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O projeto de REFIS apresentado pelo partido Novo e a decisão do STF pela quebra da coisa julgada tributária

O presente artigo, em um primeiro momento, busca fazer uma breve análise acerca da recente decisão do STF pela quebra da coisa julgada tributária e de seus desdobramentos no campo da segurança jurídica.

23/3/2023

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), por unanimidade, em decisão prolatada no início de fevereiro (08/2/23), em sede de repercussão geral, determinou que a coisa julgada em matéria tributária de trato continuado perde os seus efeitos quando sobrevier novo entendimento da Suprema Corte em sentido contrário ao da decisão definitiva, não havendo necessidade de ser interposta ação rescisória.

A justificativa adotada foi de que a decisão judicial transitada em julgado permanece somente enquanto perdurarem as mesmas condições fáticas e jurídicas que ensejaram tal decisão.

Na prática, isso implica que aquele contribuinte que obteve decisão favorável, já transitada em julgado, autorizando o não recolhimento de determinado tributo, perde tal prerrogativa no momento em que o STF entende pela sua constitucionalidade.

Neste sentido, nota-se no julgamento de dois recursos o entendimento ora mencionado: o RE 955227 (Tema 885) e RE 949297 (Tema 881) de relatoria dos ministros Luís Roberto Barroso e Edson Fachin, respectivamente.

A questão controvertida que ensejou o julgamento dos recursos envolvia o interesse da União na volta de recolhimento da CSLL - Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, e no direito de algumas empresas, conquistado na década de 1990, mediante coisa julgada, de serem desoneradas do recolhimento de tal tributo, o qual, por decisão do próprio STF, foi declarado constitucional no ano de 2007 no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 15.

À vista disso, a Corte determinou que as empresas que obtiveram decisão transitada em julgado que reconhecia, em sede de controle difuso, a inconstitucionalidade da CSLL, deverão voltar a pagar o tributo de forma retroativa, desde 2007, momento em que foi declarada a sua constitucionalidade, desde que respeitado o princípio da Anterioridade Nonagesimal ou Noventena.

Isto posto, apesar da determinação do Supremo pela necessidade de observância de princípios como o da Anterioridade de Exercício, da Anterioridade Nonagesimal e da Irretroatividade, os ministros, por maioria, decidiram pela não modulação dos efeitos da decisão, pauta fortemente reivindicada pelos contribuintes, haja vista que uma vez concedida, a cobrança não seria retroativa ao ano de 2007.

Por sua vez, a Suprema Corte se posicionou sobre a questão aduzindo que a decisão adotada pela não modulação de efeitos não gera um quadro de insegurança jurídica, uma vez que já existia precedente firmado pelo STF que expressamente afirmava a constitucionalidade do tributo.

Nas palavras do próprio ministro Barroso:

“A insegurança jurídica não foi criada pela decisão do Supremo. A insegurança jurídica foi criada pela decisão de, mesmo depois da orientação do Supremo de que era devido, continuar a não pagar e a não provisionar. (...) Se você for num cassino e fizer uma aposta você está num quadro de insegurança jurídica e pode ganhar ou perder. De modo que a partir do momento em que o Supremo diz que o tributo é devido, quem não pagou ou provisionou fez uma aposta”.

Todavia, torna-se de suma importância o seguinte questionamento: não seria a própria decisão de desconstituição da coisa julgada uma incitadora de um quadro de inseguranças que faria jus à modulação de efeitos?

Dessa forma, a tese fixada no julgamento, apesar da decisão pela não modulação de efeitos, instituiu que conforme a natureza do tributo, para as decisões proferidas em ação direta ou em sede de repercussão geral, os efeitos das decisões transitadas em julgado são automaticamente interrompidos, devendo, contudo, serem respeitadas a irretroatividade, a anterioridade anual e a noventena ou a anterioridade nonagesimal.

Mister salientar que tal decisão se aplica somente para aqueles tributos que são recolhidos de forma continuada, ou seja, de trato sucessivo, uma vez que para os casos em que o tributo é cobrado uma vez só, mesmo que presente decisão superveniente do STF em sentido contrário, a decisão transitada em julgado continua a produzir seus efeitos.

Sendo assim, sob tal cenário de clara insegurança jurídica para os contribuintes, visando atenuar os efeitos da decisão da Suprema Corte, a bancada do partido Novo apresentou na Câmara dos Deputados um projeto de REFIS (Programa de Recuperação Fiscal) para aqueles afligidos pela decisão do STF, visando a regularização e renegociação de dívidas tributárias contraídas perante a União.

O programa proposto estabelece inúmeras benesses aos que comprovarem subsunção aos temas 881 e 885 do Supremo Tribunal Federal, aqui discutidos. Dentre elas, seis diferentes categorias de pagamento, que variam entre o parcelamento em até 240 prestações mensais com redução de 50% de juros e multas, até o pagamento à vista com redução de 100% de juros e multas.

Por fim, realizada esta breve análise sobre o tema, resta patente a conclusão no sentido de que a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal gerou diversos reflexos, os quais inegavelmente geraram quadros de insegurança jurídica perante os contribuintes, uma vez que, nas palavras dos próprios deputados autores do projeto:

 “Ter que se resguardar do passado é, agora, algo inédito que poderá ser necessário fazer no Brasil”.

Felipe Tecchio Schulz
Acadêmico de Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUCPR e estagiário no escritório Clivatti & Wengerkiewicz Advocacia Empresarial.

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