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A suspensão de exigibilidade do crédito não tributário mediante oferta de seguro-garantia judicial

A oferta de seguro-garantia judicial não suspende a exigibilidade de crédito de natureza tributária, mas suspende a exigibilidade de crédito não tributário, como é o caso da multa administrativa.

7/12/2022

O STJ fixou o entendimento de que é cabível a suspensão da exigibilidade de crédito não tributário quando for oferecido seguro-garantia judicial. O seguro deve ser ofertado em valor equivalente ao débito, acrescido de 30%, sobre o valor atualizado da dívida, conforme determina o Código de Processo Civil1-2.

Nesse sentido, foi pacificada a controvérsia quanto ao direito à suspensão da exigibilidade de crédito oriundo de multa administrativa imposta sob o poder de polícia, sempre que os interessados apresentarem o seguro-garantia judicial, nessas condições.

O Enunciado da Súmula 112 do STJ, segundo o qual apenas a realização de depósito integral e em dinheiro seria capaz de suspender a exigibilidade de crédito tributário, não é aplicável, portanto, aos créditos não tributários.

Essa distinção é relevante, porquanto a suspensão da exigibilidade de multa administrativa repercute positivamente sobre os negócios e as relações de agentes econômicos, em especial aqueles que possuem contratos de longo prazo com a Administração Pública e que estão sujeitos à aplicação de multas administrativas.  

Como já destacou a Primeira Turma, o seguro-garantia é um instrumento que assegura a manutenção da atividade de empresas ao proporcionar o equilíbrio entre a máxima eficácia da execução e a menor onerosidade para o executado3. E, na esfera das sanções administrativas tal entendimento dos Tribunais tem seguido o mesmo racional.

Precedentes da Corte da Cidadania4 e do Tribunal Regional Federal da 1ª Região5 são unânimes em admitir a suspensão da exigibilidade de multa administrativa (crédito não tributário) mediante a oferta de seguro-garantia judicial.

No âmbito do TRF-1, há inclusive decisões monocráticas6 que ratificam a antecipação de tutela para a suspensão da exigibilidade de crédito oriundo de multa administrativa ante a apresentação de apólice ou endosso de seguro-garantia judicial, desde que correspondente ao valor atualizado do débito, acrescido de 30%.

Como visto, o mesmo não ocorre com os créditos de natureza tributária.

O STJ já julgou ser vedada a equiparação de seguro-garantia ou de fiança bancária ao depósito judicial integral de valor para a suspensão da exigibilidade de crédito tributário7. Entendimento contrário violaria a taxatividade da regra do Código Tributário Nacional (art. 151 do CTN) que dispõe sobre a suspensão da exigibilidade do crédito pelo “depósito do seu montante integral”, além do Enunciado da súmula 112, conforme apontou a Segunda Turma.8

No precedente em comento, o STJ reformou o entendimento consignado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, o qual havia autorizado a substituição do saldo remanescente de depósito voluntário por apólice de seguro-garantia em processo cuja pretensão envolvia a suspensão de crédito tributário.

Foi inclusive feito o distinguishing entre o depósito-garantia e o depósito-pagamento. Afirmou-se que o depósito-garantia possui natureza processual e visa a garantir, em processo de execução fiscal, que o executado tenha acesso ao direito de defesa, por meio de embargos à execução fiscal (art. 16, I, da lei 6.830/80)9. Já o depósito-pagamento possui natureza material e visa a suspender a exigibilidade de crédito tributário até o julgamento final do processo de conhecimento (art. 151, II, do CTN)10.

Em suma, a análise da jurisprudência do STJ demonstra que a suspensão da exigibilidade de um crédito é cabível a depender da natureza deste.

__________

1 STJ, EREsp: 1.381.254/PR, 1ª T., Rel. Min: NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe 28.06.2019.

2 “[A] penhora pode ser substituída por fiança bancária ou por seguro garantia judicial, em valor não inferior ao do débito constante da inicial, acrescido de trinta por cento” (Art. 848, parágrafo único, do CPC).

3 AgInt no REsp 1915046/RJ, Rel. Min. GURGEL DE FARIA, 1ª T., DJe 01.07.2021.

4 STJ, EREsp 1.381.254/PR, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Primeira Turma, DJe 28/6/2019; e STJ – AgInt no REsp: 1612784/RS, Primeira Turma, Rel. Min: SÉRGIO KUKINA, DJe 18/02/2020.

5 TRF-1, AC nº 0076122-35.2013.4.01.0000, Rel. Des. SOUZA PRUDENTE, Quinta Turma, DJe 07/05/2021.

6 TRF-1, AI nº 1037407-57.2020.4.01.0000, dec. mon. Des. CARLOS AUGUSTO PIRES BRANDÃO, DJe 02.08.2021; e AI nº 1024253-35.2021.4.01.0000, dec. mon. Des. DANIELE MARANHÃO, DJe 07.07.2021.

7 STJ, REsp nº 1737209/RO, Segunda Turma, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 01.07.2021; AgInt no REsp nº 1854357/DF, Primeira Turma, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJE 11.12.2020.

8 STJ, REsp nº 1737209/RO, Segunda Turma, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 01.07.2021.

9 In verbis: “Art. 16 - O executado oferecerá embargos, no prazo de 30 (trinta) dias, contados: I - do depósito”.

10 “Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário: [...] II - o depósito do seu montante integral”.

Maria Augusta Rost
Mestre em Direito pela Universidade de Brasília (UnB) e Sócia da Barretto & Rost Advogados.

Mariana Ozaki Marra da Costa
Advogada do Barretto e Rost Advogados, Aluna especial do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade de Brasília (UnB). Bacharela em Direito pela UnB.

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