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Democratização da estrutura sindical

No Brasil, os partidos políticos - pessoas jurídicas de direito privado na forma da lei – gozam de abominável e excepcional privilégio de receberem dinheiro público pelo Fundo de Financiamento Partidário e outro tanto para Financiamento de Campanhas.

5/1/2023

Felicito o novo Ministro do Trabalho, Luiz Marinho, e lhe desejo sucesso pelo retorno ao cargo, no terceiro mandato do presidente Luís Inácio Lula da Silva. Eu o conheci no Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema, creio que em 1980, durante a greve de 41 dias. Sempre me impressionaram a seriedade, o empenho e a preocupação com as questões trabalhistas.

Li a matéria de “O Estado”, edição de 4/1 (pág. B4), cujo título diz: “Marinho promete revisar a reforma e incluir trabalho por aplicativo”. A notícia, de meia página, reproduz em parte o discurso de S. Exa. Estou certo, porém, que focaliza os aspectos principais.

Para S. Exa., o “Imposto Sindical não existirá mais no Brasil”. A ideia “é fortalecer os sindicatos por meio de outros mecanismos”. Em conjunto com o Congresso Nacional, se propõe a “construir uma legislação que modernize o nosso sistema sindical de relações do trabalho e nos aproxime das melhores práticas existentes no mundo nesse campo”. Também promete “fazer uma revisão da reforma trabalhista realizada pelo ex-presidente Michel Temer, para incluir, entre outros pontos, a formalização dos trabalhadores por aplicativo”.

Quanto ao Imposto Sindical, ou Contribuição Sindical, disciplinada pelo Capítulo III do Título V da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), registro que a lei 13.467/17, não a extinguiu. Para extingui-la será necessário aprovação de projeto de lei no Congresso Nacional.

Só há uma forma de financiamento de associações civis, religiosas, partidárias ou sindicais: com o dinheiro e outras contribuições dos associados, recolhidos voluntariamente, na forma dos estatutos. Registre-se que, segundo o disposto pelo Art. 5º, XX, da Constituição, “ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado” Regra idêntica se aplica à associação sindical, conforme prescreve o Art. 8º, V, da Lei Fundamental.

No Brasil, os partidos políticos - pessoas jurídicas de direito privado na forma da lei – gozam de abominável e excepcional privilégio de receberem dinheiro público pelo Fundo de Financiamento Partidário e outro tanto para Financiamento de Campanhas.  Para as entidades sindicais, as duas principais fontes de receita são as mensalidades pagas por associados e a Contribuição Sindical depositada espontaneamente uma vez por ano, por empregados e patrões, associados ou não, às respectivas entidades representativas.

A conversão do que era compulsório em voluntário não extinguiu a Contribuição. Conferiu, porém a trabalhadores e empregadores o direito de natureza constitucional, de pagá-la ou não. Acabar com a Contribuição Sindical não resolve o problema. Afinal, volta a pergunta, que financiará as atividades sindicais, se não o fizerem os trabalhadores e os empresários? Neste aspecto, em que pese o nocivo precedente dos partidos políticos, não creio ser possível financiamento com dinheiro público, recolhido pelo cidadão ao Tesouro Nacional.

S. Exa., o ministro Luiz Marinho, foi além na exposição das deias. Referiu-se à necessidade de “construir uma legislação que modernize o nosso sistema sindical de relações do trabalho e que nos aproxime das melhores práticas existentes no mundo nesse campo”. Ora, a esmagadora maioria dos países membros da Organização Internacional do Trabalho (OIT), fez opção pela Convenção 87, aprovada em Assembleia Geral em 1948, logo após o término da Segunda Guerra Mundial. O objetivo visado pela célebre Convenção era colocar as organizações sindicais, profissionais ou patronais, à salvo do controle governamental.

O Art. 8º da Constituição de 1988 caminhou bastante nesse sentido, ao vedar ao Poder Público “a interferência e a intervenção na organização sindical”. Determinar a forma de arrecadação de recursos, destinados à manutenção, não deixa de ser interferência nos destinos da entidade.

A mensagem do presidente Eurico Gaspar Dutra, enviada em maio de 1949 ao Congresso Nacional, pedindo autorização para ratificar a Convenção nº 87/1948, aguarda decisão do Senado desde 1982, quando recebeu o aval da Câmara dos Deputados.

Se S. Exa., o ministro Luiz Marinho, deseja passar à História como benfeitor do movimento sindical brasileiro, deve pensar nesta alternativa. Afinal, a liberação completa do controle do Ministério do Trabalho exige adesão ao documento fundamental da OIT, ratificado por 158 dos 185 países filiados.

Eu tentei, mas não consegui.

Almir Pazzianotto Pinto
Advogado. Foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho. Autor de A Falsa República e 30 Anos de Crise - 1988 - 2018.

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