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Assinatura digital e sua essencialidade para os contratos eletrônicos

Como forma de materialização da manifestação de vontade, a assinatura digital é uma ferramenta essencial para assegurar a validade dos contratos eletrônicos.

13/6/2023

As transformações tecnológicas e digitais alteraram profundamente as relações negociais e os procedimentos jurídicos. Dentro desse “novo” contexto jurídico-social, nos últimos anos, os contratos eletrônicos ganharam cada vez mais espaço em nossa rotina e, consequentemente, atraem cada vez mais a atuação do direito para ocupar o fundamental papel de dirimir os conflitos advindos do seu estabelecimento.

Seja para aderir a um simples plano de serviço de telecomunicação, otimizar uma agenda atribulada de compromissos ou simplesmente reduzir a burocracia e os custos de um negócio, os contratos eletrônicos surgem como uma ferramenta para assegurar a facilidade e agilidade. Em suma, esses contratos permanecem sob o prisma de um negócio jurídico bilateral e recebem essa denominação especial tão somente pela forma de contratação, que tem o computador e uma rede de comunicação como suportes básicos para sua celebração1.

Justamente por isso, devem atender os requisitos básicos de validade de um contrato: a) a capacidades das partes; b) licitude do objeto; c) legitimação para sua realização; d) o consentimento; e) a causa; f) o objeto e, por fim, g) a forma.

Dentre os pressupostos elencados, a materialização do consentimento por meio eletrônico é certamente um dos pontos que demandam maior atenção sobre o tema. Para a formalização dos instrumentos contratuais, as partes deverão utilizar-se da assinatura digital, regulamentada pela Medida Provisória 2.2002/01, que instituiu a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil) para garantir a validade jurídica de documentos em forma eletrônica. No âmbito da administração pública, as regras são ditadas também pela lei 14.063/20 e decreto 10.543/20.

Não obstante, vislumbra-se que a Medida Provisória não impede a utilização de outros meios de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma eletrônica, inclusive aqueles que utilizem certificados não emitidos pela ICP-Brasil2. Nessa mesma toada, em virtude das possibilidades de expressão do consentimento, a lei 14.063/20 instituiu três classificações de assinatura eletrônica: simples, avançada e qualificada (art. 4º), as quais caracterizarão o nível de confiança sobre a identidade e a manifestação de vontade de seu titular no negócio jurídico (art. 4º, § 1º).

A assinatura simples é realizada de modo bastante simplificado, por meio do preenchimento de dados básicos de identificação do signatário (tais como: RG; CPF; endereço eletrônico etc.).

Por certo, utilizando-se de um meio um pouco mais seguro (validação biométrica; biográfica; documental etc.), porém, a partir de certificados não emitidos pela ICP-Brasil, as assinaturas avançadas associam ao signatário de maneira unívoca. Trocando em miúdos, o documento tem a mesma validade de um documento com assinatura física e, no âmbito da administração pública, passa a ser regulamentado pelo decreto 10.543, de 13 de novembro de 2020.

Ambas podem ser utilizadas para assinar qualquer documento ou contrato em que não se exija forma prescrita em lei e a sua validade independe da chancela de qualquer Autoridade Certificadora, nem possui relação com a Autoridade Certificadora Raiz (ITI). Noutra senda, em face da validação simples da identificação, a validade jurídica depende do consentimento entre as partes envolvidas na transação (art. 10, § 2º da Medida Provisória 2.200-2/01)3.

A propósito, à título de complemento, muito embora enquadrada em um nível intermediário de confiança, convém ressaltar que os tribunais pátrios seguem o entendimento de que "o grau de confiança de identidade dado à assinatura eletrônica de documento que não utilizem certificado digital emitido por autoridade certificadora ICP-Brasil permite prosseguir com a ação de busca e apreensão de rito especial do DL 911/69" (Vide: AC: 07017065820218070005, Relatora: Leila Arlanch, Data de Publicação: 02/08/2021 - Destacamos).

Por fim, a assinatura eletrônica qualificada é aquela que possui nível mais elevado de confiabilidade a partir de suas normas, de seus padrões e de seus procedimentos específicos4, utilizando-se de um certificado digital feito por uma terceira parte (entidade certificadora), que confirma a identidade do autor e funciona de modo similar aos cartórios de nota. Nos termos da Medida Provisória  2.200-2/2001, as declarações constantes dos documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil presumem-se verdadeiros em relação aos signatários (art. 10, § 1º c/c art. 219 do Código Civil).

Nesses termos, um certificado digital nada mais é do que “uma estrutura de dados sob a forma eletrônica, assinada digitalmente por uma terceira parte confiável que associa o nome e atributos de uma pessoa a uma chave pública”. Nesse sentido, o fornecimento de um certificado digital é um serviço semelhante ao de identificação para a expedição de carteiras de identidade, que possui um prazo de validade determinado. O interessado é identificado mediante a sua presença física pelo terceiro de confiança – com a apresentação dos documentos necessários – e este lhe emite o certificado digital5.

Em arremate, no que tange os contratos eletrônicos per si, à luz da jurisprudência moderna, compreende-se em face de suas particularidades, por regra, tendo em conta a sua celebração à distância e eletronicamente, não trará a indicação de testemunhas, o que, por sua vez, não afastaria a sua executividade6.

Portanto, é notório que os contratos eletrônicos fazem parte da prática comercial brasileira, sendo dotados principalmente de integridade, autenticidade e segurança, além de validade jurídica. Não obstante, a análise do negócio jurídico entabulado e sobretudo da interação eletrônica imposta ao ato são fundamentais para a escolha adequada do nível de assinatura digital a ser invocada no caso concreto.

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1 LUCCA, Newton. Aspectos Jurídicos da Contratação Informática e Telemática. São Paulo: Saraiva, 2003.

2 Nesse sentido, vide redação do art. 10, § 2º da Medida Provisória nº 2.200-2/2001: Consideram-se documentos públicos ou particulares, para todos os fins legais, os documentos eletrônicos de que trata esta Medida Provisória. [...] O disposto nesta Medida Provisória não obsta a utilização de outro meio de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma eletrônica, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento.

3 Esse é o entendimento dos Tribunais pátrios no enfrentamento das celeumas: AGRAVO DE INSTRUMENTO. ASSINATURA ELETRÔNICA. VALIDADE DO DOCUMENTO. Os executados impugnaram a assinatura presente no Contrato de Confissão de Dívida. Porém, apesar do alcance distinto, a assinatura eletrônica também garante segurança e autenticidade. Diferente da assinatura digitalizada, a assinatura digital/eletrônica tem o mesmo valor de uma realizada a próprio punho. A agravante não negou a contratação da confissão de dívida, o que fazia presumir sua validade. Isto é, em nenhum momento no recurso a parte negou que seu representante fosse o autor daquela assinatura digital. Incidência do o § 2o do artigo 10º da Medida Provisória 2.200-2/2001. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça e desta Turma julgadora. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO IMPROVIDO. (TJ-SP - AI: 20314981720228260000 SP 2031498-17.2022.8.26.0000, Relator: Alexandre David Malfatti, Data de Julgamento: 07/04/2022, 12ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 07/04/2022).

4 Nesse sentido, colhe-se o Informativo nº 541 de 11 de junho de 2014 do Superior Tribunal de Justiça, REsp 1.442.887-BA, Relatora a Ministra NANCY ANDRIGHI, julgado em 06/05/2014, bem como Resp 1.495.920-DF, relator o Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Terceira Turma, julgado em 15/05/2018, destacando-se a ementa: "[...] A assinatura digital de contrato eletrônico tem a vocação de certificar, através de terceiro desinteressado (autoridade certificadora), que determinado usuário de certa assinatura a utilizara e, assim, está efetivamente a firmar o documento eletrônico e a garantir serem os mesmos os dados do documento assinado que estão a ser sigilosamente enviados. 6. Em face destes novos instrumentos de verificação de autenticidade e presencialidade do contratante, possível o reconhecimento da executividade dos contratos eletrônicos”.

5 MENKE, Fabiano. Assinatura Eletrônica no Direito Brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

6 Sobre a questão, cita-se: [...] A assinatura digital de contrato eletrônico tem a vocação de certificar, através de terceiro desinteressado (autoridade certificadora), que determinado usuário de certa assinatura a utilizara e, assim, está efetivamente a firmar o documento eletrônico e a garantir serem os mesmos os dados do documento assinado que estão a ser sigilosamente enviados. 6. Em face destes novos instrumentos de verificação de autenticidade e presencialidade do contratante, possível o reconhecimento da executividade dos contratos eletrônicos. 7. Caso concreto em que o executado sequer fora citado para responder a execução, oportunidade em que poderá suscitar a defesa que entenda pertinente, inclusive acerca da regularidade formal do documento eletrônico, seja em exceção de pré-executividade, seja em sede de embargos à execução. 8. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (STJ - REsp: 1495920 DF 2014/0295300-9, Relator: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 15/05/2018, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/06/2018)

Letícia Marina da S. Moura
Advogada e jornalista. Especialista em Direito Empresarial e Falência e Recuperação de Empresas. Membro do Grupo de Estudos Avançados em Processo Recuperacional e Falimentar da Fundação Arcadas/USP.

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