A Lei Maria da Penha foi sancionada com a finalidade de criar mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, trazendo disposições sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar, bem como alterações legislativas (Código de Processo Penal, Código Penal e Lei de Execução Penal).
A Lei Maria da Penha visa garantir assistência e proteção à mulher em situação de violência doméstica e familiar e, em alguns casos, autoriza o afastamento da mulher do trabalho, sem a perda do emprego.
Essa medida de proteção consta no art. 09°, §2°, inciso II da Lei Maria da Penha (lei 11.340/06, o qual dispõe que o afastamento do trabalho poderá ocorrer pelo período de até 6 (seis) meses e o vínculo de emprego deve ser mantido, sem que a empregada sofra qualquer punição do empregador pela sua ausência:
Art. 9º: A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, no Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente quando for o caso. [...]
§ 2º O juiz assegurará à mulher em situação de violência doméstica e familiar, para preservar sua integridade física e psicológica: [...]
II - manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses. - grifos nossos
Na prática, o Superior Tribunal de Justiça entende que se aplica o mesmo procedimento do afastamento previdenciário comum por motivo de doença, ou seja, os primeiros 15 (quinze) dias devem ser pagos pelo empregador e os dias e/ou meses subsequentes, serão pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Isso porque, diante da falta de previsão legal, a jurisprudência conclui que incide o auxílio-doença no período de afastamento do trabalho, quando referido afastamento decorre de violência doméstica e familiar, pois tal situação advém da ofensa à integridade física e psicológica da mulher.
Ainda, necessário pontuar que o Juiz competente para determinar o afastamento do trabalho é o Juiz da vara especializada em violência doméstica e familiar ou, caso não haja na localidade, o juízo criminal.
Trata-se de uma apreciação de pedido de imposição de medida protetiva de manutenção de vínculo trabalhista, em razão de afastamento do trabalho da vítima da violência doméstica e familiar. Ou seja, o motivo do afastamento não advém de relação de trabalho, mas de situação emergencial que visa garantir a integridade física, psicológica e patrimonial da mulher.
E para visualizar bem o cenário apresentado, copiamos abaixo fragmento de uma decisão do Superior Tribunal de Justiça:
RECURSO ESPECIAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR. MEDIDA PROTETIVA. AFASTAMENTO DO EMPREGO. [...] AUXÍLIO-DOENÇA. INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL. [...]
1. Tem competência o juiz da vara especializada em violência doméstica e familiar ou, caso não haja na localidade o juízo criminal, para apreciar pedido de imposição de medida protetiva de manutenção de vínculo trabalhista [...].
2. Tem direito ao recebimento de salário a vítima de violência doméstica e familiar que teve como medida protetiva imposta ao empregador a manutenção de vínculo trabalhista em decorrência de afastamento do emprego por situação de violência doméstica e familiar [...].
3. Incide o auxílio-doença, diante da falta de previsão legal, referente ao período de afastamento do trabalho, quando reconhecida ser decorrente de violência doméstica e familiar, pois tal situação advém da ofensa à integridade física e psicológica da mulher e deve ser equiparada aos casos de doença da segurada, por meio de interpretação extensiva da Lei Maria da Penha.
4. Cabe ao empregador o pagamento dos quinze primeiros dias de afastamento da empregada vítima de violência doméstica e familiar e fica a cargo do INSS o pagamento do restante do período de afastamento estabelecido pelo juiz, com necessidade de apresentação de atestado que confirme estar a ofendida incapacitada para o trabalho e desde que haja aprovação do afastamento pela perícia do INSS, por incidência do auxílio-doença, aplicado ao caso por meio de interpretação analógica.
(REsp 1757775/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 20/08/2019, DJe 02/09/2019)
Portanto, a mulher que sofre violência doméstica e entra com processo criminal contra o agressor, pode pedir como uma das medidas de proteção de sua integridade física e moral, o seu afastamento do trabalho, sendo que se deferido, também lhe é garantido meio de subsistência enquanto pendurar o afastamento (limitado a 6 meses), pois equipara-se a afastamento previdenciário por motivo de doença comum.