Migalhas de Peso

Crédito de ICMS sobre energia elétrica consumida em supermercado

Os supermercados têm o direito de obter crédito sobre a energia consumida em seus setores produtivos, embora a Fazenda do Estado de São Paulo imponha várias condições para isso.

28/6/2023

O setor de supermercados tem como atividade principal a revenda de mercadorias alimentícias. No entanto, atualmente, os supermercados também desempenham atividades industriais, tais como panificação, confeitaria, restaurante e lanchonete, a fim de atender à demanda por produtos de qualidade e complementar as receitas.

Um tema relevante para os contribuintes é a geração de crédito na aquisição de energia elétrica utilizada em seus setores produtivos, uma vez que essa é uma operação complexa e o crédito pode ser negado pelo Fisco.

O Poder Judiciário possui diversos precedentes desfavoráveis em relação ao crédito, incluindo um julgado sob a sistemática de recursos repetitivos, sob o tema 242 do STJ. A tese firmada nesse julgamento estabelece que as atividades de panificação, congelamento de produtos perecíveis, rotisseria e restaurante, açougue e peixaria, e frios e laticínios realizadas por supermercados não configuram processo de industrialização de alimentos. Portanto, não há direito ao creditamento do ICMS pago na entrada da energia elétrica consumida no estabelecimento comercial.

No entanto, a Fazenda Pública do Estado de São Paulo reconhece o direito dos supermercados de aproveitarem o crédito de ICMS sobre a energia elétrica consumida em seus setores de produção. Isso se deve à interpretação da alínea b do inciso I do Artigo 1º do título II - das disposições transitórias, cumulada com o artigo 4º do RICMS/00:

Artigo 1º - Na aplicação dos artigos 61 a 66 do Regulamento do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - RICMS, aprovado pelo decreto 45.490, de 30 de novembro de 2000, observar-se-á o seguinte:

I – somente dará direito a crédito a entrada de energia elétrica no estabelecimento:

  1. quando for objeto de operação de saída de energia elétrica;
  2. quando consumida no processo de industrialização;
  3. quando seu consumo resultar em operação de saída ou prestação para o exterior, na proporção destas sobre as saídas ou prestações totais; e
  4. a partir da data indicada na alínea “d” do inciso II do artigo 33 da lei Complementar 87/96, nas demais hipóteses.

Artigo 4º - Para efeito de aplicação da legislação do imposto, considera-se (Convênio SINIEF-6/89, art. 17, § 6º, na redação do Convênio ICMS-125/89, cláusula primeira, I, e Convênio AE-17/72, cláusula primeira, parágrafo único):

I - industrialização, qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto ou o aperfeiçoe para consumo, tal como:

  1. a que, executada sobre matéria-prima ou produto intermediário, resulte na obtenção de espécie nova (transformação);
  2. que importe em modificação, aperfeiçoamento ou, de qualquer forma, alteração do funcionamento, da utilização, do acabamento ou da aparência do produto (beneficiamento);
  3. que consista na reunião de produtos, peças ou partes e de que resulte um novo produto ou unidade autônoma (montagem);
  4. a que importe em alteração da apresentação do produto pela colocação de embalagem, ainda que em substituição à original, salvo quando a embalagem aplicada destinar-se apenas ao transporte da mercadoria (acondicionamento ou reacondicionamento);
  5. a que, executada sobre o produto usado ou partes remanescentes de produto deteriorado ou inutilizado, o renove ou restaure para utilização (renovação ou recondicionamento).

Logo, é possível afirmar que os setores de panificação, confeitaria, restaurante e lanchonete dos supermercados envolvem processo de industrialização, devido à transformação de insumos em produtos acabados destinados à venda ao consumidor final em seus estabelecimentos.

Com base nisso, é correto concluir que os supermercados têm o direito de obter crédito sobre a energia consumida em seus setores produtivos, embora a Fazenda do Estado de São Paulo imponha várias condições para que esse direito seja concedido.

O entendimento mencionado acima está consolidado em consultas tributárias disponibilizadas pela Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, como segue:

Ementa: ICMS – Crédito – Energia elétrica consumida em estabelecimentos com atividades de padaria, confeitaria, açougue e frios, utilizada na produção de pães e alimentos diversos. I. A atividade desenvolvida nos setores de padaria, confeitaria, açougue e corte de frios somente admite o crédito da energia elétrica despendida nessas atividades industriais quando envolver a transformação de insumos em produtos acabados e desde que observada a legislação pertinente. RESPOSTA À CONSULTA TRIBUTÁRIA 15414/17, de 22 de Agosto de 2017. Disponibilizado no site da SEFAZ em 17/1/18.

Ementa: ICMS - Crédito de energia elétrica - Corte de frios e fabricação de pães – Possibilidade. I. A atividade desenvolvida nos setores de padaria e corte de frios somente admite o crédito da energia elétrica despendida nessas atividades industriais quando envolver a transformação de insumos em produtos acabados e desde que observada a legislação pertinente. RESPOSTA À CONSULTA TRIBUTÁRIA 19329/19, de 01 de abril de 2019. Disponibilizado no site da SEFAZ em 14/11/19.

Apesar da contradição entre as decisões do Poder Judiciário e a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, é certo que, desde que sejam cumpridas as condições previstas na legislação estadual, o fisco estadual não se oporá ao crédito tomado.

Portanto, diante do exposto, os supermercados contribuintes do estado de São Paulo têm o direito de obter crédito de ICMS decorrente da aquisição de energia elétrica consumida em seus setores produtivos, o que é reconhecido pela Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo.

Alonso Santos Alvares
O advogado é sócio da Alvares Advogados, escritório de advocacia especializado nas mais diversas frentes do Direito Empresarial, Civil, Trabalhista e Tributário.

Ricardo Siguematu
Advogado especialista em Direito Tributário e é coordenador do núcleo tributário na Alvares Advogados, escritório de advocacia especializado nas mais diversas frentes do Direito Empresarial.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

A insegurança jurídica provocada pelo julgamento do Tema 1.079 - STJ

22/11/2024

O SCR - Sistema de Informações de Crédito e a negativação: Diferenciações fundamentais e repercussões no âmbito judicial

20/11/2024

O fim da jornada 6x1 é uma questão de saúde

21/11/2024

ITBI - Divórcio - Não incidência em partilha não onerosa - TJ/SP e PLP 06/23

22/11/2024

Falta grave na exclusão de sócios de sociedade limitada na jurisprudência do TJ/SP

20/11/2024