Existem diversos pontos na legislação brasileira que se atentam às responsabilidades dos planos de saúde, isto é, as obrigações legais que as operadoras têm com os seus associados. No entanto, não são poucos os casos em que os direitos do paciente, e também consumidor do serviço, são violados, abrindo margem para uma incidência de casos de judicialização.
Neste conteúdo, você entenderá o que são e como funcionam os planos de saúde, quais são suas coberturas e como funciona a cobrança e reajuste. Em seguida, mostraremos o que é a judicialização da saúde, quais as principais causas, entre muitas outras informações cruciais sobre o assunto. Confira agora!
O que são e como funcionam os planos de saúde?
Planos de saúde são serviços oferecidas pela rede médica particular, por meio de seguradoras especializadas. Para comercializar estes serviços, as prestadoras devem disponibilizar uma gama de procedimentos determinados pela Agência Nacional de Saúde (ANS) como variados tipos de exames, internações e até as mais complexas cirurgias.
Os planos de saúde funcionam como um serviço de assinatura, no qual o contratante passa a ter direito aos procedimentos oferecidos mediante ao pagamento das mensalidades, conforme o período de carência de cada plano.
Quais os tipos de planos de saúde?
Agora que você já tem conhecimentos básicos sobre o que são e como funcionam os planos de saúde, é muito importante compreender que existem diferentes modalidades de contratações que impactam nas regras, custos e responsabilidades. Veja a seguir!
Individual
A maioria das operadoras não têm muito interesse em oferecer planos de saúde individuais por questões relacionadas ao custeio dos procedimentos, já que as modalidades coletivas "diluem" os custos operacionais. Contudo, é possível encontrar planos individuais de operadoras de credibilidade no mercado.
Em muitos casos, recomenda-se que o indivíduo tenha vínculo com algum sindicato, para que possa acessar planos de saúde coletivos. Assim, ele terá custos menores e acesso às operadoras mais conhecidas.
Familiar
Um plano de saúde familiar exige a contratação de uma modalidade distinta, chamada Pequena e Média Empresa (PME), o que causa estranhamento para muitas pessoas. É preciso ter um CNPJ e, ao menos, de duas a três pessoas para ingressarem no plano, sendo uma delas a portadora do CNPJ.
O grande benefício desta categoria está no acesso a valores que chegam a ser 30% mais baratos, em comparação com os planos individuais e às melhores operadoras. Caso o contratante não possua um CNPJ, pode contratar por meio de adesão (se tiver vínculo com algum sindicato), ou pela modalidade individual.
Empresarial
Enquanto o PME atende pequenas empresas ou famílias (em casos específicos), permitindo que até 29 pessoas sejam beneficiadas pelo serviço, o plano de saúde empresarial atende acima de 30 vidas. Os valores variam com base em uma análise de perfil dos colaboradores, como gênero, idade, estilo de vida etc.
Quais as coberturas?
Ao contratar um plano de saúde ambulatorial, no caso de um plano hospitalar, o contratante terá acesso à adição de uma série de procedimentos ambulatoriais, como consultas e internações. Se o plano cobre obstetrícia, por exemplo, a paciente estará assegurada para usufruir de procedimentos neonatais e de parto.
Outra questão em torno das coberturas dos planos de saúde é em relação às acomodações, que podem ser individuais ou compartilhadas. Além disso, é importante falar sobre a abrangência do plano, que pode ser regional, cobrindo somente um determinado grupo de municípios, ou nacional, garantindo auxílio em todo o país. Há também coberturas adicionais que se estendem a territórios internacionais.
Como funciona a precificação dos planos de saúde?
Muitas pessoas tomam a decisão de contratar um plano de saúde para que possam garantir sua segurança e terem mais qualidade de vida, ao saberem que podem contar com serviços essenciais prestados por profissionais especializados.
Contudo, é importante saber que esse tipo de serviço pode ter preços elevados, já que devem custear procedimentos médico-hospitalares complexos e que dependem não apenas de equipamentos específicos, como também determinadas especializações médicas, como o caso de uma cirurgia no joelho o um parto na rede particular, que ficam em torno de R$ 15 a R$ 20 mil reais.
Embora não seja um serviço barato, ainda sim o plano de saúde é uma alternativa econômica para evitar maiores problemas diante de necessidades ou situações emergenciais, pois o valor é pago de modo fracionado, isto é, em mensalidades estabelecidas por contrato. Além disto, a grande variedade de operadoras permite que o consumidor tenha acesso aos mais diversos preços, o que torna o serviço acessível para qualquer estilo de vida.
Como funcionam os reajustes dos planos de saúde?
Existem duas modalidades pelas quais as prestadoras reajustam o valor de seus planos de saúde. A primeira, é a análise de faixa etária do contratante, sendo que existem dez faixas diferentes, sendo a primeira de 0 a 8 anos e, a última, acima de 59 anos. Sempre que o cliente migra para a próxima faixa, o valor do convênio aumenta. A partir dos 59 anos o reajuste para de ser aplicado (lembre-se desta informação, pois ela implica uma das principais causas da judicialização da saúde, que abordaremos mais adiante neste conteúdo).
Na segunda modalidade, o reajuste é feito conforme a taxa básica de juros Selic e a variação dos custos médicos e hospitalares. No caso dos planos de saúde empresariais, isto é, que foram contratados por meio de um CNPJ, o preço do plano de saúde é reajustado a cada aniversário do contrato. No caso dos planos por adesão, o preço é reajustado logo após a divulgação do reajuste anual, que ocorre, na maioria dos casos, em maio de cada ano.
O que abre margem para uma enorme incidência de casos de judicialização da ação da saúde é o fato de, apesar da Agência Nacional de Saúde determinar uma alíquota máxima para base de cálculo, as operadoras calculam o novo valor tendo como parâmetro a sua carteira de clientes.
Como se dá o direito à saúde como direito fundamental?
O acesso à saúde é um direito fundamental do cidadão, expresso como um direito social no art. 6, da Constituição Federal Brasileira. Já, no art. 23 da CF, acrescentam-se a assistência pública e os cuidados com a saúde, da proteção e garantia dos indivíduos portadores de necessidades especiais, como uma competência comum da União, dos Municípios, dos Estados e do Distrito Federal.
No trecho que se refere à ordem social, em específico no que se diz respeito à seguridade social — entre os arts. 196 e 200 —, encontra-se a seção que aborda a saúde, mencionando a base legal para o Sistema Único de Saúde (SUS), que afirma que a saúde é um direito de todos os cidadãos, sendo um dever do Estado dispô-la às pessoas.
O Estado tem o dever de garantir, mediante políticas econômicas e sociais que tenham a finalidade de reduzir o risco de doenças e de outros agravos, ao acesso universal e igualitário aos serviços e atividades para a sua proteção, recuperação e promoção.
A saúde é um direito fundamental do ser humano, de acordo com a lei 8.080, de 1990, na qual são reguladas todos os serviços e ações de saúde realizadas em território nacional, reforçando o papel e o dever do Estado diante desta questão. Já, na lei 8.142, de 1990, na qual são dispostos os termos relativos à participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde e em relação às transferências de recursos financeiros, são estabelecidas duas instâncias de participação social: os Conselhos de Saúde e as Conferências de Saúde.
Quais as principais responsabilidades dos planos de saúde?
Na relação de consumo que emerge da prestação de serviços privados de saúde aos pacientes — que é contratual — há uma cláusula de incolumidade. Em outras palavras, o consumidor de um plano de saúde está isento de ser prejudicado em seu atendimento médico-hospitalar.
Isso significa que o plano de saúde tem responsabilidade não apenas pelos danos provenientes de suas próprias condutas e atividades — devido às questões de solidariedade e ética da profissão —, mas também conforme as teorias de responsabilidade civil conhecidas como "in vigilando" e "in eligendo", pelos prejuízos que os profissionais causaram, independentemente de serem referenciados, credenciados ou próprios, que prestam atendimentos aos contratantes do plano, isto é:
- Usuários;
- Beneficiários;
- e Segurados.
In eligendo
Nesta responsabilidade civil, é a empresa do plano de saúde que deve se responsabilizar pelos danos causados pelos atos dos profissionais que foram considerados aptos à prestação de serviço pelo qual houve comprometimento com o paciente.
In vigilando
Nesta responsabilidade civil, a responsabilidade da empresa do plano de saúde é gerenciar e fiscalizar a atuação do profissional que presta os serviços pelos quais se comprometeu em contrato. Isto, sempre, tanto no plano moral como técnico.
Em suma, as responsabilidades do plano de saúde são:
- Zelar, constantemente, pela qualificação e aprimoramento dos serviços prestados;
- Dispor de pessoal capacitado às atividades propostas;
- Dever de vigilância dos profissionais que se comprometem a prestar os serviços contratados pelos pacientes;
- Implementação de mecanismos de controle de qualidade da prestação do serviço de saúde;
E tudo mais que abranja a obrigação da empresa que comercializa o plano de saúde, de prestar atendimento pessoalmente ou por meio de terceiros, no local, e qualidade prévia do que foi contratualmente combinado.
Isso porque ainda que não colida de forma direta com alguma determinação jurídica, os atos praticados como abuso de direitos ou atitudes que firam o fim social a que o paciente almeja, devem ser reprimidos e, caso o comportamento abusivo do agente cause prejuízo a outrem, enquadra-se a obrigação de reparação, de acordo com o Contrato de Assistência Médica e a Responsabilidade Civil, de Marilise Kostelnaki Baú, (op. cit.,p.32).
O que é a judicialização da saúde?
Em termos simplificados, todos os procedimentos — de via judicial — pelos quais se dão a busca pela concretização de direitos à saúde integram o conceito de judicialização da saúde. No âmbito dos planos de saúde, a judicialização decorre, entre outros motivos, do descumprimento das empresas que comercializam esse tipo de serviço, em relação aos direitos assegurados aos usuários, assim como de dúvidas provenientes de cláusulas contratuais de difícil compreensão ou controvérsias.
Esses fatores tornam-se ainda mais drásticos devido ao fato de o consumidor ter consciência de que o Poder Público assegura suas garantias e direitos individuais constitucionais. Não é por coincidência que o número de processos instaurados tem correlação com a quantidade de habitantes e extensão das coberturas oferecidas, abrangendo tanto os serviços privados dos planos de saúde quanto as ações em face do SUS, garantidas pelo Poder Público.
Sendo assim, a pessoa jurídica de direito privado ou pessoa física que se dispõe a participar do sistema de saúde, por consequência, se submete às políticas econômicas e sociais previstas na Constituição Federal. No entanto, é configurada uma relação de direito privado de consumo entre a pessoa jurídica de direito privado ou pessoa física e seus associados, sendo pacífico o entendimento da jurisprudência dominante — para sanar os conflitos existentes neste caso — nos tribunais que se aplica o Código de Defesa do Consumidor.
A solução dos conflitos é baseada nos princípios da eticidade e boa-fé objetiva, aos quais são aplicáveis os consagrados e contratos pelo Código Civil. Isso significa que os contratos devem ser regidos de maneira clara e compreensível para leigos sem a presença de cláusulas contraditórias, da mesma forma sem estipulação de obrigações prejudiciais (iníquas) para uma das partes. Já em termos de eticidade o princípio garante que, uma vez estipulado as obrigações e direitos, os contratantes devem cumpri-los de maneira mutuamente respeitosa.
Quais as principais causas da judicialização?
O contrato estabelecido entre o consumidor e a operadora que oferece o plano de saúde é o que conhecemos como "contrato de adesão". Neste contrato, o consumidor deve aderir apenas ao que lhe é imposto, anuindo quaisquer cláusulas propostas pela outra parte, de acordo com o que preveem as regras do CDC e a lei 9.656/98, Lei dos Planos de Saúde.
Contudo, há uma significativa relativização do princípio do pacta sunt servanda e do Princípio da Autonomia da Vontade, por parte de muitas prestadoras de planos de saúde, em virtude da falta de conhecimento de muitos consumidores em relação aos seus próprios direitos, o que abre margem para uma série de causas da judicialização da saúde, dando lugar ao Poder Judiciário.
Contrato de adesão
Assim como as demais espécies contratuais previstas no Código Civil Brasileiro, o contrato de adesão tem o objetivo de garantir que se obedeçam aos princípios da boa-fé, função social e probidade, protegendo o aderente, conforme dispõem os arts. 423 e 424. Ou seja, as responsabilidades dos planos de saúde devem ser cumpridas para que o consumidor não seja prejudicado.
Dito isso, o descumprimento de normas contratuais e a incisão de cláusulas contraditórias, por exemplo, está entre os principais motivos pelos quais ocorre a judicialização da saúde. Ainda que a operadora não tenha responsabilidade direta pela prestação de serviços, ela deve manter relação com clínicas, laboratórios, unidades e profissionais de saúde com a finalidade de disponibilizar as atividades destes agentes aos seus beneficiários e respectivos dependentes.
Reajustes anuais ostensivos
É comum que ocorram reajustes de valores anualmente na prestação de serviços não apenas de saúde, mas de muitas outras áreas, como no caso do aluguel de imóveis. Contudo, os aumentos ostensivos, isto é, aqueles que superam a variação de custos médico-hospitalares, levam muitos consumidores a buscarem seus direitos, obtendo auxílio no Poder Jurídico.
Planos coletivos como contratos empresariais
Infelizmente, não são poucas as operadoras de saúde que, para se eximirem da fiscalização regular da Agência Nacional de Saúde (ANS), buscam subterfúgio em medidas como a constituição de planos coletivos em contratos empresariais para pequenos grupos.
Reajustes por sinistralidade
Em poucas palavras, essa prática consiste na correlação da soma dos valores gastos com coberturas e dos prêmios pagos pelos beneficiários. Geralmente, a prestadora de serviços alega que essa proporção deve ter uma relação de 70% a 75% dos valores dos prêmios somados. Quando há diminuição da sinistralidade, o valor do prêmio nunca é atribuído em favor do segurado, ainda que ocorra o equilíbrio contratual alegado para aumentá-lo.
Reajustes por faixa etária ilegais
Com a súmula 91 TJSP e o advento da lei 10.741, muitas operadoras antecipam os reajustes que só seriam aplicados aos consumidores após os 60 anos de idade para os 56 ou 59 anos, com base em uma brecha expurgando da carteira os associados que não são considerados mais rentáveis para as empresas de plano de saúde. Justamente no momento em que mais precisam dos serviços de assistência de saúde, os beneficiários que chegam na velhice mais vulneráveis, em muitos casos, sequer conseguem realizar os pagamentos.
Omissão de mudanças contratuais
Além destes casos, a judicialização da saúde ocorre em muitos casos de seguradoras que não informam os consumidores sobre a exclusão de hospitais e de médicos, tampouco os substituem à altura. Sem mencionar a estratégia publicitária enganosa de usar nomes de grandes hospitais para atrair clientes, porém, na prática, há uma enorme variedade de restrições de atendimento a determinados procedimentos programados.
Quais coberturas os planos de saúde têm a obrigação de oferecer?
Embora esteja entre as responsabilidades dos planos de saúde e muitas prestadoras os neguem aos consumidores, as empresas têm a obrigação legal de oferecer as seguintes coberturas:
- Tratamentos quimioterápicos;
- Radioterapia IMRT;
- Cirurgia bariátrica;
- Home care;
- Retirada de excesso de pele - tratamento de obesidade;
- Exclusão de próteses e órteses;
- PET Scan.
O que acontece se as responsabilidades não forem cumpridas?
A judicialização da saúde não tem a finalidade de representar ameaça às prestadoras de planos e seguros de saúde, mas sim de servir como recurso para estimular que elas cumpram com as próprias práticas propostas aos consumidores, evitando abusos e danos.
Além disso, essas empresas têm o hábito ostensivo de utilizar estratégias, muitas vezes, protelatórias, isto é, medidas para "ganhar tempo" e não prestar os atendimentos pelos quais se prontificou a garantir ao paciente.
Uma das formas de enfrentar essa questão problemática é o aumento da eficiência da regulamentação, de forma que os órgãos regulamentadores atuem na linha de frente na implementação de políticas de saúde mais rigorosas. As decisões judiciais não discutem a higidez econômica das operadoras, mas são sensíveis às demandas de modo que se priorize o apaziguamento de conflitos e minimização de ações inócuas.
Por fim, o judiciário deve equalizar a celebração do contrato de maneira que as cláusulas contundentes sejam sempre interpretadas em benefício do consumidor.