Migalhas de Peso

Ainda a tributação de pessoas físicas por rendas auferidas no exterior

O governo Federal busca, por mais de uma via, aumentar a arrecadação tributária, desta vez alcançando uma parcela de recursos e aplicações que não eram objeto de tributação até então.

22/8/2023

Em recentes artigos, tratamos do conteúdo da MP 1.171/23, que versa sobre a tributação de bens e direitos no exterior, algo inédito no cenário tributário brasileiro. Tal novidade decorre, entre outros, do fato de se pretender instituir a tributação sobre lucros apurados em pessoas jurídicas situadas no exterior e detidas por pessoas físicas brasileiras, independentemente da distribuição aos sócios.

Em verdade, o governo Federal busca, por mais de uma via, aumentar a arrecadação tributária, desta vez alcançando uma parcela de recursos e aplicações que não eram objeto de tributação até então. A MP 1.171, estava “parada” no Congresso Nacional desde sua publicação, mais especificamente na Câmara dos Deputados, onde ainda aguarda a constituição da comissão mista avaliadora do texto, não tendo, ao menos em âmbito legislativo, evoluído em seu trâmite.

Ocorre que, dada a notória necessidade de arrecadação fiscal pelo atual governo, em 8/8/23, a MP 1.172/23, cujo propósito original era somente o reajuste do salário mínimo, foi convertida no PL de conversão 15/23 (PLV 15), tendo nela sido inserido o texto da MP 1.171 que versa sobre a tributação decorrente de renda auferida no exterior.

Importante destacar que o texto da MP 1.171 já previa um assunto bastante sensível do ponto de vista político: o reajuste da faixa de isenção do Imposto de Renda de Pessoa Física. Assim, a proposta da MP 1.171 claramente era transmitir a ideia de que o Governo estaria tributando aqueles “mais ricos”, com bens e direitos no exterior, para possibilitar a isenção de parcela mais vulnerável da população.

Agora, ao fazer constar no mesmo PLC 15 o reajuste do salário mínimo, o reajuste da faixa de isenção do IRPF e a tributação das rendas de brasileiros auferidos no exterior, pretende o governo Federal justificar a novel tributação dessas rendas pela suposta finalidade social de cumprir suas promessas quanto aos outros temas abordados no texto.

A base do texto do PLV 15 é o mesmo daquele tratado na MP 1.171, com algumas melhorias no que tange às dúvidas e questionamentos suscitados por todos sobre o texto original. A exemplo disso, podemos mencionar os §§ 3º a 5º do art. 8º do PLV 15, que estipulam, de forma mais adequada, a não incidência de IRPF sobre variação cambial de depósitos em conta corrente ou em cartão de débito ou crédito no exterior ou sobre alienação de moeda no ano-calendário equivalente a US$ 5 mil.

Da mesma forma, o texto do PLV 15 traz regras de dedução de IRPF desde que a compensação esteja prevista em acordo ou convenção internacional firmado com o país de origem dos rendimentos ou que haja reciprocidade de tratamento em relação aos rendimentos produzidos no país, algo que a MP 1.171 não previa em seu texto original.

Ainda, o PLV 15 inova ao estipular que “no caso das sociedades, fundos de investimento e demais entidades no exterior com classes de cotas ou ações com patrimônios segregados, cada classe será considerada como uma entidade separada”, algo que traz um esclarecimento importante no que diz respeito à forma de apresentar as informações na declaração de ajuste anual do contribuinte.

Contudo, apesar de importantes esclarecimentos sobre o texto original, o PLV 15 não altera os principais pontos sensíveis da proposta de nova tributação, quais sejam: a controvérsia da tributação sobre a variação cambial como se fosse ganho de capital da pessoa física, a simplificação do tratamento dado aos trusts, o tratamento desigual dado às offshores, no que tange à tributação de lucros não-distribuídos das entidades controladas e a ampliação substancial dos conceitos de aplicações financeiras e rendimentos.

Ao que parece, mesmo com a aprovação ‘à toque de caixa’ do texto do PLV 15 pela manobra da base governista na Câmara dos Deputados, o assunto ainda não está pacificado e, muito menos, tem consenso no Congresso Nacional. A imprensa noticiou, inclusive, que o presidente da Câmara, o deputado Arthur Lira, discordou da ‘fusão’ dos textos das duas MPs, e o tema promete render debates nas próximas semanas.

Fábio Soares Maia Vieira de Souza
Advogado no Braga & Garbelotti - Consultores Jurídicos e Advogados.

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