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Taxação das casas de apostas: comentários sobre a MP 1.182

A medida representa mais um grande passo para a regularização das apostas esportivas no Brasil.

10/8/2023

A MP 1.182 representa mais um grande passo para a regularização das apostas esportivas no Brasil. Publicada em 25/7/23, a medida trouxe importantes alterações na lei 13.756/18, a qual dispõe sobre as apostas de cota fixa, entre outros assuntos. Neste artigo, trataremos das principais mudanças introduzidas pela MP e suas consequências no cenário das apostas esportivas no país.

Primeiramente, as apostas esportivas são uma das modalidades lotéricas previstas no art.14, § 1º, IV da lei 13.756/18. Antes da MP, a lei Federal regulava de forma genérica as apostas, porém, a partir de 2022, começaram os esforços governamentais a fim de regularizar o assunto. Entretanto, é importante ressaltar que até mesmo antes de 2018, embora ainda não regulada no Brasil, essa prática era comum no país, com o apostador operando em casas de apostas estrangerias e sem nenhuma garantia da legislação nacional, estando sujeito a normas estrangeiras que não davam a devida garantia aos brasileiros.

Nesse contexto, a MP 1.182 busca criar um ambiente controlado e minimamente seguro para as apostas esportivas, abrindo espaço para as empresas atuarem de forma legal e transparente. Por exemplo, em seu art. 33, § 1º, a norma estabelece que a casa de apostas terá o dever de promover ações informativas de conscientização dos apostadores e de prevenção do transtorno do jogo patológico.

Nesse sentido, a lei 13.756/18, após as modificações da MP 1.182/23, estabelece a obrigatoriedade de recolhimento de tributos, no caso taxas, sobre as receitas brutas obtidas pelas empresas operadoras de apostas esportivas. Esse recolhimento será destinado aos cofres públicos, representando uma nova fonte de arrecadação para o Estado.

Para os apostadores, o Imposto de Renda deverá ser recolhido à alíquota de 30% sobre o ganho obtido, observada a isenção dos ganhos até o limite de R$ 2.112,00. De acordo com o Ministério da Fazenda, cerca de 70% das apostas estão nessa faixa de isenção. A alíquota é superior à alíquota geral do imposto de renda para as pessoas físicas, o que representa um desestímulo às apostas.

As empresas serão taxadas em 18% sobre o GGR (Gross Gaming Revenue), que é basicamente a receita liquida gerada pelas apostas, ou seja, o total de apostas menos o total de recompensas pagas aos apostadores.  Por exemplo, um jogo de futebol gerou R$100.000,00 para a casa de aposta, porém R$80.000,00 devem ser pagos aos apostadores que acertaram seus palpites, portanto o GGR foi de R$20.000,00 (R$100.000,00 – R$ 80.000,00), sendo a empresa taxada em R$3.600,00 (18% de R$20.000,00).

Os 18% serão distribuídos para outros setores públicos e privados discriminadas pela MP no seu art. 30, na seguinte proporção: Seguridade Social - 56%, Fundo Nacional de Segurança Pública - 14%, ministério do Esporte - 17%, Educação básica - 4% e Clubes e atletas- 9%. Além disso, é importante ressaltar que, além da taxação, as casas de apostas estão sujeitas a tributação regular das demais pessoas jurídicas, tais como IRPJ, CSLL, PIS e COFINS.

O art. 29, § 2º, prevê, efetivamente, apenas a concessão, permissão ou autorização onerosa das apostas esportivas. Sendo a autorização concedida somente para pessoas jurídicas que atenderem a certas exigências do Ministério da Fazenda e devidamente estabelecidas em território nacional. Assim, o § 5º prevê poderes para o Ministério da Fazenda fiscalizar as loterias de apostas, podendo requisitar informações e documentos, determinando sanções (§ 6º) para os descumprimentos ou retardamento injustificado da exigência pública. 

Dessa forma, são criadas barreiras à atuação das casas de apostas no Brasil, as quais serão obrigadas a terem sede no país e a cumprirem certos requisitos legais, consequentemente, causando uma diminuição neste atual “boom” das plataformas de apostas.

O art. 29-A conceitua termos importantes do meio das apostas, tais quais, eventos reais de temática esportiva, quota fixa e agente operador. A conceituação feita, é capaz de evitar os “termos indeterminados” na legislação, o que será muito importante, principalmente, no momento da taxação, na qual não poderá haver dúvidas terminológicas.

A MP traz também alterações importantes na sua redação que merecem atenção. O art. 17, II, i e o art. 20, V, alteram a palavra “entidade” por “órgão”, o que é capaz de trazer relevantes consequências para aqueles beneficiados pela arrecadação. As entidades possuem personalidade jurídica, enquanto os órgãos não.  Assim, na antiga redação, a União poderia diretamente receber os produtos da arrecadação tributária das apostas esportivas, uma vez que é uma entidade com personalidade jurídica. Entretanto, com a nova redação, isto não mais seria possível, sendo esta arrecadação destinada, por exemplo, a algum Ministério, no caso, o Ministério do Esporte que é um órgão vinculado à União. É válido ressaltar que não há uma hierarquia, muito menos, subordinação entre órgão e entidade, havendo apenas uma vinculação.

Outro ponto relevante trazido pela MP é a exclusão, no art. 29, da competência exclusiva da União sobre as apostas esportivas na forma de serviço público e a supressão do substantivo “todo” que era empregada na frase “todo território nacional”, gerando uma aparente limitação da exploração comercial das apostas esportivas nos limites do país.  A competência para regulamentar as apostas esportivas passa a ser compartilhada com os Estados e Municípios. Isso pode gerar uma maior diversidade de legislações e regulamentações em diferentes localidades, o que pode criar um cenário complexo e heterogêneo para as empresas operadoras e os apostadores.

Por outro lado, o presidente da comissão mista, Jorge Kajuru, em entrevista, explicou que falta discutir melhor a questão das casas de apostas e não ficar apenas preocupado com a regularização. Para o senador, a manipulação de resultados e as casas de apostas estão muito conectados, uma vez que elas que pagam os apostadores os quais induzem os atletas profissionais a, por exemplo, simularem penalidades e a receberem cartões de propósito. Assim, na opinião de Kajuru, a MP falha no aspecto de conter as manipulações e as fraudes no esporte. Desse modo, é necessário que os parlamentares voltem sua atenção não somente na arrecadação, como também na preocupação do “jogo limpo e transparente”.

Dessa forma, foi possível explorar alguns bons pontos das alterações feitas pela MP 1.182 na lei 13.756/18. A MP com certeza é uma evolução para uma devida regularização das apostas esportivas no Brasil, porém, ainda não é o momento de se esgotar esforços, uma vez que ainda há um longo caminho a ser percorrido. A MP torna-se lei apenas quando é aprovada nas duas Casas do Congresso Nacional e sancionada pelo presidente da República, podendo, durante esse processo, sofrer emendas e alterações. Por enquanto, a MP irá vigorar por 60 dias, prorrogável por igual período, caso não se torne lei durante este intervalo, perderá sua eficácia.

Caio César Morato
Advogado especialista em Direito Tributário.

Mathews Otto Schutze
Colaborador no escritório Rayes e Fagundes Advogados Associados.

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