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A responsabilidade tributária dos sócios não administradores. Reflexões sobre o art. 134, VII, do CTN

O CTN carreia diferentes categorias de responsabilização tributária de terceiros e, dentre dos arrolados, nosso recorte delimitado ao sócio não gestor demonstra fortes critérios cumulativos de comprovação probatória inalienável para assunção da dívida tributária do contribuinte originário.

7/7/2023

INTRODUÇÃO

Ao estudo da responsabilidade tributária do sócio contida no artigo 134, VII do Código Tributário Nacional (CTN)1, algumas considerações devem ser fixadas com antecedência, e por prudência.

Isso porque, temos que a responsabilização tal como trazida nesses artigos é alargada, diferente e refoge dos elos obrigacionais enunciados pelos artigos 121, II2, 124, I3 e 1284, dado que, enquanto esses tratam de sujeição passiva, solidariedade e responsabilidade por substituição, o artigo 134, VII carreia o espectro da atipicidade diante da ocorrência de determinado fato jurídico tributário.

Queremos, no recorte dessas primeiras linhas fixar que, a responsabilização do sócio quotista exsurge pelo descumprimento de um dever da pessoa jurídica naturalmente incumbida, subsumindo os sócios por isso, à norma autônoma e anômala do critério pessoal da regra matriz de incidência tributária.

Em outras palavras, se para o cumprimento da obrigação principal5 oriunda dos fatos jurídicos tributários é inata a sujeição da pessoa jurídica e do seu patrimônio social, a submissão do patrimônio pessoal do quotista é hipótese de natureza punitiva, sancionatória pelo não cumprimento daquela primeira principal obrigação, isto é, do dever de pagamento do crédito tributário.

Entendemos que, pela desnaturalização da sujeição ordinária e o avanço ao patrimônio pessoal do sócio, importa registrar uma crítica ao uso indiscriminado e excessivo pelo Fisco em geral, dessa via atípica para exigência do crédito tributário, vez que de um lado, “no direito positivo brasileiro, não existe fundamento para responsabilização tributária indiscriminada dos sócios, por simplesmente ser sócio6” e de outro, “a responsabilidade tributária de terceiros, notadamente de sócios, diretores, gerentes e administradores, impacta na percepção de que há insegurança jurídica quanto à legislação tributária”7.

Ao contrário da extensão excessiva imposta pelo credor-fisco8, as balizas legais do comprometimento pessoal do sócio ao crédito tributário (e de seu patrimônio) obrigam interpretação restritiva, alicerçada e tendo ao nosso ver como principal critério identificador, o elemento subjetivo da conduta do sócio dando contornos enviesados à lei tributária, isto é, o agir culposamente a ponto de configurar, comprovadamente, a ilicitude do seu ato.

Somente a partir desse parâmetro – do fato jurídico da ilicitude – é que se viabiliza a norma jurídica da incidência de responsabilização pessoal pela constituição e exigência do crédito tributário.

1 A SIGNIFICAÇÃO DA RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DO ART. 134, VII, DO CTN. CRITÉRIOS PARA RESPONSABILIZAÇÃO

A prescrição da assunção da responsabilidade tributária pelos sócios tal como aventada no artigo 134 do CTN vale atenção, primeiro por inferir, como afirmamos, a juridicização da ilicitude por ação ou omissão e segundo, porque a materialidade da responsabilização somente assim adquire tais contornos, quais sejam, os punitivos, “nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte”.

De outro modo pode-se dizer nessa lógica, o primeiro comando do artigo 134 comentado exige o exaurimento das possibilidades de satisfação do crédito tributário pelo contribuinte para que, somente e só após revelado o fato jurídico de tamanha irreversibilidade, outra e nova relação jurídica seja estabelecida baseada em comportamento pessoal e reprovável do responsável.

Nesse ponto, não tratamos em repisar sobre a restritiva interpretação da responsabilização tampouco da fixação dos critérios impeditivos de exacerbação pelo Fisco, mas sim, em evidenciar que imputação da responsabilidade obriga-se também ao alinhamento e conjugação ao previsto pelo artigo 4º, V9, da Lei 6.830/80, condição imprescindível da legitimidade na exigência do crédito tributário.

Caminhando na construção do nosso percurso de significação, podemos sacar do artigo 134, além da impossibilidade do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte comprovada ao exaurimento, outras duas condições balizadoras também imprescindíveis da responsabilização de terceiros e as quais, igualmente, devem apresentar-se antecipadamente comprovadas.

Estamos a destacar objetivamente, os “atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis”, assim dizendo, da conduta do terceiro prescrito no rol taxativo inserto nesse artigo ao que podemos fixar como atos de participação (intervenção) ou omissão no fato jurídico-tributário, os quais reforçam o caráter punitivo da incidência da norma jurídica de responsabilidade em decorrência da ilicitude do terceiro trazido ao pólo passivo da execução fiscal.

Podemos agora, em conclusão, sustentar a responsabilidade tributária emoldurada pelo artigo 134, do CTN, desde que (i) ocorra o descumprimento da obrigação principal pelo contribuinte e (ii) dele (o contribuinte) sejam exauridas, comprovadamente, todas as possibilidades de retirar do seu patrimônio, a soma equivalente ao crédito tributário exigido de tal maneira que (iii) uma nova relação jurídica seja estabelecida com terceiro prescrito no rol taxativo (frisa-se) cravado pelos incisos I a VII por (iv) comprovada conduta, no mínimo culposa, na participação ou omissão do surgimento da obrigação tributária principal e, ato contínuo, do crédito tributário.

Alexandre Pantoja
Advogado em São Paulo, especializado em Direito Tributário pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo (FDSBC) e pela Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (GVlaw).

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