O Conselho Federal da OAB editou 03 (três) súmulas no ano de 2019 sobre idoneidade moral. São as súmulas 09, 10 e 11.
Essas súmulas são os martírios dos bacharéis que se formaram, passaram no exame de ordem, fazem o pedido de inscrição na OAB, e tem o pedido indeferido por responderem a processo criminal sobre violência contra mulher, crianças, adolescentes, idosos, pessoas com deficiência física ou mental e pessoa LGBTI+, independente da instância criminal.
Sempre recebemos contato de bacharel em direito para defesa em processo de suscitação de inidoneidade moral na OAB, ouvimos o desespero de quem estudou 5 (cinco) anos e agora não poderá exercer sua profissão.
O Ministério Público Federal ingressou com Ação Civil Pública, objetivando a revogação dos efeitos destas súmulas. Em suas razões afirmou que pela interpretação literal das súmulas, a OAB não pode obstar o ingresso “daqueles que são meramente acusados de praticar atos de violência contra determinados grupos de pessoas”.
Para o MPF como as súmulas sobre idoneidade estão redigidas, trazem “grave risco ao futuro profissional de mais de 879 mil estudantes de direito, podendo impedir o início de uma vida profissional sem que o acusador tenha o dever de provar o alegado em juízo”.
Não é possível aplicar penalidade, seja ela civil, administrativa ou penal, sem que antes se abra a oportunidade para o acusado se defender, tendo por referência as provas contra ele coligidas, as quais devem ser submetidas a um juízo imparcial.
Desde março de 2022 está suspensa a aplicação dessas súmulas por decisão judicial no processo 1002061-94.2020.4.01.3702. Em sentença o juiz da 17ª Vara Federal – SJDF declarou a ilegalidade das súmulas, e determinou a revogação dos seus efeitos.
A decisão entendeu que a OAB não pode restringir a inscrição independente da instância criminal ou pronunciamento pelo Poder Judiciário.
Nós concordamos com a decisão.
A Constituição Federal, no seu art. 5.º, inciso XIII, dispõe ser “livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.
O art. 22, inciso XVI, “competir privativamente à União legislar sobre a organização nacional do emprego e condições para o exercício das profissões”, assim como, no art. 21, inciso XXIV, competir a União “organizar, manter e executar a inspeção do trabalho”.
A OAB em quanto conselho de classe, de forma geral, cabe a fiscalização e o acompanhamento das atividades inerentes ao exercício da profissão, com atribuição para regulamentar o exercício de tais atividades, observados os parâmetros legais previamente determinados, estabelecendo a lei normas gerais para a disciplina da profissão.
A decisão entendeu que a OAB buscou estabelecer os requisitos para a inscrição nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, com base em condutas que, em hipótese, demonstrariam ausência de idoneidade moral do bacharel.
Assim como a decisão judicial, nós entendemos que embora o Conselho Federal da OAB seja responsável por regulamentar o Exame da Ordem, não há como ampliar o conceito de inidoneidade moral, de forma subjetiva, para abarcar pessoas acusadas de violência doméstica contra mulheres, crianças e idosos, e homofobia, independentemente de instância criminal, ou certificação judicial ou oficial.
Para o MPF e a Justiça as súmulas do Conselho Federal da OAB excedem o poder regulamentador conferido ao órgão de fiscalização profissional.
Em que pese as condutas sejam absolutamente reprováveis, não há como caracterizar a ausência de idoneidade moral apenas a partir de elementos subjetivos, sem que haja decisão prévia do Poder Judiciário, sob pena de se violar frontalmente o princípio da isonomia e da impessoalidade, dado o elevado grau de subjetividade que do julgamento do conselho seccional pode resultar.
Para o magistrado as restrições impostas pela OAB ao bacharel devem ser realizadas somente após decisão judicial, com fulcro no princípio da presunção de inocência.
A OAB recorreu da decisão. Esperamos que o Poder Judiciário mantenha a sentença.
O afastamento da necessidade de condenação pelo Poder Judiciário, além de usurpar a competência do Congresso Nacional para edição de legislação sobre o tema, fere o princípio da presunção da inocência insculpido na Constituição Federal.
Os bacharéis não podem ser declarados inidôneos sem decisão judicial.