Migalhas de Peso

A utilização dos precatórios no setor aeroportuário

É importante que a utilização de precatórios para o pagamento das outorgas seja vista com o devido cuidado e atenção.

28/12/2022

A instabilidade econômica, financeira e política vivenciada pelo país nos últimos anos, somada à pandemia da Covid-19, ocasionou efeitos severos no setor de infraestrutura brasileiro. O setor aeroportuário foi especialmente atingido e, a pequenos passos, tenta se recuperar dos impactos da crise.

Os prejuízos suportados pelo setor são facilmente constatáveis nos recentes pedidos de relicitação apresentados pelas concessionárias dos aeroportos de São Gonçalo do Amarante, Viracopos e Galeão. Eles podem igualmente ser observados na situação vivenciada pelos demais aeroportos brasileiros, a exemplo de Guarulhos, Brasília e Confins, que sofrem com um desequilíbrio econômico-financeiro da concessão.

Ainda que a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) tenha tomado medidas e concedido alguns dos pleitos de reequilíbrio das concessionárias, isso por si só não bastou para soerguer as empresas e ajudá-las a enfrentar a crise, a qual não só desequilibrou as concessões, como também lhes afetou significativamente o caixa.

Essa situação de instabilidade é mais agravada pelo pagamento de outorgas milionárias à União, por força do quanto foi estabelecido nos contratos de concessão. Ocorre que, com caixas deficitários, os pagamentos das outorgas por parte das empresas concessionárias são uma variante extremamente onerosa, que coloca em risco a saúde financeira das empresas e a própria viabilidade das concessões.

Diante desse cenário, é mais do que necessário buscar soluções para tal problemática. É aqui que os precatórios surgem como moeda válida e importante para as concessionárias cumprirem suas obrigações de pagamento junto à União.

Não é de hoje que o uso de precatórios ganha espaço no Brasil. Escritórios, empresas, instituições financeiras, fundos, entre outros, estabeleceram um verdadeiro mercado de compra e venda desses títulos líquidos de dívida. Isso chegou ao setor aeroportuário após a promulgação da Emenda à Constituição 114/21, cujo teor permite a utilização de precatórios para quitação de dívidas com a União.

Foi com essa permissão legal que as concessionárias entenderam ser possível a utilização dos precatórios para pagamento das outorgas. Ao adentrarem nesse mercado, comprando os títulos com deságio e os fornecendo à União com 100% do valor de face, as concessionárias pretendem quitar os valores das outorgas pagando à União menos do que pagariam se a quantia saísse integralmente de seu caixa. Contudo, essa possibilidade – que bem parece uma verdadeira luz ao final do túnel para as concessões aeroportuárias – enfrenta dificuldades práticas, uma vez que, malgrado o permissivo constitucional, a União demonstra ainda certo receio em aceitar os precatórios como moeda para pagamento das outorgas.

A situação, entretanto, está prestes a mudar com a recente edição do decreto 11.249/22. Isso porque a Advocacia Geral da União (AGU) passa a ser o ente responsável pela recepção dos pagamentos feitos com o precatório. Em outras palavras, o decreto permitiu a recepção centralizada dos pagamentos das outorgas e, com isso, as concessionárias aeroportuárias não mais enfrentariam a burocracia de negociar com a ANAC, a qual não vinha aceitando o precatório federal como moeda válida.

A expectativa é de que o decreto permita uma evolução nesse sentido. O precatório é dinheiro e, como tal, constitui-se como moeda de troca válida e como uma alternativa legal a ser adotada pelas concessionárias a fim de possibilitar a manutenção das concessões, o que certamente é querido tanto pela parte privada quanto pelo Poder Concedente, uma vez que prioriza o interesse público em jogo.

Para tanto, o apoio da União e da ANAC são mais do que essenciais para se conceder uma segurança jurídica às concessionárias que optarem pelo pagamento da outorga mediante o uso desse importante (e seguro) título de dívida pública. O arcabouço jurídico está posto, porém é essencial que todos estejam empenhados para que os precatórios constituam uma saída eficaz às instabilidades atuais e futuras vivenciadas pelas concessionárias.

Os precatórios, se bem utilizados, podem ser a saída frente ao desequilíbrio suportado pelas concessões. A possibilidade de quitar as outorgas com esse título pode ser uma ferramenta primordial para a manutenção das concessões e para impedir novos pedidos de relicitação, que, ao final, são prejudiciais tanto ao interesse público correlato à prestação do serviço aeroportuário quanto ao Poder Concedente.

É importante que a utilização de precatórios para o pagamento das outorgas seja vista com o devido cuidado e atenção. Trata-se de uma importante saída para se recuperar os percalços existentes, possibilitar o desenvolvimento do setor aeroportuário e alçar novos voos em direção ao futuro.

Luísa D’Avola
Sócia fundadora da PGD Sociedade de Advogadas na área de Direito Tributário.

Thaina de Paula Carvalho
Advogada na PGD Sociedade de Advogadas na área de Direito Público.

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