Até pouco tempo faz, a percepção da qualidade na prestação de serviços jurídicos era definida única e exclusivamente pela profundidade jurídica apresentada pelos players do mercado e para possamos fazer uma analise um pouco mais abrangente, precisamos voltar um pouco no tempo.
No Brasil e em varias partes do mundo, à exceção dos EUA e da Europa, a existência de escritórios e mais estruturados para atender as demandas de corporações multinacionais é relativamente recente. Como em qualquer mercado com pouca concorrência, os poucos players capazes de atender esse aumento de demanda praticamente definiam seu estilo e principalmente seus preços, pois as empresas haviam poucas opções de escolha.
Só para lembrar, no Brasil a abertura para o mercado internacional se deu apenas na década de 90 e foi exatamente nessa década que houve um boom de crescimento dos escritórios existentes e acompanhada da aparição de dezenas de novos escritórios. Isso agora faz parte da história e atualmente em todo o mundo, a quantidade de escritórios internacionais ou aqueles nacionais mas com capacidade de atender empresas multinacionais é enorme. Uma grande maioria têm seus “international desks” com advogados especializados em legislação estrangeira e aptos a tender bem qualquer demanda internacional.
Outro ponto muito importante diz respeito à estruturação e organização dos escritórios que passou par uma efetiva revolução. Aquela estrutura individual ou ao estilo familiar tradicionalista deu lugar à uma organização empresarial moderna e tecnológica com controles iguais ou superiores àqueles de seu próprios clientes.
O mercado de serviços jurídicos, dessa forma, evoluiu de oligopólio, com poucos e significantes players para uma situação de concorrência “quase” perfeita onde ainda existe uma elite de mega escritórios internacionais que ainda centraliza boa parte das grandes operações internacionais, mas que também existe uma gama enorme de pequenos e médios escritórios com capacidade e qualidade para atender demandas mais complexas. Ainda bem!
Essa mudança de mercado induziu a uma mudança drástica na avaliação da qualidade na prestação dos serviços jurídicos por parte dos clientes. Como atualmente existem muitas opções de escolha entre os vários prestadores de serviços existentes e para qualquer demanda ou complexidade jurídica, a chamada percepção da qualidade tem mudado radicalmente por parte dos clientes.
O que então caracteriza a qualidade na prestação de serviços jurídicos?
A primeira observação é que a qualidade jurídica deixou de ser o critério de escolha, pois num mercado competitivo ela se tornou a premissa para estar nele! A quantidade atual de escritórios com excelente qualidade técnica-jurídica é enorme e por isso o grande diferencial passou a ser outros atributos que antigamente não eram sequer cogitados.
Da mesma forma que num restaurante a qualidade da comida oferecida não garante o sucesso, em escritórios de advocacia a qualidade técnica também não é garantia.
Num restaurante, além da qualidade de seus pratos, que é premissa para estar no mercado, outros fatores contribuem e definem sua qualidade:
Conhecer o negócio de cliente. É importantíssimo que o advogado conheça profundamente todas as peculiaridades de funcionamento e a atividade de seu cliente para poder orientá-lo juridicamente tanto no âmbito interno quanto no externo. Este é um dos motivos que atualmente clientes tem proferido a modalidade de “secondment” com seus escritórios contratados. Uma visita (sem custos) ao site físico de seu cliente para conhecer e entender bem o funcionamento de sua estrutura é bastante recomendável.
Falar a língua do cliente. O advogado precisa entender que quando o cliente o procura, está com um problema de negócios e o advogado não pode transformá-lo simplesmente num problema jurídico. Cabe ao advogado orientar seu cliente sobre todas as formas possíveis de solução do problema e seus respectivos riscos envolvidos e a solução juridicamente perfeita pode não ser aquela que melhor satisfaça as expectativas do cliente. Este pode ser um do pontos mais difíceis de ser atingido, pois executivos e advogados tem formações, visões e linguagem muito diferentes dificultando muito a comunicação.
Desenvolver empatia com o cliente. Isto quer dizer ter afinidade de ideias, o mesmo “mindset” e se envolver com o problema do cliente, ou seja, ter a mesma postura com relação ao comportamento e atitudes corporativas frente ao mercado. Clientes modernos e vanguardistas costumam não se dar muito bem com escritórios tradicionalistas. Cabe ao advogado se adaptar ao cliente e não o inverso.
Ser tecnologicamente compatível com o cliente. Isto é quase um corolário do item anterior. O mercado consumidor de serviços jurídicos está se atualizado e sofisticando tecnologicamente de maneira muto veloz (exemplos das fintech’s e outras startups que necessitam de apoio jurídico). Os escritórios de advocacia precisam estar no mesmo nível tecnológico, ou maior, de seus clientes, sendo o eventual atraso tecnológico além passar uma imagem negativa interfere sensivelmente na rapidez das respostas que o cliente necessita e está acostumado.
Ser responsivo. Isto quer dizer duas coisas: estar sempre disponível e acessível ao cliente (a qualquer hora!) e responder as demandas no prazo solicitado pelo cliente ou preferencialmente antes disso. .Escritórios que nos seus sites não declaram endereços de e-mail (ou em alguns casos até mesmo o telefone) de seus sócios estarão fadados a perder suas posições de mercado no futuro.
Para analisarmos essa afirmação precisamos entender melhor a relação entre exigência e preço. A exigência podemos definir grosseiramente como o oposto à tolerância e está diretamente vinculada ao preço pago por um bem ou serviço.
Pensemos: qual é a tolerância a qualquer pequeno defeito quando um cliente adquire um auto de luxo, um relógio, uma joia? Resposta: Nenhuma!
Vamos lembrar que os serviços advocatícios e médicos estão entre os mais custosos do mercado e esta característica confere ao cliente esse comportamento exigente que precisa ser satisfeito e nesta nossa analogia metafórica, podemos e devemos compará-los aos restaurantes sofisticados e de alto nível (tipo estrelados pelo Michelin).
Outros fatores acessórios. Como os sommeliers e manobristas nos restaurantes, também contribuem para a percepção da qualidade: a delegação correta de profissional qualificado para a solução do desafio; a postura acolhedora e auxiliadora de recepcionistas e secretárias; o acesso fácil e tempestivo às informações de seus assuntos; o recebimento de relatórios claros e elucidativos sobre os trabalhos realizados e estrutura tecnologia compatível com a exigências o cliente (são apenas alguns exemplos).
Da mesma forma que existem diferentes níveis de sofisticação / preço nos restaurantes, também existem diferenças nos vários níveis de sofisticação jurídica / preços nos escritórios de advocacia, porém uma coisa é certa: qualidade jurídica é premissa!