No dia 13/2/23 a comunidade jurídica nacional foi surpreendida com o requerimento, formulado pelo INSS, de suspensão nacional de todos os processos que versam sobre o Tema 1102 da repercussão geral, onde ficou consagrada a tese da revisão da vida toda.
A autarquia previdenciária trouxe alguns argumentos recorrentes em sua defesa judicial, a exemplo do elevado número de segurados atingidos, as cifras potencialmente elevadas do custo desta revisão judicial e, por fim, as dificuldades administrativas para implementação desse recálculo do valor dos benefícios em larga escala (nacional).
Compreendemos que esses argumentos, apesar de relevantes, são de ordem extraprocessual e até mesmo extrajurídica, mas sobretudo intempestivos, tendo em vista que já ocorreu a conclusão do julgamento do referido Tema 1102 da repercussão geral em 1/12/22.
E, neste caso, o requerimento do INSS se encontra em franca colisão com o disposto no art. 1.039 do CPC:
Art. 1.039. Decididos os recursos afetados, os órgãos colegiados declararão prejudicados os demais recursos versando sobre idêntica controvérsia ou os decidirão aplicando a tese firmada.
O alcance desse dispositivo processual é explicado com maestria por LUIZ DELLORE, Professor de Direito Processual Civil da Universidade Mackenzie:
A partir de qual momento a tese fixada em sede de repetitivo deve ser observada? (...) A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que ‘a ausência de trânsito em julgado, ou mesmo da publicação do acórdão, do recurso apreciado sob o rito do art. 543-C do CPC não impede a aplicação do entendimento ali exarado às demais situações semelhantes apreciadas por esta Corte.’ (...) Assim, por esse posicionamento, tão logo concluído o julgamento – antes mesmo da publicação do acórdão ou do julgamento de eventuais declaratórios – já é possível que a tese repetitiva seja aplicada aos demais casos com a mesma questão de direito, e questão sobrestados.
(GAJARDONI, Fernando da Fonseca et alli, Comentários ao Código de Processo Civil, 4ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 1583)
É entendimento consolidado no Supremo Tribunal Federal a desnecessidade de se aguardar a publicação de acórdão quando a decisão for proferida pelo Plenário, muito menos que se aguarde o trânsito em julgado para que os processos até então sobrestados retomem seu curso processual.
Vale sublinhar que o sobrestamento de processos determinado pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 999, dos recursos especiais repetitivos, se deu tão somente para que se aguardasse a decisão final do Supremo Tribunal Federal no mesmo tema, evitando-se decisões contraditórias, não havendo atualmente mais motivos para que o sobrestamento seja mantido, muito menos em âmbito nacional.
Ao revés, conforme indicado acima, o art. 1039 do estatuto processual determina a imediata retomada de curso dos processos até então sobrestados.
Ora, se tão somente decidida a tese discutida em sede de repercussão geral impõe-se o dever de aplicá-la de imediato aos demais casos que versem sobre o mesmo assunto (conforme art. 1039, mas também com fundamento no art. 927, ambos do CPC), não se vislumbra respaldo legal para o pedido intempestivo de sobrestamento posterior de processos que cuidem de Tema decidido pelo Excelso Pretório.
Apesar de haver notória preocupação com a situação jurídica e econômica dos milhares de aposentados que poderão se valer da tese fixada no Tema 1102 da repercussão geral, muitos deles pessoas idosas e/ou com a saúde comprometida, compreendemos que, neste estágio do julgamento, sequer é cabível a apreciação de argumentos de ordem extraprocessual e extrajurídica, assim como aqueles que foram apresentados pelo INSS em seu requerimento.
Doravante, o Tema 1102 da repercussão exige, pura e simplesmente, que se dê cumprimento ao modelo processual de precedentes qualificados estabelecido com clareza pelo advento do Código de Processo Civil de 2015, não havendo respaldo no ordenamento jurídico para pedido superveniente de sobrestamento de recursos, em total contrariedade ao que dispõe o art. 1039 do CPC.