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A neutralidade não é neutra!

O precedente sob análise, e que já formou maioria para derrubar a lei de Rondônia, no controle concentrado gerará efeitos contra todos e vinculantes, constituindo precedente relevante para barrar todas estas iniciativas que de neutras não tem nada!

10/2/2023

O movimento LGBTQIA+ (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, transgêneros, queers, intersexuais, assexuais e o + simboliza outros gêneros/sexualidade que não são contemplados nessas letras) é um processo de luta e resistência por um espaço igualitário e promoção de direitos.

Parcela do movimento tem questionado o binarismo presente na língua portuguesa e reivindicando uma forma de se comunicar que inclua mulheres e pessoas não binárias, evitando o uso do gênero masculino universal, a fim de promover a igualdade e evitar exclusões. 

Ainda que o português falado hoje não é igual ao de nossos antecedentes, algumas mudanças geram mais críticas que outras, como é o caso da linguagem inclusiva, o que demonstra o preconceito estrutural de certos setores da sociedade.

Desde o ano de 2020, tem sido observado um aumento de projetos de lei que associam a utilização da linguagem neutra com suposta “ideologia de gênero”. Estes projetos têm claras proibições quanto a utilização de variações linguísticas em escolas públicas e privadas, além da vedação em materiais didáticos e atividades culturais.

A inconstitucionalidade flagrante de tais iniciativas legislativas está posta perante o Supremo Tribunal Federal (STF) que, no dia 09 de fevereiro de 2023, formou maioria para declarar inconstitucional a Lei Estadual nº 5.123 de 2021, do Estado de Rondônia, que proíbe expressamente a linguagem neutra na grade curricular e material didático de instituições de ensino público ou provado, assim como em editais de concursos públicos. Para o autor do aludido projeto de lei, a linguagem não binária ou inclusiva é uma “verdadeira deturpação da língua portuguesa”.

Sobre tal questão, a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino argumentou ao STF em ação direta de inconstitucionalidade (ADIn) que a norma apresenta a marca da intolerância, da discriminação, da negação da diversidade, da liberdade de aprender e ensinar e do pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas.

A liminar deferida para suspensão da lei baseando-se na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional da União e nos parâmetros curriculares nacionais do Ministério da Educação concluiu que as diferentes variedades da língua portuguesa visa combater o preconceito linguístico, “retirando vieses que usualmente subordinam um gênero em relação a outro”. A liminar ainda pontua que a linguagem inclusiva expressa elemento essencial da dignidade das pessoas, e “como tal, cabe ao Estado apenas o papel de reconhece-la, nunca de constituí-la”.

De modo contrário, a prefeita do município Rancho Queimado (SC) ao anunciar que encaminhou, no dia 8 de fevereiro de 2023, um Projeto de Lei proibindo o uso de “pronomes neutros” nas escolas, argumentou que “a gente fala para todos, a gente não fala para todes”. A iniciativa não está isolada, no Estado do Paraná, deputados estaduais aprovaram o projeto de lei 21.362/23 que impede a utilização da linguagem inclusiva em qualquer nível institucional; em Mato Grosso do Sul, foi sancionada uma lei que torna obrigatório o uso da norma culta da língua portuguesa em documentos oficiais e materiais didáticos no ambiente escolar; em Belo Horizonte, em Joinville (SC) e em Juiz de Fora (MG) há também projetos que proíbem a linguagem neutra.

O precedente sob análise, e que já formou maioria para derrubar a lei de Rondônia, no controle concentrado gerará efeitos contra todos e vinculantes, constituindo precedente relevante para barrar todas estas iniciativas que de neutras não tem nada!

Melina Girardi Fachin
Advogada e professora adjunta dos cursos de graduação e pós graduação da UFPR.

Kassia Hellen Martins
Acadêmica de Direito pela Universidade Positivo (2019-2023) e membra da ANAJUDH-LGBTI.

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