União estável é a entidade familiar decorrente de relação afetiva, pública1 e duradoura entre duas pessoas2, em princípio não impedidas de se casarem entre si, com compartilhamento de projeto de vida e intenção de constituir família. A configuração da união estável independe de gênero ou orientação sexual dos companheiros3, sendo igualmente irrelevantes a existência ou não de filhos, bem como a coabitação4.
Excepcionalmente, é possível que haja impedimento para o casamento, mas não para a união estável. Isso ocorre quando qualquer dos companheiros, embora separado de fato ou de direito, permanece casado com terceira pessoa: ele pode constituir união estável, mas não pode se casar novamente até que haja a extinção do vínculo matrimonial antecedente (pelo divórcio, morte ou invalidação).
A união estável é entidade familiar prevista expressamente na Constituição Federal, devendo ser respeitada e protegida pelo Estado5. A natureza jurídica desse instituto é de ato-fato jurídico, pois os efeitos se irradiam independentemente da formalização de vontade das partes. Trata-se, portanto, de relação essencialmente informal. Não obstante, pode ser documentada por escrito e, inclusive, registrada no Registro Civil de Pessoas Naturais, conforme se verá adiante.
Histórico normativo
Após o reconhecimento constitucional da união estável pela Constituição Federal de 1988, duas enxutas leis da década de 1990 passaram a regulamentar a matéria. A Lei 8.971/94 buscou regular “o direito dos companheiros a alimentos e à sucessão”. Basicamente, tratou dos requisitos da união estável (convivência há mais de 5 anos – ou menos, se houver prole comum – com pessoa solteira, separada, divorciada ou viúva), o direito sucessório (com tratamento significativamente mais gravoso do que o existente para o cônjuge) e o direito à meação em caso de falecimento do companheiro (desde que se trate de bem adquirido com esforço comum do casal).
Posteriormente, a Lei 9.278/96 – com a finalidade de regulamentar “o §3º do art. 226 da Constituição Federal” – tratou do tema com mais minúcia. Discutiu-se sobre a revogação ou não da lei anterior, debate, no entanto, que ficou praticamente superado com o advento do Código Civil de 2002. Em primeiro lugar, conceituou a união estável de forma a afastar o prazo mínimo de 5 anos de convivência ou a existência de prole comum (art. 1º). Em segundo lugar, elencou os direitos e deveres iguais dos companheiros entre si, concretizando o princípio da isonomia entre homens e mulheres (art. 3º). Em terceiro lugar, passou a presumir que os bens móveis ou imóveis adquiridos a título oneroso por qualquer dos companheiros durante a relação pertenceriam a ambos, “em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito” (art. 5º). Essa presunção não se aplicaria na hipótese de sub-rogação de bens particulares adquiridos antes do início da relação (art. 5º, §1º). Em quinto lugar, foi previsto ao companheiro sobrevivente o “direito real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família” (art. 7º, parágrafo único). Em sexto lugar, a fim de dar concretude ao comando constitucional de facilitação da conversão da união estável em casamento, a lei previu a possibilidade de os conviventes, a qualquer tempo, de comum acordo, solicitarem tal medida diretamente ao Oficial de Registro de Pessoas Naturais, sem a necessidade de intervenção judicial (art. 8º). Por fim, salientando que a união estável, ao contrário do tratamento dado antes da Constituição Federal de 1988 ao concubinato, não é mera sociedade de fato, regida pelo direito obrigacional, mas entidade familiar, submetida ao direito de família, o art. 9º tratou da competência da Vara de Família, bem como assegurou o segredo de justiça ao procedimento.
Após o advento das duas leis mencionadas, a união estável foi tratada – novamente de forma tímida – pelo Código Civil de 2002. Manteve-se o tratamento diferenciado em relação ao casamento, principalmente no plano sucessório, o que provocou críticas da doutrina e forte atuação judicial pela equiparação, ao menos parcial, entre os institutos.
O Código Civil de 2002 faz menção à expressão união estável em alguns dispositivos legais. Além dos artigos 1.723 a 1.727, que tratam especificamente do tema, e do art. 1.790, que previa a ordem de sucessão hereditária em caso de falecido que convivesse em união estável (o que foi declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal), há os seguintes: (a) art. 1.562, que trata da possibilidade de se utilizar da tutela cautelar de separação de corpos também na dissolução da relação convivencial; (b) art. 1.584, que trata do pedido de guarda formulado em ação de dissolução de união estável; (c) art. 1.595, que equipara o companheiro ao cônjuge no que diz respeito ao parentesco civil por afinidade; (d) 1.631, 1.632 e 1.636, que dissociam a relação conjugal (ou convivencial) da relação de parentesco existente entre pais e filhos; (e) 1.708, que estabelece como causa extintiva do dever de alimentos o casamento, a união estável ou mesmo o concubinato do credor.
Em razão da ausência de regramento detalhado da união estável no Código Civil de 2002, a jurisprudência passou a ter uma atuação de destaque. Também foi digno de nota o papel do Conselho Nacional de Justiça, que, com a publicação do Provimento n. 37/2014, passou a regulamentar o registro da união estável no Livro E do Registro Civil de Pessoas Naturais (RCPN).
Mais recentemente, a Lei n. 14.382/22 alterou a Lei n. 6.015/73 (Lei de Registros Públicos – LRP), tratando expressamente dos seguintes temas relacionados à união estável: (a) registro da união estável no RCPN (art. 94-A da LRP); (b) conversão da união estável em casamento perante o RCPN (art. 70-A da LRP); (c) possibilidade de companheiros alterarem os seus sobrenomes nas mesmas hipóteses em que as pessoas casadas (art. 57, §2º e §3º-A, da LRP). Neste breve texto, pretendemos analisar o item “a”, relacionado ao registro da união estável no RCPN.
Por que é importante o registro da união estável?
Os fatos jurídicos mais importantes relacionados aos direitos da personalidade – e que refletem em direitos de terceiros – são registrados nos Registros Civis de Pessoas Naturais. O art. 9º do Código Civil, em rol não taxativo, elenca os seguintes: nascimentos, casamento, óbitos, emancipação, interdição, ausência e morte presumida.
Os registros – além das averbações (que os alteram) e anotações (que permitem a indexação de um registro ou averbação com outro) – são fundamentais para a segurança jurídica; configuram-se não somente como direitos fundamentais, mas igualmente como um dever. Os assentos devem corresponder à realidade. Nos termos do art. 17 da LRP, “qualquer pessoa pode requerer certidão do registro sem informar ao oficial ou ao funcionário o motivo ou interesse do pedido”. É por meio dessa publicidade – ainda que indireta e eventualmente mitigada6 – que se concretizam as finalidades dos Registros Públicos: autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos (art. 1º da LRP).
Até o advento da Lei n. 9.278/96, nem se cogitava do registro da união estável, pois esse ato-fato jurídico era praticamente irrelevante para terceiros. A Lei n. 8.971/94, que inaugurou a regulamentação desse instituto jurídico, foi fundamental para garantir direitos de alimentos e de sucessão para a companheira, mas pouco ou nada afetou negócios jurídicos celebrados em vida pelos companheiros.
A Lei n. 9.278/96, no entanto, passou a presumir que os bens móveis ou imóveis adquiridos a título oneroso por qualquer dos companheiros durante a relação pertenceriam a ambos, “em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito” (art. 5º).
A propriedade imóvel, em regra, transmite-se com o registro (art.1.227 do Código Civil). A propriedade móvel, por sua vez, com a tradição (art. 1.226 do Código Civil). Há, porém, exceções. Além de outras que não importam a este estudo (usucapião, desapropriação, acessão física, sucessão causa mortis), deve-se destacar outra: o casamento com regime de comunhão de bens. Se um dos cônjuges, na constância do matrimônio, em regime de comunhão universal ou parcial de bens, adquire onerosamente um bem, mesmo que o outro não participe da transação e ainda que, sendo o bem imóvel, o nome do outro cônjuge equivocadamente não conste do Registro de Imóveis, ele adquirirá imediatamente a propriedade. Será necessária a posterior regularização no registro, mas o ato registral, nesse caso, será meramente declaratório da propriedade, que já se constituíra antes.
Nas hipóteses em que o bem imóvel só se adquire com o registro, a segurança jurídica fica resguarda. Nos outros casos, há risco de venda a non domino. Para usar o mesmo exemplo do parágrafo anterior, pensemos na hipótese em que o cônjuge, após adquirir o imóvel, resolve vendê-lo a terceiro. Ele poderá fazê-lo sozinho? A resposta é não, pois o bem não lhe pertence integralmente. A propriedade está em mancomunhão. Somente os dois cônjuges, juntos, podem alienar o bem. Mas como o terceiro poderia saber que o alienante era casado? Simples: basta consultar o Registro Civil de Pessoas Naturais7. A publicidade que decorre dessa serventia extrajudicial concede, assim, segurança jurídica às transações realizadas.
Retornemos, agora, à Lei n. 9.278/96, que passou a presumir que os bens móveis ou imóveis adquiridos a título oneroso por qualquer dos companheiros durante a relação pertenceriam a ambos, “em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito” (art. 5º). A Lei inovou ao prever outra exceção ao princípio da inscrição (ou do registro). Algo semelhante ao regime da comunhão parcial de bens passou a ser previsto também para a união estável. O Código Civil de 2002 manteve essa lógica: “Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens” (art. 1.725).
Como se percebe, a união estável, no início inofensiva a terceiros, passou a ter a potencialidade de afetá-los. Parte da doutrina8 e da jurisprudência9 começou a defender que a união estável seria um verdadeiro estado civil praticamente idêntico ao casamento. Essa visão veio a ter maior força após a decisão do STF que declarou a inconstitucionalidade do art. 1.790 do Código Civil.
A maioria doutrinária, porém, discordou dessa posição10. Nesse sentido, confira-se o enunciado n. 641 da VIII Jornada de Direito Civil: “A decisão do Supremo Tribunal Federal que declarou a inconstitucionalidade do art. 1.790 do Código Civil não importa equiparação absoluta entre o casamento e a união estável. Estendem-se à união estável apenas as regras aplicáveis ao casamento que tenham por fundamento a solidariedade familiar. Por outro lado, é constitucional a distinção entre os regimes, quando baseada na solenidade do ato jurídico que funda o casamento, ausente na união estável”.
Coloque-se o problema de forma clara para que o enunciado doutrinário possa ser bem compreendido: dois companheiros convivem em união estável e um deles se declara solteiro e adquire onerosamente, sozinho, em seu próprio nome, um bem imóvel. Posteriormente, ele aliena esse imóvel a terceiro. É possível que posteriormente o companheiro prejudicado busque a invalidação dessa alienação por não ter participado dela (embora fosse coproprietário – ou comunheiro – do imóvel11)?
Adotando-se a tese de que casamento e união estável (formalizada e registrada ou não) são idênticas, sim. Nesse sentido, defende Paulo Lôbo que “qualquer alienação (venda, permuta, doação, dação em pagamento) de bem comum pelo companheiro depende de autorização expressa do outro; a falta de autorização enseja ao prejudicado direito e pretensão à anulação do ato e do respectivo registro público”. Para ele, caberia ao terceiro de boa-fé prejudicado exigir perdas e danos do contratante que agiu de má-fé. Entende que “a má-fé do companheiro não pode ser presumida, nem pode o direito do credor prevalecer sobre o direito de constituir união estável, que tem fundamento constitucional”12.
A solução, porém, parece não ser a mais adequada, pois cria indevido obstáculo aos negócios jurídicos, afetando indevidamente terceiros de boa-fé. Ao contrário do que ocorre no casamento – em que caberia ao adquirente proceder à pesquisa junto ao RCPN a respeito do estado civil do alienante –, na união estável essa busca não seria, em princípio, possível13.
Como se percebe, a partir do momento em que a união estável passou a interferir em negócios jurídicos celebrados por terceiros (tornando-se praticamente um estado civil), surgiu a necessidade de ser efetivamente registrada no RCPN.
Normas sobre o registro da união estável
Justamente para resguardar a segurança jurídica, e sob o fundamento de que os registros nessa serventia extrajudicial não são taxativos, o CNJ publicou, em 2014, o Provimento n. 37, permitindo aos interessados o registro da união estável no Livro E do RCPN: “É facultativo o registro da união estável prevista nos artigos 1.723 a 1.727 do Código Civil, mantida entre o homem e a mulher, ou entre duas pessoas do mesmo sexo”.
Entenda-se bem: a união estável, para se configurar, não depende sequer de formalização por escrito; muito menos de registro no RCPN. Além disso, ela pode existir entre pessoas casadas com terceiros, desde que separadas.
No entanto, para que fosse levada a registro (o que traria certa segurança jurídica às partes), o CNJ trouxe alguns requisitos: formalização por escritura pública ou sentença (art. 2º) e proibição de registro “de união estável de pessoas casadas, ainda que separadas de fato, exceto se separadas judicialmente ou extrajudicialmente, ou se a declaração da união estável decorrer de sentença judicial transitada em julgado”. Além disso, havia norma expressa de que “o registro de união estável decorrente de escritura pública de reconhecimento ou extinção produzirá efeitos patrimoniais entre os companheiros, não prejudicando terceiros que não tiverem participado da escritura pública” (art. 5º).
Embora relevante a atuação do CNJ, seria mais adequado que o assunto fosse tratado por lei. Em razão disso, a Lei n. 14.382/22, além de diversas outras alterações no sistema registral brasileiro, acrescentou o art. 94-A à Lei de Registros Públicos. Posteriormente, o CNJ, por meio do Provimento n. 141/23, atualizou o Provimento n. 37/14.
Basicamente, a nova lei deixou clara a possibilidade de registro da união estável no Livro E do RCPN em que os companheiros têm ou tiveram sua última residência. Ao deixar de utilizar o adjetivo “facultativo”14 para caracterizar o registro, pode-se sustentar que, na sua ausência, não pode o companheiro pleitear direitos decorrentes da união estável perante terceiros. Assim, parece ficar afastada a tese defendida por Paulo Lôbo de que “a má-fé do companheiro não pode ser presumida, nem pode o direito do credor prevalecer sobre o direito de constituir união estável, que tem fundamento constitucional”15.
Em outras palavras, com a regulamentação legal do registro da união estável, não pode o companheiro eventualmente prejudicado por ato de seu parceiro (que, por exemplo, alienou bem comum a terceiro sem o seu consentimento) buscar a invalidação do negócio jurídico.
A contrario sensu, porém, se a união estável foi registrada, não pode o terceiro alegar ignorância, pois se aplica o princípio da publicidade dos registros públicos. Aliás, há norma expressa no Provimento n. 141/23 do CNJ: “O registro de que trata o caput confere efeitos jurídicos à união estável perante terceiros”.
A Lei 14.382/22 manteve a proibição já existente no Provimento n. 37/14 do CNJ de registro de união estável de pessoas casadas, “ainda que separadas de fato, exceto se separadas judicialmente ou extrajudicialmente, ou se a declaração da união estável decorrer de sentença judicial transitada em julgado” (art. 94-A, §1º, da LRP). No mais, trouxe algumas inovações: (a) permitiu o registro de documentos estrangeiros, desde que legalizados ou apostilados e acompanhados de tradução juramentada (art. 94-A, §2º e §3º, da LRP16); (b) previu, além da sentença com trânsito em julgado e a escritura pública, a possibilidade de registro de “termos declaratórios formalizados perante o oficial de registro civil”; (c) permitiu a alteração do sobrenome dos companheiros independentemente de manifestação judicial (art. 57, §2º e §3º-A, da LRP17), mas desde que haja o registro da união estável.
Apesar de a previsão dos termos declaratórios ter sofrido severas críticas, principalmente de Tabeliães de Notas, o Provimento n. 141/23 tratou dessa questão, atribuindo àqueles termos status semelhante ao das escrituras públicas.
Como regra, nos termos do art. 1º, §4º, do Provimento n. 37/14 (com sua redação dada pelo Provimento n. 141/23), não se permite a indicação das datas de início ou fim da união estável, exceto se houver: (a) decisão judicial; (b) procedimento de certificação eletrônica18; ou (c) escritura pública, desde que preenchidas duas condições: a data deve corresponder à data da lavratura do documento e é necessário que os companheiros expressamente declarem esse fato.
Com a previsão, agora na Lei de Registros Públicos, do registro da união estável no Registro Civil de Pessoas Naturais, é possível defender a existência de duas espécies diferentes desse instituto jurídico.
De um lado, permanece a união estável como ato-fato jurídico, sem afetar direitos de terceiros, sempre que não seja registrada no Livro E. Os companheiros são livres para registrar ou não esse ato-fato jurídico; a ausência de registro, embora possa dificultar a prova a ser eventualmente produzida em Juízo, não afasta os efeitos da união estável entre os próprios companheiros. Não é possível, no entanto, que nenhum deles alegue, perante terceiros de boa-fé, a existência desse ato-fato para pleitear direito próprio contra aqueles.
De outro, com efeitos cada vez mais próximos ao casamento, há a união estável devidamente registrada. Perceba-se que não basta a existência de sentença, termo declaratório ou escritura pública. A eficácia perante terceiros somente ocorre mediante o registro.
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1- “Assim, não se tem união estável se os encontros forem furtivos ou secretos, embora haja prática reiterada de relações sexuais” (DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil, 35ª ed. São Paulo: Saraiva, 2021, p. 439).
2- “É incompatível com a Constituição Federal o reconhecimento de direitos previdenciários (pensão por morte) à pessoa que manteve, durante longo período e com aparência familiar, união com outra casada, porquanto o concubinato não se equipara, para fins de proteção estatal, às uniões afetivas resultantes do casamento e da união estável” (STF, RE 883.168/SC, Rel. Dias Toffoli, j. 03/08/21, Tema 526).
3- O Supremo Tribunal Federal, no emblemático julgamento da ADI 4.277-DF, em 05/05/2011, sob a relatoria do Eminente Ministro Carlos Ayres Britto, decidiu por unanimidade, com eficácia erga omnes e efeito vinculante, que se devem aplicar às relações estáveis homoafetivas exatamente as mesmas regras vigentes para as heteroafetivas.
4- Súmula n. 382, STF: “A vida em comum sob o mesmo teto, more uxorio, não é indispensável à caracterização do concubinato”.
5- Eis o que dispõe o art. 226, §3º da Constituição Federal: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.
6- É possível mitigar a publicidade se for necessário para resguardar a privacidade e a personalidade de alguém. É o que se dá, por exemplo, na hipótese de alteração de gênero e/ou prenome. Nos termos do art. 5º do Provimento n. 73 da Corregedoria Nacional de Justiça, “a alteração de que trata o presente provimento tem natureza sigilosa, razão pela qual a informação a seu respeito não pode constar das certidões dos assentos, salvo por solicitação da pessoa requerente ou por determinação judicial, hipóteses em que a certidão deverá dispor sobre todo o conteúdo registral”.
7- Além disso, o princípio da especialidade subjetiva exige que conste, da matrícula do imóvel e de todos os registros, o estado civil do proprietário e do adquirente (art. 176 da LRP). No mais, se há pacto antenupcial, ele deve ser registrado no Livro 3 do Registro de Imóveis (art. 178, inc. V, da LRP).
8- “Quando a lei trata de forma diferente a união estável em relação ao casamento, é de se ter simplesmente tal referência como não escrita. Sempre que o legislador deixa de nominar a união estável frente a prerrogativas concedidas ao casamento, outorgando-lhe tratamento diferenciado, deve tal omissão ser tida por inexistente, ineficaz e inconstitucional. Do mesmo modo, em todo texto em que é citado o cônjuge é necessário ler-se cônjuge ou companheiro” (DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias, 8ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 171).
9- Com o reconhecimento da união estável pelo constituinte originário e pelo sistema jurídico pátrio, a jurisprudência tem admitido sua equiparação ao casamento quanto a todos os efeitos jurídicos, pessoais e patrimoniais, e mesmo no que concerne à modificação do estado civil de solteira. A propósito: REsp 1.516.599/PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 2/10/2017; REsp 1.617.636/DF, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe 3/9/2019)” (2ª Turma, RMS 59709 / RS, Rel. Herman Benjamin, j. 19/05/2020).
10- Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona explicam que, se os institutos fossem iguais, o artigo 226, §3º da Constituição Federal “não teria referido que a lei ordinária facilitaria a ‘conversão’ da união estável em casamento. Ora, não se pode converter aquilo que já é igual!” (GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: Direito de Família, 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2021, p. 410)
11- No exemplo proposto, o companheiro inocente é efetivo coproprietário do bem imóvel; não deveria constar como mero anuente na compra e venda, mas como alienante, ao lado do outro. No entanto, a problemática é semelhante quando se trata de bens imóveis particulares, em que se exige a anuência do outro cônjuge (e também do companheiro?), conforme art. 1.647 do Código Civil.
12- LÔBO, Paulo. Direito Civil: Famílias, v. 5. São Paulo: Saraiva, 2021, p. 181-182.
13- Nesse sentido, escrevem Farias, Rosenvald e Braga Netto: “Essa desnecessidade de outorga na união estável se justifica por diversas razões. Primus, porque se tratando de regra restritiva à disposição de direitos, submete-se a uma interpretação restritiva, dependendo de expressa disposição legal. Secundus, pois a união estável é uma união fática, não produzindo efeitos em relação a terceiros. Tertius, e principalmente, em face da premente necessidade de proteção do terceiro adquirente de boa-fé, que veio a adquirir um imóvel sem ter ciência (e não há como se exigir dele) que o alienante havia adquirido o imóvel na constância de uma união estável.” Os autores, apesar de classificarem como questão polêmica no Superior Tribunal de Justiça, mencionam três julgados que afastaram a necessidade da outorga convivencial, privilegiando os terceiros de boa-fé: REsp 1.299.866, REsp 1.592.072 e AgInt no AREsp 1.069.255. (FARIAS, Cristiano Chaves de; BRAGA NETTO, Felipe; ROSENVALD, Nelson. Manual de Direito Civil: Volume Único, 7ª ed. Salvador: Juspodivm, p. 1261).
14- Embora ele permaneça na redação atual do Provimento 141/23 do CNJ.
15- LÔBO, Paulo. Direito Civil: Famílias, v. 5. São Paulo: Saraiva, 2021, p. 181-182.
16- § 2º As sentenças estrangeiras de reconhecimento de união estável, os termos extrajudiciais, os instrumentos particulares ou escrituras públicas declaratórias de união estável, bem como os respectivos distratos, lavrados no exterior, nos quais ao menos um dos companheiros seja brasileiro, poderão ser levados a registro no Livro E do registro civil de pessoas naturais em que qualquer dos companheiros tem ou tenha tido sua última residência no território nacional. § 3º Para fins de registro, as sentenças estrangeiras de reconhecimento de união estável, os termos extrajudiciais, os instrumentos particulares ou escrituras públicas declaratórias de união estável, bem como os respectivos distratos, lavrados no exterior, deverão ser devidamente legalizados ou apostilados e acompanhados de tradução juramentada.
17- “§ 2º Os conviventes em união estável devidamente registrada no registro civil de pessoas naturais poderão requerer a inclusão de sobrenome de seu companheiro, a qualquer tempo, bem como alterar seus sobrenomes nas mesmas hipóteses previstas para as pessoas casadas. § 3º-A O retorno ao nome de solteiro ou de solteira do companheiro ou da companheira será realizado por meio da averbação da extinção de união estável em seu registro”.
18- “Art. 9º-F. O procedimento de certificação eletrônica de união estável realizado perante oficial de registro civil autoriza a indicação das datas de início e, se for o caso, de fim da união estável no registro e é de natureza facultativa (art. 70-A, § 6º, Lei nº 6.015, de 1973). (incluído pelo Provimento CN n. 141, de 16.3.2023) § 1º O procedimento inicia-se com pedido expresso dos companheiros para que conste do registro as datas de início ou de fim da união estável, pedido que poderá ser eletrônico ou não. (incluído pelo Provimento CN n. 141, de 16.3.2023) § 2º Para comprovar as datas de início ou, se for o caso, de fim da união estável, os companheiros valer-se-ão de todos os meios probatórios em direito admitidos. (incluído pelo Provimento CN n. 141, de 16.3.2023) § 3º O registrador entrevistará os companheiros e, se houver, testemunhas para verificar a plausibilidade do pedido. (incluído pelo Provimento CN n. 141, de 16.3.2023) § 4º A entrevista deverá ser reduzida a termo e assinada pelo registrador e pelos entrevistados. (incluído pelo Provimento CN n. 141, de 16.3.2023) § 5º Havendo suspeitas de falsidade da declaração ou de fraude, o registrador poderá exigir provas adicionais. (incluído pelo Provimento CN n. 141, de 16.3.2023) § 6º O registrador decidirá fundamentadamente o pedido. (incluído pelo Provimento CN n. 141, de 16.3.2023) § 7º No caso de indeferimento do pedido, os companheiros poderão requerer ao registrador a suscitação de dúvida dentro do prazo de 15 (quinze) dias da ciência, nos termos dos arts. 198 e 296 da Lei nº 6.015, de 1973. (incluído pelo Provimento CN n. 141, de 16.3.2023) § 8º O registrador deverá arquivar os autos do procedimento. (incluído pelo Provimento CN n. 141, de 16.3.2023) § 9º É dispensado o procedimento de certificação eletrônica de união estável nas hipóteses dos incisos I e III do § 4º do art. 1º deste Provimento”.