Não é surpresa que a prescrição sempre é discutida e revisitada com frequência, seja pela doutrina seja pela jurisprudência.
Em se tratando da prescrição no âmbito tributário, esta pode ser analisada a partir de duas principais modalidades:
- Prescrição para o ajuizamento da execução fiscal: que se encontra prevista no Artigo 174 do Código Tributário Nacional, referindo-se à perda do direito da Fazenda Pública de cobrança do crédito tributário. Nessa forma, o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que, para as dívidas de natureza tributária, o prazo prescricional de cinco anos para cobrança é contado da data da constituição definitiva do crédito tributário, sendo interrompido: (i) pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal; (ii) pelo protesto judicial; (iii) por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor; (iv) por qualquer ato inequívoco ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor.
- Prescrição intercorrente: prevista no Artigo 40, e seus parágrafos, da lei 6.830/80 (lei de Execuções Fiscais), e que configura a perda do direito de cobrança do crédito tributário no curso da execução fiscal por desídia da Fazenda Pública.
Na presente análise, serão delineados alguns aspectos acerca da prescrição intercorrente no âmbito da execução fiscal e respectivas interpretações atribuídas pelo Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal.
Não é demais ressaltar que a intenção do legislador, ao dispor sobre a prescrição intercorrente na lei 6.830/80, seria evitar que a execução de créditos tributários perdurasse indefinidamente no tempo, resguardando, assim, os princípios da segurança jurídica e do devido processo legal, bem como o da duração razoável do processo.
O Artigo 40, acima mencionado, foi posto em discussão no julgamento do Recurso Especial 1.340.533/RS, no qual o STJ fixou 5 teses sobre o tema da prescrição intercorrente, que seguem abaixo transcritas:
Tese firmada no Tema Repetitivo 566:
“O prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo e do respectivo prazo prescricional previsto no art. 40, §§ 1º e 2º da lei 6.830/80 - LEF tem início automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido, havendo, sem prejuízo dessa contagem automática, o dever de o magistrado declarar ter ocorrido a suspensão da execução.”
Tese firmada no Tema Repetitivo 567:
“Havendo ou não petição da Fazenda Pública e havendo ou não pronunciamento judicial nesse sentido, findo o prazo de 1 (um) ano de suspensão inicia-se automaticamente o prazo prescricional aplicável.”
Tese firmada no Tema Repetitivo 568:
“A efetiva constrição patrimonial e a efetiva citação (ainda que por edital) são aptas a interromper o curso da prescrição intercorrente, não bastando para tal o mero peticionamento em juízo, requerendo, v.g., a feitura da penhora sobre ativos financeiros ou sobre outros bens.”
Tese firmada no Tema Repetitivo 569:
“Havendo ou não petição da Fazenda Pública e havendo ou não pronunciamento judicial nesse sentido, findo o prazo de 1 (um) ano de suspensão inicia-se automaticamente o prazo prescricional aplicável.”
Tese firmada no Tema Repetitivo 570:
“A Fazenda Pública, em sua primeira oportunidade de falar nos autos (art. 245 do CPC/73, correspondente ao art. 278 do CPC/2015), ao alegar nulidade pela falta de qualquer intimação dentro do procedimento do art. 40 da LEF, deverá demonstrar o prejuízo que sofreu (exceto a falta da intimação que constitui o termo inicial - 4.1., onde o prejuízo é presumido), por exemplo, deverá demonstrar a ocorrência de qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição.”
Além das teses acima fixadas no citado julgamento, também restou entendido o seguinte:
“A efetiva constrição patrimonial e a efetiva citação (ainda que por edital) são aptas a interromper o curso da prescrição intercorrente, não bastando para tal o mero peticionamento em juízo, requerendo, v.g., a feitura da penhora sobre ativos financeiros ou sobre outros bens. Os requerimentos feitos pelo exequente, dentro da soma do prazo máximo de 1 (um) ano de suspensão mais o prazo de prescrição aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo) deverão ser processados, ainda que para além da soma desses dois prazos, pois, citados (ainda que por edital) os devedores e penhorados os bens, a qualquer tempo - mesmo depois de escoados os referidos prazos -, considera-se interrompida a prescrição intercorrente, retroativamente, na data do protocolo da petição que requereu a providência frutífera.”
“Trocando em miúdos”, a partir das teses acima transcritas e do teor do Acórdão proferido no julgamento do Recurso Especial 1.340.533/RS, pode-se construir as seguintes premissas acerca da prescrição intercorrente no âmbito da execução fiscal:
- Independentemente do despacho do juiz, a partir da notícia de que não foram encontrados bens penhoráveis ou da citação negativa, inicia-se automaticamente o prazo de 1 ano de suspensão da execução.
- Findo o prazo de 1 ano de suspensão, previsto no art. 40 da LEF, inicia-se automaticamente o prazo de prescrição intercorrente de 5 anos.
- Somente a efetiva penhora (total ou parcial) ou a efetiva citação interrompe a prescrição, não bastando o mero peticionamento em juízo.
- Considera-se interrompida a prescrição quando o requerimento da Fazenda Pública for realizado dentro prazo, mas efetivada penhora ou citação frutífera após o prazo da prescrição intercorrente.
Não há dúvidas que o julgamento em referência foi um grande marco para sanear as questões acerca da prescrição intercorrente em matéria tributária, sendo certo que os temas passaram a ser importantes balizadores para a análise da ocorrência ou não da prescrição intercorrente pelas varas e tribunais em todo território nacional.
Não bastasse isso, recentemente (julgamento ocorrido em 22/02/2023) a prescrição intercorrente foi novamente analisada, dessa vez pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 636.562 (Tema 390), cuja tese fixada foi assim definida:
Tese firmada no Tema em Repercussão Geral 390:
“É constitucional o art. 40 da lei 6.830/80 (lei de Execuções Fiscais LEF), tendo natureza processual o prazo de 1 (um) ano de suspensão da execução fiscal. Após o decurso desse prazo, inicia-se automaticamente a contagem do prazo prescricional tributário de 5 (cinco) anos.”
No Leading Case julgado pela Suprema Corte, insistiu a União Federal na discussão se o §4º, do Artigo 40, da lei 6.830/80, seria constitucional à luz do artigo 146, III, b, da Constituição Federal .
O cerne da controvérsia posta pela União Federal era de que, segundo a Constituição Federal, apenas a lei complementar poderia tratar sobre a prescrição e, portanto, o fato de a prescrição intercorrente ter sido disciplinada pela lei 6.830/80 – lei de natureza ordinária – a tornar-se-ia inconstitucional.
Coerentemente à jurisprudência firmada sobre o tema, o Ministro Luís Roberto Barroso, relator no citado julgamento, afastou a argumentação levantada pela União Federal, chancelando que o prazo de suspensão previsto no Artigo 40 da lei 6.830/80 é uma regra de natureza processual, ao passo que a previsão do prazo prescricional, descrita no referido artigo, apenas reitera o disposto no Artigo 174 do Código Tributário Nacional, o que afasta a alegada incompatibilidade com a Constituição Federal.
Portanto, não há nenhuma inconstitucionalidade na regulamentação da chamada prescrição intercorrente.
Por outro lado, apesar de ser matéria reconhecível de ofício pelo juízo, é muito importante ressaltar que a ocorrência da prescrição intercorrente deve ser comprovada pelo executado, especialmente quanto à demonstração da inércia da Fazenda Pública no impulsionamento da execução visando a localização do executado ou de bens penhoráveis, principalmente para afastar a aplicação da Súmula 106 do STJ .
Em suma, como colocado no início, a prescrição é, e sempre será, rediscutida e revisitada, pela doutrina e pelo Judiciário, visto que os temas firmados pelo STJ e STF não esgotaram toda a problemática que permeia a prescrição intercorrente.
Ao final e ao cabo, o que nos resta é confiar que os Tribunais Superiores sempre busquem o respeito aos princípios constitucionais, em especial os citados anteriormente, visando que eventuais novas interpretações sobre a prescrição em matéria tributária sempre estejam alinhadas aos temas já sedimentados por estas Cortes.