É notório que a citação é ato processual, pelo qual, o réu (executado ou interessado), além de ser cientificado sobre a existência de processo ajuizado contra si, é convocado para integrar a relação processual, conforme artigo 238 do Código de Processo Civil.
Neste sentido, a teor do que dispõe o artigo 239 do Código de Processo Civil, a citação é pressuposto de validade do processo, ressalvadas as hipóteses de indeferimento da petição inicial ou de improcedência liminar do pedido, quando a citação é dispensada.
Assim, como ensina o Professor José Miguel Garcia Medina : “(...) pode-se afirmar que o processo é ineficaz em relação ao réu ainda não citado.”
Em igual sentido, ensina o Professor Humberto Theodoro Júnior: “Tão importante é a citação, como elemento instaurador do indispensável contraditório no processo, que sem ela todo o procedimento se contamina de irreparável nulidade, que impede a sentença de fazer coisa julgada.”
Portanto, sendo a citação (válida) pressuposto de validade do processo, tem-se que a inobservância das prescrições legais, acarretam sua nulidade, conforme artigo 280 do Código de Processo Civil.
Dentre as formas de citação, para o presente artigo, destaca-se aquela prevista no artigo 248, parágrafo quarto, do Código de Processo Civil:
Art. 248. Deferida a citação pelo correio, o escrivão ou o chefe de secretaria remeterá ao citando cópias da petição inicial e do despacho do juiz e comunicará o prazo para resposta, o endereço do juízo e o respectivo cartório.
§ 4º Nos condomínios edilícios ou nos loteamentos com controle de acesso, será válida a entrega do mandado a funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência, que, entretanto, poderá recusar o recebimento, se declarar, por escrito, sob as penas da lei, que o destinatário da correspondência está ausente.
Sem correspondência no Código de Processo Civil de 1973, o artigo 248, parágrafo quarto, do Código de Processo Civil, foi inserido com o advento do Código de Processo Civil em 2015.
Conforme se infere pelo mencionado dispositivo legal, é válida a citação postal quando o mandado é recebido pelo funcionário da portaria (responsável pelo recebimento de correspondência) nos condomínios edilícios ou nos loteamentos com controle de acesso.
Ainda, de acordo com o mencionado dispositivo legal, o funcionário da portaria poderá recusar o recebimento, se declarar, por escrito, sob as penas da lei, que o destinatário da correspondência está ausente.
Sobre a relevância da figura do funcionário da portaria, o Professor José Miguel Garcia Medina destaca: “(...) atuará como representante do demandado, devendo assinar, em seu próprio nome, o aviso de recebimento (que, como regra, deve ser assinado pelo citando, cf. § 1.º do art. 248 do CPC/2015).”
Não há dúvidas, portanto, da relevância do papel do funcionário da portaria, pois atuando como verdadeiro representante do condômino/morador no recebimento da citação postal em nome do condômino/morador, deve promover, sob as penas da Lei, a entrega do mandado.
Assim, na hipótese de citação em discussão, a presunção de recebimento do mandado de citação postal pelo réu é relativa, cabendo ao réu comprovar que não recebeu o mandado de citação.
Por exemplo, na hipótese de o réu ter se mudado anteriormente ao recebimento do mandado de citação postal pelo funcionário da portaria, cabe ao réu o ônus de comprovar que não mais residia no local, sob pena de ser considerada válida sua citação e, por conseguinte, de arcar com os ônus da decretação da revelia (ausência de apresentação de contestação).
Neste sentido, de forma reiterada, já decidiu o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:
Agravo de instrumento. Cumprimento de sentença. Inventário. Decisão agravada. Rejeição à impugnação. Alegação de nulidade da citação na fase de cognição. Validade da citação em condomínio edilício. Carta recebida pela portaria. Exegese do §4º, art. 248, CPC. Presunção relativa de recebimento, mas, que não foi elidida pelo agravante. Prova de que o agravante residiria em outro endereço. Não demonstração, ônus do qual ele não se desincumbiu. Decisão agravada mantida. Recurso não provido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2230978-73.2022.8.26.0000; Relator (a): Pedro de Alcântara da Silva Leme Filho; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 12ª Vara Cível; Data do Julgamento: 22/02/2023; Data de Registro: 22/02/2023)
MÚTUO. AÇÃO MONITÓRIA. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. RECONHECIMENTO DE NULIDADE POR AUSÊNCIA DE CITAÇÃO NA FASE DE CONHECIMENTO. NÃO PREVALECIMENTO. HIPOTESE EM QUE HOUVE A ENTREGA DA CORRESPONDÊNCIA EM CONDOMÍNIO, NOS ESTRITOS TERMOS DO ARTIGO 248, § 3º, DO CPC. PRESUNÇÃO RELATIVA NÃO DESFEITA POR PROVA, CUJO ÔNUS CABIA À PARTE DEMANDADA. AGRAVO PROVIDO. 1. Instaurada a atividade executória, cuidou a executada de alegar vício de citação na fase de conhecimento, sob a assertiva de que não recebeu a correspondência, invocando em seu favor deficiência do serviço de portaria nos edifícios e condomínios. 2. Entretanto, não há que se cogitar de nulidade de citação na fase de conhecimento. A citação foi efetuada por meio de carta com aviso de recebimento. Como se sabe, é considerada válida a citação realizada, se a correspondência for recebida por funcionário da portaria em condomínios edilícios (artigo 248, § 4º, do CPC). Diante dos elementos constantes nos autos, não há qualquer fundamento para se acolher a nulidade de citação, pois, uma vez estabelecida a presunção legal, nenhum elemento de prova foi apresentado no sentido de afastá-la, ônus que cabia à parte demandada. Assim, impõe-se reconhecer a validade da citação. (TJSP; Agravo de Instrumento 2021841-17.2023.8.26.0000; Relator (a): Antonio Rigolin; Órgão Julgador: 31ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional VI - Penha de França - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 28/03/2023; Data de Registro: 28/03/2023)
AGRAVO DE INSTRUMENTO – Ação de cobrança – Fase de Cumprimento de sentença – Decisão agravada que rejeitou a alegação de nulidade processual – Recurso do devedor – NULIDADE DA CITAÇÃO – Citação efetivada por carta recebida por funcionário do condomínio – Validade da citação recepcionada por funcionário, sem nenhuma ressalva, na portaria do condomínio – Inteligência do artigo 248, §4º, do Código de Processo Civil – Ausência de provas robustas de que a devedora não teria tomado conhecimento da correspondência – Ausência de registro da missiva no livro do condomínio que não tem o condão de macular o ato citatório, em especial porque o aviso de recebimento está identificado com o nome do recebedor e número do seu documento pessoal – Decisão mantida – RECURSO DESPROVIDO. (TJSP; Agravo de Instrumento 2064898-85.2023.8.26.0000; Relator (a): Jonize Sacchi de Oliveira; Órgão Julgador: 24ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional IX - Vila Prudente - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 19/06/2023; Data de Registro: 19/06/2023)
Como se verifica, a citação recebida pelo funcionário da portaria de condomínio sem ressalva, importa na validade da citação, cabendo ao réu o ônus da prova de que não recebeu a citação.
É absolutamente necessário, portanto, a atenção ao tema e, além da precaução do condômino para evitar prejuízos.
Por exemplo, na hipótese de uma viagem prolongada, ou ainda, a desocupação do imóvel para alugá-lo para terceiro, é recomendável a comunicação do condômino à empresa responsável pela administração do condomínio/portaria sobre a sua ausência com a devida advertência para que não seja recebida correspondências no período da ausência, devendo ser declarado pelo funcionário que o condômino está ausente ou que se mudou.
Tal precaução, possui o objetivo de evitar o recebimento da citação pelo funcionário da portaria, sem a necessária recusa, tornando a citação válida, conforme mencionado artigo 248, parágrafo quarto, do Código de Processo Civil.
Diante do exposto, tem-se que a citação é pressuposto de validade do processo, no entanto, caso o réu resida em condomínio, presume-se válida a citação recebida pelo funcionário da portaria, cabendo ao réu o ônus de comprovar de que não recebeu a citação, razão pela qual é necessária cautela do condômino na hipótese de ausência (com a comunicação à administração do condomínio/portaria), a fim de evitar prejuízos como, por exemplo, o decurso do prazo sem a apresentação de contestação e a aplicação dos efeitos da revelia.