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ISS - Local de pagamento no domicílio do tomador

Essa proposta legislativa que está em tramitação na Câmara dos Deputados a meu ver restou prejudicada pela declaração de inconstitucionalidade dos aludidos incisos XXIII, XXIV e XXV do art. 3º da LC 116/03.

6/6/2023

O local de pagamento do ISS de regra é o local do estabelecimento do prestador e na ausência de estabelecimento, o local do domicílio prestador, com exceção dos serviços de construção civil, quando o imposto será pago no local da prestação. Era o que dispunha o art. 12 do decreto-lei 406/68.

O STJ nessa matéria nunca acompanhou a letra da lei promovendo a inovação legislativa.

Interpretando o referido art. 12 a Corte consagrou o entendimento de que o imposto deve ser pago no Município onde o serviço for prestado, e não apenas nos casos de construção civil como prescreve o texto legal.

Isso porque a lei municipal não pode surtir efeitos fora de seu território.

Esse entendimento estaria correto não fosse a regra do art. 102 do CTN in verbis.

“Art. 102. A legislação tributária dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios vigora, no País, fora dos respectivos territórios, nos limites em que lhe reconheçam extraterritorialidade os convênios de que participem, ou do que disponham esta ou outras leis de normas gerais expedidas pela União.”

Com o advento da LC 116/03 foram estabelecidas, pelo seu art. 3º, vinte e duas exceções prescrevendo o pagamento do imposto no local da prestação.

No início da vigência desse novo diploma legal o STJ passou a respeitar a disposição normativa.

Contudo, pouco tempo depois o STJ retomou a sua antiga tese de tributação no local do estabelecimento, só que agora fundada no conceito de estabelecimento que ganhou elasticidade.

É conhecido o caso de uma prestadora de serviço de informática localizada em São Paulo que prestou serviços em Brasília. O tomador havia disponibilizado para a prestadora dois empregados para auxiliar nos serviços de remoção de móveis e outros objetos. Foi o suficiente para a Corte entender que havia estabelecimento da prestadora em Brasília e determinou o pagamento do imposto no Distrito Federal.

Em relação ao leasing, normalmente operado por Bancos que têm vários estabelecimentos, o STJ firmou a inusitada tese de que o imposto é devido no local em que se perfectibilizou o arrendamento mercantil, assim entendido o local onde houve aprovação do financiamento, considerando que o elemento nuclear do leasing é o financiamento.

Com advento da LC 157/16 houve acréscimos dos incisos XXIII (4.22, 4.23, e 5.09), XXIV (15.01) e XXV (10.04 e 15.09) quando o ISS deverá ser pago no local do domicílio do tomador.

Essa lei complementar criou a quarta modalidade de local de pagamento do imposto: a) no local do estabelecimento do prestador; b) no local do domicílio do prestador; c) no local da prestação do serviço; e d) e agora, no local do domicílio do tomador.

A lei complementar 175/20 promoveu alteração parcial do inciso XXV do art. 3º da LC 116/03 para manter apenas o subitem 15.09 (leasing) para a hipótese de pagamento do ISS no local do domicílio do tomador.

Essas alterações do local do pagamento do imposto foram feitas pelo Congresso Nacional, de um lado, para propiciar a tributação pelo maior número de Municípios atendendo aos pleitos dos Prefeitos, e de outro lado, para afastar as incertezas jurídicas acerca do local do pagamento do imposto. Na verdade, a lei sempre foi clara. A interpretação jurisprudencial é que trouxe dúvidas e incertezas.

Para afastar essa última objeção bastaria alterar a redação do caput do art. 3º da LC 116/03 dispondo que “o serviço se considera prestado, e o imposto devido, no local do estabelecimento prestador assim entendido aquele procurado pelo tomador” para bem definir o local de pagamento na hipótese de empresas com múltiplos estabelecimentos (agência, filial, sucursal etc.). Se o pretendente do arrendamento mercantil procurou o estabelecimento do Banco X localizado na Rua Y, pouco importa que o gerente desse estabelecimento tenha consultado a sucursal ou a sede do Banco localizado em outro Município para autorizar o financiamento. O serviço será sempre prestado no estabelecimento localizado na Rua Y, sendo que a consulta ou pedido de autorização na sucursal ou matriz é meio para se concluir a prestação do serviço. Não há como confundir atividade-fim que é tributada com a atividade-meio insusceptível de tributação.

Na verdade, o móvel da ação do legislador era o de agradar o maior número de prefeitos, provendo a dispersão do local de pagamento do imposto, pouco importando a dificuldade operacional e o enorme custo que implica.

De fato, determinar o pagamento do imposto no local do domicílio do tomador, por exemplo, na hipótese de administração de cartão de crédito/débito será uma loucura. A administradora, ao invés de recolher o ISS no local onde está estabelecida, terá que recolher praticamente em mais de 5.565 municípios.

E mais, o conceito de domicílio não é exatamente preciso, ensejando frequentes confusões com o conceito de residência.

Por tais razões, o Ministro Alexandre de Moraes, Relator da ADIn 5.835 MC/DF deferiu a Medida Cautelar para suspender a eficácia do art. 1º da lei complementar 157/16, na parte que modificou o art. 3º, XXIII, XXIV e XXV, e os §§ 3º e 4º, do art. 6º da LC 116/03, bem como, por arrastamento, para suspender a eficácia de toda a legislação local editada para sua direta complementação (ADIn 5.835 / MC / DF Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJede 4-4-2018).

O Plenário do STF já formou maioria para declarar a inconstitucionalidade dos dispositivos suspensos pela Medida Cautelar procedendo-se o cancelamento do pedido de destaque formulado pelo Ministro Gilmar Mendes, em sessão do dia 3/4/23.

Autoridades judiciárias e legislativas se revezam na tarefa de introduzir insegurança jurídica na cobrança desse imposto.

Afastada pelo STF a última insegurança jurídica, qual seja, a de detectar corretamente o local de domicílio do tomador, é provável que outras medidas legislativas sejam editadas.

Aliás, indiferente à decisão do STF o Senado Federal já aprovou o PLC 445/17 que dispõe sobre o Padrão Nacional de Obrigação Acessória do ISS incidente sobre os referidos incisos XXIII, XXIV e XXV do art. 3º da lei complementar 116/03, criando o Comitê Gestor de Obrigações Acessórias – CGOA – burocratizando e dificultando o cumprimento das obrigações acessórias do ISS.

Essa proposta legislativa que está em tramitação na Câmara dos Deputados a meu ver restou prejudicada pela declaração de inconstitucionalidade dos aludidos incisos XXIII, XXIV e XXV do art. 3º da LC 116/03.

Kiyoshi Harada
Sócio do escritório Harada Advogados Associados. Especialista em Direito Tributário pela USP. Presidente do Instituto Brasileiro de Estudos de Direito Administrativo, Financeiro e Tributário - IBEDAFT.

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