Tem se consolidado, em âmbito global, o entendimento no sentido de que as empresas desempenham um papel que vai além da gestão do negócio voltada somente à obtenção e distribuição de lucro. Isso porque as atividades empresariais geram - ou podem gerar - impactos em diversos setores da sociedade, de forma direta ou indireta, benéficos ou maléficos. Em vista disso, mais do que nunca, se observa o dever e a necessidade de as empresas analisarem o impacto das atividades desempenhadas, de modo que eventuais atividades e/ou condutas prejudiciais à sociedade como um todo – especialmente relacionadas às questões ambientais e sociais – possam ser prevenidas, corrigidas e/ou reparadas, bem como para que implementem, proativamente, medidas voltadas, dentre outras, à preservação e recuperação do meio ambiente; às ações afirmativas e de gestão transparente e responsável.
Ao contrário do que muitos podem pensar, a responsabilidade pelo desenvolvimento sustentável não recai sobre um único setor da sociedade (o estatal). Não incumbe somente aos Estados (nacionais, já que falamos, aqui, de âmbito global) a implementação de medidas voltadas ao desenvolvimento sustentável. Essa é uma agenda que deve ser adotada e trabalhada pelos Estados Nacionais, pelas empresas e pelas pessoas, em conjunto, e que está consubstanciada na sigla ESG, que significa Environmental, Social and Governance (Meio Ambiente, Social e Governança).
É importante destacar que a temática do desenvolvimento sustentável não é nova. Entretanto, ela passou a ganhar mais força e visibilidade com a sua consubstanciação na sigla ESG, que passou a ser amplamente adotada, debatida e estudada a partir da primeira década deste século, especialmente em decorrência da publicação do Who Cares Wins – Connecting Financial Markets to a Changing World, pelo Pacto Global, em 2004, e do PRI - Principles for Responisble Investment da ONU, em 2006, nas quais há, expressamente, considerações, medidas, ideias, princípios, etc., relacionados ao ESG.
Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU1 são, atualmente, o principal guia de boas práticas e adequação à agenda ESG. Trata-se de “[...] um apelo global à ação para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e de prosperidade” . Os Objetivos a serem cumpridos – mediante esforço conjunto dos Estados Nações, empresas e sociedade/pessoas - até o ano de 2030 (Agenda 20303) são os seguintes:
Pois bem, é crescente o número de pessoas que, antes de consumirem, pesquisam buscando saber, para além da qualidade do produto ou serviço ofertado, se a empresa tem responsabilidade ambiental e social, bem como se age de forma ética e transparente; ou se é simplemente orientada à obtenção de lucros e enriquecimento dos proprietários e/ou acionistas, de modo a escolher se consumirá ou não o produto ou serviço ofertado.
A disseminação do acesso à internet e às redes sociais têm sido um importante elemento da agenda ESG, tendo em vista que a rapidez do acesso e compartilhamento da informação faz com que más condutas por parte de Estados e empresas sejam amplamente divulgadas e combatidas por meio de protestos, boicotes, cobranças, etc.
Em vista disso, as empresas, em âmbito global, têm se preocupado cada vez mais em se adequarem aos anseios e objetivos da pauta ESG, inserindo-a em suas estratégias e estrutura de negócios, de modo a manter a credibilidade, a boa reputação e a competitividade no mercado e, consequentemente, a saúde financeira e a lucratividade.
No âmbito do capital (setor de investimentos), a adesão de uma empresa à pauta ESG passou a ser considerada como um indicador essencial na análise do potencial de prosperidade, perenidade e segurança de um negócio. O raciocínio é:
[...] as empresas que usam os recursos naturais de forma equilibrada, impedem a corrupção, promovem os direitos humanos na cadeia de valor e produzem valor para todos os stakeholders representam menor ameaça ao investimento, simplesmente porque, na ponta do lápis, ao gerarem menos externalidades negativas, custam menos para a sociedade e o meio ambiente4.
O ESG, portanto, “[...] virou sinônimo de investimento bom, inteligente e responsável”5 - sendo pertinente destacar que uma recente pesquisa realizada pela EY, com cerca de 320 investidores, constatou que 78% deles acreditam que as empresas devem fazer investimentos relacionados ao ESG, e que 99% utilizam informações sobre ESG divulgadas pelas empresas como elemento para a tomada de decisão sobre investir ou não6.
É possível concluir, em vista do exposto até aqui, que as empresas que não se adequarem à agenda ESG terão um grave problema a ser enfrentado, já que poderão perder consumidores e investidores e, por consequência, capital. Ou seja, a saúde financeira e a continuidade dos negócios passaram estar diretamente ligadas à adequação à agenda ESG.
Pois bem, Augusto Cruz pontua que:
Uma empresa que adere às boas práticas em ESG revela que procura minimizar seus impactos no meio ambiente; cuidar melhor das pessoas de seu entorno, respeitando diferenças, promovendo diversidade, igualdade e inclusão e se posicionando sobre questões relevantes para a sociedade; implementar políticas e ações que evidenciem transparência, prestação de contas, equidade e responsabilidade. E, claro, conseguirá atrair e reter talentos e chamará a atenção dos consumidores7.
É importante destacar que a atenção das empresas à agenda ESG não deve ser limitada às atividades próprias e diretamente por elas exercidas. Para ser considerada, de fato, adequada ao ESG, a cadeia produtiva inteira do negócio deve estar de acordo com a agenda. De nada adianta, por exemplo, que uma grande marca de roupas se adeque e cumpra com os objetivos levando em consideração as suas atividades próprias e diretas, se na ponta da cadeia as suas roupas forem produzidas, por exemplo, por empresas que mantém os seus empregados em condições análogas à escravidão e/ou que utilizam mão de obra infantil. Ou seja, as empresas, dentre outras medidas, devem verificar e/ou cobrar que os seus fornecedores e parceiros estejam adequados e/ou se adequem à agenda ESG (é prudente, inclusive, que haja previsão contratual neste sentido).
Diante disso, aqui vão alguns pontos gerais e básicos que devem ser considerados e refletidos pelas empresas no caminho à adequação à agenda ESG:
- Estabelecer definições claras, objetivas e reais sobre os objetivos e metas ESG: as empresas devem estabelecer definições claras e objetivas, adequadamente alinhadas com as atividades exercidas, de modo que os objetivos e metas sejam reais, concretizáveis e mensuráveis. O estabelecimento de objetivos e metas irreais, simplesmente com o objetivo de “agradar” ao mercado (consumidores e investidores, especialmente), podem gerar efeitos negativos, especialmente com relação à reputação da empresa;
- Realizar a avaliação dos riscos envolvidos no negócio: as empresas devem avaliar os riscos e oportunidades relacionadas aos seus negócios com relação aos objetivos ESG. Isso inclui identificar questões como: os impactos (positivos e negativos) das atividades no meio ambiente, na sociedade, no ambiente e condições de trabalho, entre outras possibilidades;
- Comunicação transparente: as empresas devem ser transparentes sobre suas práticas e metas ESG e comunicar regularmente sobre seus progressos e desafios (isso inclui a comunicação de eventuais eventos negativos, acompanhada das medidas adotadas para a solução e a prevenção de novas ocorrências);
- Integração da responsabilidade social em todas as áreas do negócio: a responsabilidade social não deve ser vista apenas como uma área isolada, mas deve ser integrada em todas as áreas do negócio, desde a gestão de risco até a tomada de decisão;
- Sinergia com fornecedores, parceiros e investidores para a promoção e a implementação das práticas ESG: as empresas devem trabalhar em conjunto com fornecedores, parceiros e investidores para a promoção e a implementação das práticas ESG e fazer avançar as questões relacionadas ao desenvolvimento sustentável e responsabilidade social. Isso inclui discutir e implementar metas e objetivos comuns e compartilhar boas práticas.
Em suma, é correto dizer que a adequação das empresas à agenda ESG é urgente e necessária, é o presente e o futuro. Não há mais espaço para a concepção de responsabilidade social de Milton Friedman – no sentido de que a única responsabilidade social da empresa é usar os seus recursos para o desenvolvimento de atividades destinadas a aumentar o lucro.
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1 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU. Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/sdgs. Acesso em: 05 de fev de 2023.
2 Ibidem
3 A Agenda 2030 se constitui num plano de ação com foco nos 5Ps: pessoas, prosperidade, planeta (saudável), paz (instituições eficazes e que oferecem segurança) e parcerias. O plano aponta para 17 ODS com 169 metas para erradicar a pobreza e promover a vida digna para todos, respeitando os limites da Terra. CRUZ, Augusto. Introdução ao ESG: meio ambiente, social e governança corporativa. 1ª ed. - Edição do Kindle. São Paulo: Scortecci, 2022, p. 19.
4 VOLTOLINI, Ricardo. Vamos falar de ESG? Provocações de um pioneiro em sustentabilidade empresarial. Editora Doyen: Belo Horizonte, p. 10/11. E-book.
5 Ibidem, p. 11.
6 ESG direciona decisão de 99% dos investidores no Brasil, diz pesquisa. Disponível em: https://exame.com/bussola/esg-direciona-decisao-de-99-dos-investidores-no-brasil-diz-pesquisa/. Acesso em: 05 de jan de 2023.
7 CRUZ, Augusto. Introdução ao ESG: meio ambiente, social e governança corporativa. 1ª ed. - Edição do Kindle. São Paulo: Scortecci, 2022, p. 11.