Meditação e advocacia: Uma jornada pessoal em busca de equilíbrio

Descobri a meditação durante minha formação em Direito, há quase 20 anos, e desde então, ela tem sido meu farol em meio às tormentas. Lidar com o estresse das provas finais, a elaboração da monografia, o exame da Ordem e as pressões do mercado de trabalho sempre foi uma tarefa árdua e a meditação surgiu como o antídoto que me possibilitou administrar emoções e gerir crises internas, fornecendo ferramentas para lidar com o estresse de maneira serena e consciente.

Porque eu medito

Logo depois de concluir a faculdade, desafiei-me a abrir um escritório e advogar independentemente. Pouco tempo depois, uma proposta de trabalho me levou a São Paulo, onde fui confrontada com inseguranças, pressões, estresse e uma rotina intensa de trabalho e estudos longe de minha família.

Eu era muito jovem morando só numa cidade grande e cheia de complexidades. Felizmente, em todos os episódios desafiadores que vivi, a meditação se mostrou uma ferramenta indispensável para preservar a sanidade, o equilíbrio emocional, resistir às pressões e persistir.

A minha jornada profissional se estendeu, permeada por desafios e transformações, como acontece com a maioria dos profissionais liberais-autônomos. Com os anos, vamos ficando mais seguros e experientes, mas ainda assim não estamos imunes à crises. Recentemente, atravessamos uma pandemia, que provocou medos, incertezas e exigiu de todos nós uma atitude de resiliência e fé, além de atualização e  reinvenção profissional. Em todas essas fases, a meditação foi minha aliada constante, e me ajudou a manter o equilíbrio, a resiliência e a força para continuar.

A meditação sempre foi uma ferramenta muito útil para mim, sempre me ajudou a enfrentar estas crises com mais serenidade e equilíbrio, e praticar um senso de presença e entrega em qualquer situação me ajudando a trabalhar com inteligência emocional em prol da solução dos problemas.

Ao longo dos anos, percebi inúmeros benefícios em minha vida, como um autoconhecimento mais aprofundado, o desenvolvimento de resiliência, paciência e perseverança, uma percepção mais abrangente do mundo e uma capacidade de empatia e conexão mais intensa com as pessoas, sobretudo com meus clientes, que quase sempre se tornam amigos.

Todos estes benefícios que experimentei com a meditação ao longo dos anos me fizeram querer entender mais sobre esta prática milenar. Então iniciei em 2018 um estudo profundo numa especialização sobre a meditação, que culminou em minha monografia - "Meditação: prática para aliviar o estresse em advogados". Durante os estudos de pós-graduação, pude confirmar, por meio de inúmeros livros e artigos científicos, que os benefícios que eu percebi também foram observados em outros praticantes de meditação e corroborados por estudos científicos. 

Porque profissionais da área jurídica deveriam meditar

Enquanto profissional da área jurídica, sei que nosso cotidiano é repleto de estresse constante, alta pressão e uma exigência incessante por atenção e foco. Embora esses desafios sejam intrínsecos à carreira jurídica, estou certa de que a meditação pode nos auxiliar no gerenciamento dessas questões e potencializar nosso desempenho.

Ao longo de minha pesquisa, constatei que a meditação tem inúmeros benefícios psicológicos comprovados, tais como: amplia o bem-estar e a serenidade, minimiza emoções negativas intensas e flutuações de humor, e desenvolve uma conexão mais profunda com os outros através do aumento da empatia. Ela também estimula a criatividade e amplia o senso de sabedoria e intuição.

No contexto jurídico profissional, confirmei por minha própria experiência que a meditação pode ser particularmente útil, pois através dela podemos treinar nossa mente para estar mais presente e focada, podemos aprimorar nossas relações com clientes, colegas e até mesmo com aqueles que nos contrariam no dia a dia, mas com quem temos que nos relacionar.

Nós também podemos melhorar nosso desempenho no trabalho ao adquirir mais concentração e, além disso, a meditação pode nos ajudar a descobrir um sentido de propósito mais profundo em nossa carreira, algo que muitas vezes não está claro para nós.

Para além de tudo isto, caso ainda não tenha se convencido a meditar, devo dizer ainda que a meditação também oferece uma série de benefícios físicos e de saúde cientificamente comprovados. Ela pode ajudar a reduzir os níveis de colesterol, promover o relaxamento muscular, diminuir a intensidade da dor e o estresse, melhorar os processos inflamatórios e dores somáticas, melhorar a saúde cardiovascular e a pressão arterial, e até melhorar a qualidade do sono e reforçar o sistema imunológico.

Não é demais dizer por fim que a meditação pode ser uma prática especialmente benéfica para atenuar quadros de ansiedade, algo tão recorrente nos dias atuais. 

Nos Estados Unidos os estudantes de Direito aprendem a meditar na faculdade

Mas se você ainda estiver cético(a) a respeito dos benefícios da meditação para os profissionais da área jurídica, saiba que nos Estados Unidos diversas universidades incluem na própria grade curricular do curso o ensino da meditação para os acadêmicos de Direito.

A Harvard Law School, por exemplo, reconhece a importância do equilíbrio mental e emocional na prática jurídica, e por isto oferece o curso "Law and Mind Sciences"[1], que aborda, entre outros tópicos, técnicas de mindfulness. Este curso estimula os alunos a explorar como a compreensão e a prática de mindfulness podem aprimorar suas habilidades jurídicas, como a negociação, a resolução de conflitos e a tomada de decisões.

A University of Miami School of Law também é pioneira nessa área e oferece o "Mindfulness in Law Program"[2] desde 2011. O programa busca integrar a prática de mindfulness na vida profissional e pessoal dos alunos, promovendo não apenas o desenvolvimento de habilidades jurídicas mais robustas, mas também a melhoria do bem-estar geral.

A University of California, Berkeley, Law igualmente reconhece a importância do mindfulness para a carreira jurídica. A Universidade oferece aos acadêmicos do curso de Direito uma iniciativa chamada "Berkeley Initiative for Mindfulness in Law[3]", focada em introduzir práticas de mindfulness para estudantes de Direito e profissionais da área.

Esses são apenas alguns exemplos de faculdades de Direito americanas que já adotam a meditação e o mindfulness como partes integrantes de seu currículo por entender claramente a  utilidade e benefícios desta prática no contexto da carreira jurídica. Essa tendência também revela o crescente reconhecimento da importância da saúde mental e do equilíbrio emocional na profissão jurídica e indica a relevância das práticas de meditação na preparação de advogados para lidar com o estresse e a pressão associados a essa carreira. 

Inicie sua própria jornada em meditação e confira por si mesmo os benefícios

Se você, meu caro colega, chegou até aqui, não fique só na leitura deste artigo. Independentemente de sua carga de trabalho ou dos desafios que você enfrenta diariamente, convido-o(a) a experimentar a meditação. Mesmo que você disponha de apenas cinco minutos por dia para se dedicar, comece hoje.

A meditação é uma prática flexível que pode ser adaptada às suas necessidades e horários e se praticada com regularidade certamente trará benefícios positivos para você, pois a meditação não é apenas um bálsamo para o estresse e ansiedade, mas um caminho para a autodescoberta e o aprimoramento profissional e pessoal.

Obviamente, não se trata de um remédio milagroso ou uma solução rápida para todos os problemas, mas sim de um exercício (treinamento) de presença e autoconsciência. Na prática jurídica, onde o estresse e a pressão são partes integrantes do cotidiano, ter um momento para desacelerar e focar na própria saúde mental/emocional/psicológica é essencial.

Vivemos em um mundo acelerado, onde frequentemente nos vemos pegos em um redemoinho de obrigações e responsabilidades, além de um volume imenso de informações que nos bombardeia o tempo todo.

Como advogados(as) frequentemente temos que dar apoio emocional e psicológico para nosso cliente, porém é importante lembrar que também precisamos cuidar de nós mesmos e estar bem para desempenhar nossa nobre missão e fazer o nosso melhor todos os dias. E a meditação pode nos proporcionar esse espaço, esse refúgio de calma e introspecção em meio ao caos de prazos, pressão, muita informação e conflitos.

Além disto,  a prática da meditação pode ser uma jornada de autodescoberta e crescimento. É um convite para olhar para dentro e entender melhor nossas emoções, nossas respostas ao estresse e nossa conexão com o mundo ao nosso redor. Não é um caminho fácil, devo advertir, mas é um caminho recompensador.

Quero reforçar que em minha jornada como advogada, a meditação tem sido um recurso inestimável para lidar com os desafios do dia a dia e manter a sanidade e o equilíbrio. E espero sinceramente que ao compartilhar minha experiência eu possa encorajar outros profissionais do Direito a experimentar esta prática transformadora.

Por fim, lembro que a meditação não é apenas uma ferramenta para lidar com o estresse ou melhorar o foco. Ela é um caminho para uma vida mais plena, equilibrada e consciente. E talvez, ao explorar essa prática, você possa descobrir um novo nível de paz, clareza, auto realização e satisfação em sua carreira e em sua vida.

Jaciane Mascarenhas
Advogada Especialista em Direito Tributário, atua no contencioso e consultivo fiscal há 15 anos, possui expertise em tributos diretos e indiretos, governança tributária e compliance.