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Da legitimidade da apólice de seguro garantia com prazo de validade para garantia de execução

A justificativa para tanto é de que, se há prazo de validade e não há como se prevê até quando o processo perdurará, tal modalidade de garantia não teria eficácia para assegurar o cumprimento da obrigação a que se encontra vinculada.

13/12/2022

Em decisões prolatadas nos últimos anos o STJ se posicionou pela inidoneidade, para fins de garantia do juízo, da apólice de seguro garantia com prazo de validade.

Dentre estas decisões, destacamos as seguintes: STJ - AgInt no REsp: 1920707 PR 2020/0260197-6, Relator: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Julgamento: 28/06/2021, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 30/06/2021; STJ - AgInt no AREsp 1.924.792/GO, Relatora: Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 13/12/2021, DJe de 15/12/2021; AgInt no AREsp 1.832.692/SP, Relator: Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 27/9/2021, DJe de 30/9/2021; STJ - AgInt no REsp: 1874712 MG 2020/0114714-4, Relatora: Ministra REGINA HELENA COSTA, Data de Julgamento: 07/12/2020, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/12/2020.

A justificativa para tanto é de que, se há prazo de validade e não há como se prevê até quando o processo perdurará, tal modalidade de garantia não teria eficácia para assegurar o cumprimento da obrigação a que se encontra vinculada.

Ocorre que em razão do que dispõe o art. 760 do Código Civil1 a indicação de termo inicial e final da apólice de seguro é requisito indispensável à sua validade.

Para solucionar este impasse as seguradoras encontraram a seguinte solução: Inclusão na apólice de seguro garantia de cláusula de renovação compulsória automática de sua validade, com redação que assegura a eficácia desta enquanto o risco coberto existir, inclusive, com disposição no sentido de que a ausência de pagamento pelo segurado do prêmio correspondente à renovação da apólice configura sinistro, gerando para a seguradora a obrigação de realizar o depósito do valor acobertado em juízo.

Com esta medida, ao tempo em que se atende ao disposto no art. 760 do Código Civil, assegura-se, de maneira axiomática, o cumprimento da obrigação acobertada pela apólice.

Registre-se que objetivando trazer segurança jurídica para este procedimento, a Susep editou a Circular. 622/22 – que por sua vez endossa o que já constava na Circular Susep 477/13 - a qual define e disciplina o funcionamento do seguro garantia, não deixando dúvidas quanto à compulsoriedade e à automaticidade da renovação das apólices de seguro garantia judicial.

A este respeito, destaca-se o art. 8º2 da sobredita Circular, que impõe às seguradoras o dever de garantir a manutenação da cobertura enquanto o risco coberto existir mediante adoção de procedimentos regulados pelo art. 9º3 do mesmo instrumento normativo.

O art. 104 da aludida Circular prevê, ainda, que a apólice somente poderá ser alterada mediante pedido do segurado  - no caso, o exequente - ou com sua expressa concordância.

Sobre tal assunto, oportuno destacar, também, o Ofício 23/19/SUSEP/DICON/CGCOM/COSET expedido pela SUSEP5, que afastou qualquer dúvida acerca da confiabilidade da apólice de seguro garantia para assegurar o cumprimento de obrigação de pagar, deixando claro que não havendo renovação desta enquanto o risco coberto existe, o sinistro estará caracterizado.

Logo, resta patente que a simples indicação de prazo de validade na apólice de seguro garantia não afasta a sua eficácia para garantia do juízo, sendo indispensável que se verifique a sua idoneidade à luz de uma interpretação sistemática das cláusulas que a compõem e da legislação aplicável, notadamente daquelas que porventura assegurem o cumprimento da obrigação caso a apólice não seja renovada, a exemplo de eventual cláusula de renovação compulsória automática e da Circular Susep 622/22.

Neste sentido decidiu a Terceira Turma do STJ em recente decisão6, em cuja fundamentação assim se discorreu:

(...) No entanto, a simples fixação de prazo de validade determinado na apólice, conforme entendimento do órgão julgador, não implica inidoneidade da garantia oferecida, tendo em vista que a sua renovação, a princípio automática, somente não ocorrerá se não houver mais risco a ser coberto ou se apresentada nova garantia. Ademais, se não renovada a cobertura ou se o for extemporaneamente, caraterizado estará o sinistro, de acordo com a regulamentação da Superintendência de Seguros Privados - SUSEP (Ofício 23/19/SUSEP/DICON/CGCOM/COSET), abrindo-se para o segurado a possibilidade de execução da apólice em face da seguradora. Cumpre também pontuar que "o seguro continuará em vigor mesmo quando o tomador não houver pagado o prêmio nas datas convencionadas" (art. 11, § 1º, da Circular SUSEP 477/13, vigente à época da emissão da apólice), além de ser " vedado o estabelecimento de franquias, participações obrigatórias do segurado e/ou prazo de carência nos planos de Seguro Garantia" (art. 10 da Circular SUSEP 477/13). 

Evidente, pois, a necessidade de maior imersão no assunto em debate para que, após adequada análise do assunto, não se replique, como se tem visto em algumas decisões tribunais afora, o entendimento segundo o qual a simples indicação de prazo de validade na apólice de seguro garantia retira a sua idoneidade para garantia do juízo, gerando insegurança jurídica e prejudicando a utilização deste instrumento de essencial importância para o contingenciamento financeiro de diversas empresas.

________________

1 Art. 760. A apólice ou o bilhete de seguro serão nominativos, à ordem ou ao portador, e mencionarão os riscos assumidos, o início e o fim de sua validade, o limite da garantia e o prêmio devido, e, quando for o caso, o nome do segurado e o do beneficiário.

2 Art. 8º Caso a vigência da apólice seja inferior à vigência da obrigação garantida, nos termos do art. 7°, a seguradora deve assegurar a manutenção da cobertura enquanto houver risco a ser coberto, de acordo com o art. 9°.

§ 1º O segurado poderá, a qualquer tempo, se opor à manutenção da cobertura, mediante expressa manifestação.

§ 2º O tomador não poderá se opor à manutenção da cobertura, exceto se ocorrer a substituição da apólice por outra garantia aceita pelo segurado.

3 Art. 9º Para fins do art. 8°, a seguradora deverá:

I - especificar, nas condições contratuais do seguro, os critérios para manutenção da cobertura durante todo o período de risco e o procedimento para renovação da apólice, quando for o caso, os quais não poderão gerar qualquer prejuízo à manutenção da cobertura e aos direitos do segurado;

II - assegurar que os procedimentos e a efetivação da manutenção da cobertura e/ou da renovação da apólice ocorram antes do término de vigência da apólice; e

III - comunicar ao segurado e ao tomador a proximidade do término de vigência da apólice, com antecedência mínima de 90 (noventa) dias antes desta data. Alteração e atualização

Art. 10. A apólice somente poderá ser alterada mediante pedido do segurado ou com sua expressa concordância.

5 https://www.editoraroncarati.com.br/v2/phocadownload/oficio_susep_23_2019.pdf

6  REsp n. 2.025.363/GO, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 4/10/2022, DJe de 10/10/2022

Carlos Andrade
Especialista em Direito do Consumidor e sócio de Urbano Vitalino Advogados.

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