podem ser responsabilizados por atos que se desviem do “interesse social” da empresa ou que violem a lei ou o estatuto da empresa, mas existem proteções e excludentes de responsabilidade que podem ser invocadas, dependendo do caso.