É crescente a busca por ferramentas para otimizar a produção de contratos. Melhor dizendo: para otimizar a negociação das operações econômicas. Isso porque os agentes econômicos cresceram, a comunicação ficou mais fácil e os seus auxiliares jurídicos se tornaram especialistas. Não há espaço, tampouco recursos financeiros sobrando, para negociações inúteis que irão findar em contratos que já nascerão impraticáveis. Nesse cenário, o Design Contratual surge como uma ferramenta de dilapidação do processo de construção dos documentos que regem uma contratação entre agentes econômicos.
O Design Contratual, área completamente diversa do Visual Law, é o estudo que tenta refletir nos documentos contratuais o raciocínio estratégico das operações econômicas. O estudo mergulha de fato na realidade das negociações de contratações complexas, deixando de lado os conceitos dogmáticos, para construir documentos funcionais. Dessa forma, a construção dos contratos, quando feita sob a ótica do Design Contratual, visa concentrar-se na essência da operação econômica e naquilo que realmente irá influenciar nessa essência, a fim de que o custo da transação não aumente, por conta de negociações desnecessárias.
Assim, a lógica do Design Contratual concentra-se em construir regras práticas e mecanismos que integrem a previsão jurídica e o relacionamento das partes.
Estudiosos do Design Contratual trouxeram 5 diagnósticos da realidade das contratações empresariais.
O ponto de partida para estudo desses diagnósticos, é o fato de que contratar é custoso, ou seja, contratar (ao invés de produzir internamente), custa dinheiro. É o que chamamos também por custos de transação.
Vamos então aos diagnósticos realizados:
1. Racionalidade limitada: os Agentes econômicos (as partes que negociam e celebram os contratos) não possuem tempo ou recursos suficientes para ter todas as informações necessárias para concluir a contratação de maneira perfeita. Essas limitações são dadas pelo tempo e pelos custos que envolvem a negociação da operação econômica.
2. Incerteza: Os Agentes econômicos estão sempre operando com uma margem de incerteza, já que, muito por conta da Racionalidade Limitada, não possuem meios de saber se o terreno onde estão pisando é totalmente seguro. Isso inclui o desconhecimento das atitudes que serão tomadas pela outra parte, em um cenário de ocorrência de evento previsto ou não previsto no contrato. Paula Forgioni esclarece a temática envolvendo a incerteza:
“Acostumamo-nos a pensar os negócios como se tudo ou quase tudo pudesse ser previsto no momento de sua assinatura. Neste contexto ideal, aquilo que faltaria seria completado pela lei e, no máximo, pelos usos e costumes comerciais. Sabemos que essa situação é utópica. Contratos são, por natureza, incompletos e maior sua complexidade, mais as lacunas far-se-ão sentir.
Os economistas, nas últimas décadas, chamaram a atenção para o fenômeno dos contratos incompletos e os desafios que apresentam. Não se consegue e não se quer prever tudo nos instrumentos contratuais. Isso é explicado a partir de três aspectos dos custos de transação:
I existência de contingências imprevistas [unforeseen contingencies], pois as partes não podem definir ex ante todas as vicissitudes futuras, incluindo o comportamento inesperado do parceiro;
II custo da redação de contratos [cost of writing contracts), pois, ainda que todas as contingências fossem previsíveis, mostrar-se-ia excessivamente custoso descrevê-las e prevê-las no contrato;
III custo de execução do contrato [cost of enforcing contracts], pois, diante de contingencias e comportamentos imprevistos, não é fácil aos julgadores compreender o que foi avençado e dar-lhe concreção.”1
3. Risco do oportunismo: Os Agentes econômicos terão sempre que tentar prever e prevenir o oportunismo da outra parte. Isso porque o papel do documento (contrato) é prever ao máximo as situações de risco à operação. Muitos se perguntam: "se o risco da outra parte não cumprir o contrato é tão grande, a ponto de nos fazer refletir no contrato, as consequências do descumprimento, o correto é sequer celebrar esse negócio!". Ocorre que, na realidade, sabemos que quando há um descumprimento contratual, dificilmente as partes recorrem ao contrato primeiro, para verificar quais medidas podem ser tomadas. Pelo bem das relações comerciais, as partes preferem dialogar e entrar em um acordo. De toda forma, prever as consequências no instrumento contratual é necessário e custa dinheiro.
4. Especificidade do ativo: Quando se diante de um ativo com grande valor e de difícil substituição, é natural se esperar mais diligência e proteção.
5. Ambiente institucional: O ambiente no entorno da operação precisa estar preparado para entender aquela operação, ou seja, celebrar um contrato com uma parte conhecedora do serviço ou produto, geralmente, custa menos dinheiro. Por outro lado, celebrar um contrato cuja outra parte não tem conhecimento sobre o que se está tratando, demanda maior tempo de negociação. Isso inclui prever, inclusive, o foro onde qualquer problema oriundo do contrato poderá ser tratado, eventualmente. Por exemplo: considerando a existência de diversos tribunais arbitrais especializados hoje em dia, as partes podem decidir por remeter o foro do contrato a um desses tribunais, em detrimento de uma comarca judiciária com pouco conhecimento no assunto.
Dessa forma, as 5 variáveis condicionam os agentes econômicos a escolher quais mecanismos eles necessitarão para guiar as operações econômicas que celebram e naturalmente, isso reflete na decisão de quanto será dedicado para se criar salvaguardas contratuais. É o que diz Paula Forgioni:
“Embora seja útil a tentativa doutrinária de definição do que seriam os “contratos complexos”, ainda se está longe de sua delimitação mais acurada e das consequências jurídicas que daí advirão. Todavia, é indispensável que quanto maior a complexidade do contrato, maiores as cautelas que as partes tomarão quando de sua celebração, até mesmo porque valerá a pena arcar com maiores custos para dirimir as contingências futuras.”2
Tendo por base o conceito de Design Contratual, os Agentes econômicos realizam seus negócios por meio de estruturas contratuais feitas para antever e prevenir as partes das consequências de um cenário de disputa, que podem surgir em decorrência dos 5 diagnósticos apresentados acima, apesar de não existir contrato que consiga impedir prejuízo decorrentes de má-fé.
É claro que os diagnósticos observados não são a regra ou devem ser entendidos como únicas bases possíveis, mas podem facilitar o entendimento do que é essencial em uma operação econômica complexa.
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1 Contratos Empresariais. Teoria geral e aplicação. FORGIONI, Paula. 7ª edição, página 61.
2 Contratos Empresariais. Teoria geral e aplicação. FORGIONI, Paula. 7ª edição, página 59.
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O design da ruptura dos contratos empresariais de prazo determinado. BUTRUCE, Vitor. Tese de Doutorado para Universidade de São Paulo, 2019.
Da extinção do contrato. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (coord.). Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2011. v. VI. t. II.
Contratos Empresariais. Teoria geral e aplicação. FORGIONI, Paula. 7ª edição.
GOMES, Orlando. Obrigações. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006
MARTINS-COSTA, Judith. Autonomia privada, confiança e boa-fé.