O Supremo Tribunal Federal (STF) retomará neste ano o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) 1.625, que tramita na Corte por mais de 25 anos, sobre a validade do Decreto assinado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) que cancelou a adesão do Brasil à Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata da dispensa sem justa causa.
A sinalização do julgamento deu-se por meio do pedido de vistas do Ministro Gilmar Mendes em outubro de 2022, já que, considerando nova regra do regimento interno aprovada pela Corte, há um limite máximo de 90 (noventa) dias para devolução de vistas. Ultrapassado esse período, o processo retorna automaticamente para julgamento.
O tema da Convenção 158 da OIT é de proibição da demissão sem justa causa no Brasil. Contudo, o julgamento que irá ocorrer não trata especificamente da aplicação ou não da Convenção 158 da OIT e seus impactos decorrentes da possibilidade ou não de dispensa sem justa causa.
O tema em discussão na mencionada ADIn é a constitucionalidade do decreto 2.100/96, editado pelo presidente Fernando Henrique, que cancelou a adesão do Brasil à Convenção 158, sem a chancela do Congresso. Em outras palavras, a decisão do STF se limitará apenas a declarar válida ou não a ratificação de Convenção Internacional pelo presidente sem consulta e aprovação pelo Congresso Nacional.
A discussão se debruça no fato de que a Constituição Federal prevê a competência exclusiva do Congresso Nacional para “ … resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional”, entendimento pelo qual considera-se a decisão do presidente inválida, já que foi tomada sem o consentimento do Congresso, podendo, assim, ser reaberta a discussão acerca da adesão do Brasil à Convenção.
A ação pode ser julgada a partir de junho deste ano, mas pode ser paralisada em decorrência de um novo pedido de vista. Caso ocorra, o julgamento será reiniciado e levado a plenário, sendo que os ministros que já votaram não poderão alterar seus votos, graças a uma regra aprovada em junho de 2022.
A expectativa pelo julgamento da ADIn 1.625 é alta devido ao fato de remeter à possibilidade de discutir um assunto subjacente: a possibilidade ou não de dispensa sem justa causa, haja vista que a cláusula 4ª da Convenção prevê que “… não se dará término à relação de trabalho de um trabalhador a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço”.
Mas é preciso ter cuidado para que não haja confusão acerca do sentido da norma prevista na Convenção. Isso porque a regra não estabelece que somente pode ser dispensado o empregado por justa causa, como está sendo tratada a questão pela mídia. O que a norma pretende é que haja fundamentação para que haja a rescisão do contrato de trabalho, o que não é necessariamente a aplicação de justa causa.
É importante notar que na Convenção não há nenhuma vedação à dispensa sem justa causa, sendo proibida a dispensa imotivada, ou seja, sem fundamentação. Ainda, caso houvesse adesão à Convenção 158, o Congresso Nacional poderá e deverá regulamentar, por meio de Lei Complementar, as regras necessárias para implementação da nova norma, motivo pelo qual não haverá uma mudança automática da legislação, sem que haja tempo para adequação pela sociedade.