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Felicidade - um Direito fundamental implícito na Lei Suprema

É notória a associação dos Direitos de buscar a felicidade com a dignidade da pessoa humana, os direitos fundamentais e o bem-estar social.

21/6/2023

A priori, para se discutir sobre o Direito à busca pela felicidade, é imprescindível a demonstração da pirâmide elaborada pelo psicólogo Abraham Maslow, em 1943, com o intuito de classificar, previamente, a hierarquia das necessidades para cada indivíduo pontualmente. Ou seja, a primeira etapa a ser preenchida no sentido de realização pessoal e de felicidade era a fisiológica (alimentação, sono, água).

Nessa linha, quando os requisitos primários fossem atingidos, o segundo degrau da pirâmide seria a segurança em relação à família, ao emprego, à saúde e à propriedade. Posteriormente, quando o segundo degrau fosse completamente atingido, adentrar-se-ia para o campo da autoestima e das conquistas pessoais. Desse modo, após toda a explanação, pode-se inferir que o Direito a buscar a felicidade coaduna com a tendência a ser multifatorial e temporal, sendo variável e subjetivo.

Nessa toada, diante dos argumentos supracitados, é notória a associação dos Direitos de buscar a felicidade com a dignidade da pessoa humana, os direitos fundamentais e o bem-estar social.  Nesse diapasão, na corte norte-americana, iniciou-se a necessidade de positivação constitucional desse Direito específico, com a finalidade de direcionar o Estado no tocante à responsabilização de gestores, no caso de omissão de políticas públicas.

Para exemplificar, em 1776, foi instituída a Declaração dos Direitos da Virgínia, pautada na dignidade da pessoa humana, no combate à discriminação racial e no pluralismo de ideais. Nesse caso específico, o direito à felicidade tinha um viés de cunho individualizado, de acordo com cada caso concreto, sem ponderações erga omnes.

Esta carta descrevia que  “Consideramos estas verdades como evidentes por si  mesmas, que todos os homens são criados iguais, dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, que entre estes estão a vida, a liberdade e a procura da felicidade”.  Por conseguinte, após quase 200 anos, a Suprema Corte Americana declarou uma lei estadual inconstitucional por ter impedido a miscigenação de casais de raças diferentes e seu respectivo casamento – fato que foi descrito como um marco no Direito Civil americano.

Nesse viés, historicamente falando, apesar dos Estados Unidos tornarem-se os pioneiros a declarar o Direito a buscar a felicidade como um Direito fundamental, o Japão não ficou para trás, promulgando, na Constituição de seu país, o direito coletivo a felicidade com restrições no tocante ao interesse coletivo. Explicando melhor, de acordo com os japoneses, havia validade na positivação na Lei Maior japonesa, entretanto era vedado ultrapassar os interesses da população como um todo.

Por conseguinte, em 2010, com o aumento das demandas processuais pontuais no Brasil, o senador Cristovam Buarque propôs a PEC/19, sobre o direito de buscar a felicidade, tentando inseri-lo no artigo 6º da CRFB/88 como direito social. Todavia, esta PEC foi arquivada em 2015, pois padecia de subjetividade e não preenchia os requisitos necessários a aprovação no Congresso Nacional brasileiro.

Posteriormente, após toda a discussão sobre a felicidade de instituir  a  familia como um núcleo afetivo sui generis, o Supremo Tribunal Federal (STF) pronunciou-se na ADPF 132/RJ e ADI 4277/DF declarando a constitucionalidade da união estável homoafetiva, utilizando-se do preceito da busca pela felicidade.

Nessa linha, a ministro do STF Luiz Fux declarou que “O direito à busca pela felicidade , implícito no artigo 1º,  III da CRFB/88, ao tempo que eleva o indivíduo a centralidade do ordenamento jurídico-político, reconhece sua capacidade de autodeterminação, autossuficiência e liberdade de escolha”. Destarte, é cediço que o ordenamento constitucional e a jurisprudência do Brasil perpetuam o ideal garantista de expansão de Direitos fundamentais com intuito de incentivar o bem-estar social, por meio de políticas públicas.

Entretanto, para muitos juristas a positivação constitucional explícita de mais um Direito fundamental pode descortinar uma certa banalização relacionada aos Direito humanos, promovendo uma inflação de pedidos jurisdicionais. Ademais, o conceito de felicidade, como foi supracitado pelo psicólogo Maslow, tem a tendência à subjetividade de difícil padronização.

Ou seja, quando se expõe o rendimento de 56.000,00 dólares/ano de um cidadão em Cingapura em contraposição a um cidadão da Costa Rica de 14.000,00 dólares/ano, presupõe-se que o primeiro comporta maior felicidade. Todavia, felicidade é multifatorial, devendo ser interpretada com cautela, pois, para muitos a remuneração não promove tal atributo.

Segundo uma pesquisa do FGV – Social de 2011, “ Alguns economistas e pensadores brasileiros tentaram alterar o termo PIB (Produto Interno Bruto) per capita para FIB (Felicidade Interna Bruta) para medir o sucesso de um país”. Nessa toada, de acordo com esta pesquisa, o Brasil teve o menor índice em 15 anos – fato que colocou em xeque a necessidade de se positivar a busca pela felicidade na Lei Maior de 1988. Conquanto, questiona-se se a felicidade pode ser acertadamente medida em parâmetros institucionais, devido ao alto grau de subjetividade.

Para finalizar, é vital argumentar sobre a felicidade como um Direito fundamental que está implícito na Constituição Cidadã no artigo 5º, pois presume-se que institutos como saúde, educação, previdência social, cultura, lazer podem ser valorados como tal. Diante do exposto, a busca individual pela felicidade pressupõe a observância da felicidade coletiva.

Há felicidade coletiva quando são adequadamente observados os itens que tornam mais feliz a sociedade, ou seja, justamente os direitos sociais. Portanto, este assunto exige uma interpretação teleológica efetiva tanto pela sociedade quantro pelos poderes públicos com a finalidade de priorizar a felicidade coletiva.

Joseane de Menezes Condé
Mestranda em Direito FUNIBER, pós graduação em Direito Constitucional Damásio, pós graduanda em direito tributário Anhanguera, coautora do livro novos temas de direito e pós modernidade (2023).

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