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O embate entre a abstrativização do controle difuso e a transcendência dos motivos determinantes

Muitas teorias são descritas para tentar dirimir conflitos sobre o controle difuso no Brasil, resta saber qual seria a mais benéfica no tocante à tão sonhada segurança jurídica.

14/11/2022

Inicialmente, faz-se necessário descrever sobre o sistema anglo-saxão, denominado na doutrina de common law, que abrange a tradição e os costumes como uma fonte primária de direitos. Nessa linha, uma questão decidida neste judiciário torna-se um precedente vinculante de decisões futuras. Todavia, especificamente no Brasil, o sistema jurídico atual compactua com o civil law, cuja intenção imediata é privilegiar a lei como fonte imediata sem efeito vinculante, em regra. Por conseguinte, tais diferenças supracitadas concorrem para discussões sobre a atuação dos três poderes no controle de constitucionalidade, no tocante à vinculação erga omnes ( para todos) e aos efeitos ex-nunc (proativos) das normativas. Desse modo, surgem, no cenário atual, as teorias da abstrativização do controle difuso e da transcendência dos motivos determinantes, com o intuito de arrefecer a insegurança jurídica causada por divergências constitucionais jurisprudências.

Segundo o juiz federal Márcio André Lopes, “Se o Plenário do STF decidir a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo, ainda que em controle difuso, essa decisão terá os mesmos efeitos do controle concentrado, que vincula com efeitos erga omnes e ex nunc”. Ou seja, o magistrado estaria descrevendo a teoria da abstrativização do controle difuso que tenta equiparar juridicamente os efeitos das decisões no que tange ao plano objetivo da constitucionalidade. Nessa toada, é cediço que o Senado Federal tem a competência privativa para suspender a execução, no todo ou em parte, da lei declarada inconstitucional incontrolável difuso, por decisão definitiva do STF, de acordo com o Artigo 52 da Carta Magna. Destarte, para muitos doutrinadores, quando há a tentativa de estender os efeitos do controle difuso de constitucionalidade para os abstrato, estaria ocorrendo uma releitura normativa, uma vez que o Senado Federal seria apenas comunicado da decisão para a publicação. Nessa toada, o Ministro do STF Gilmar Mendes argumentou sobre a possibilidade de uma mutação constitucional de modo que o poder legislativo teria o condão de dar eficácia ao publicar e não ao suspender uma norma julgada inconstitucional.

Entretanto, há uma linha tênue na interpretação teleológica dos institutos, pois há a transcendência dos motivos determinantes para complementar ou contrarrazoar a abstrativização do controle difuso descrito anteriormente. De acordo com o Novo Código de Processo Civil de 2015 (NCPC) no Artigo 927, “Os fundamentos determinantes dos julgamentos da Ação de Controle Concentrado julgados no STF caracterizam a ratio decidendi dos precedentes e possuem efeitos vinculantes para todos os órgãos jurisdicionais”. Para exemplificar, se o Estado do Rio de Janeiro julgar uma determinada lei inconstitucional em controle concentrado e o Estado de Goiás julgar, pelos mesmos motivos, em controle difuso, deverá ser observado o precedente prévio pelo juiz goiano. Portanto, estaria se transcendendo o motivo pelo qual uma norma foi considerada constitucional ou inconstitucional, ampliando o objeto das ações de controle difuso.

Diante do exposto, os institutos da abstrativização do controle difuso e da transcendência dos motivos determinantes demonstram que o controle constitucional misto no Brasil deve ser repensado, uma vez que segue a tradição romana- germânica do controle concentrado, mas pode ser orientado pelo sistema de precedentes do controle anglo-saxão. Ademais, muitos argumentam que já existe o atributo vinculador instituído pelas Súmulas Vinculantes nos julgamentos elaborados pelo STF. Faz-se mister que a Constituição possa sofrer adaptações benéficas para a população de forma equânime de maneira que uma lei julgada constitucional possa ser utilizada em todas as instâncias, com segurança jurídica, inibindo divergências desnecessárias.

Nessa linha de argumentação, em 2017, houve o julgamento da ADI 3406 e 3470 do Rio de Janeiro sobre a constitucionalidade da lei 3.579 de 2001 que proibia a extração e utilização do amianto no Estado do Rio de Janeiro. Posteriormente, houve a constatação da constitucionalidade desta lei ampliando o efeito para todos para o bem do coletivo, gerando o debate sobre o alcance do Artigo 52 da Constituição Federal.  Nessa perspectiva, sabe-se que o amianto é uma substância nociva e cancerígena que não deveria mais ser utilizada, por isso, a constitucionalidade desta lei deveria ter efeitos erga omnes com celeridade e segurança jurídica. Porém, muitos constitucionalistas questionam sobre a falta de equilíbrio entre os poderes uma vez que o senado Federal somente poderia publicar sem se manifestar sobre os efeitos ex-nunc ou ex-tunc. Segundo o jurista Pedro Lenza, “Parece que somente mediante necessária reforma constitucional é que seria possível assegurar a constitucionalidade dessa nova tendência”. Portanto, a controvérsia sobre o assunto ainda não foi

Joseane de Menezes Condé
Discente de Direito em Piracicaba, estagiária do TRT 15 e é formada em Medicina Veterinária pela Universidade Federal de Minas Gerais. Escreve para o Jornal Gazeta Piracicaba.

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