Ademais, no decorrer do tempo, os princípios foram matéria de constantes discussões e estudos no âmbito da doutrina pátria. De fato, estes institutos são de fundamental importância para a estruturação e interpretação das normas jurídicas, legitimando seu recorrente debate. Para Alexy (2008), regras e princípios consistem em normas, pois ditam o que deve ser feito. Os princípios, tal como as normas, constituem bases para juízos concretos, distinguindo-se pelo critério da generalidade.
Em contrapartida, Ávila (2018) descreve os princípios como pensamentos diretivos relativos a uma regulamentação jurídica real ou eventual, não passíveis de aplicação, visto a ausência de natureza formal de proposições jurídicas. Portanto, pode-se afirmar que os princípios são legítimos mandamentos de otimização, caracterizados principalmente por variados graus de satisfação possíveis de atingir (ALEXY, 2008).
Com efeito, a Administração Pública tem como função gerenciar os interesses da coletividade, que é desenvolvida pelos seus agentes públicos ou delegados. Desta forma, no gerenciamento desses interesses, a Administração Pública deve exercer as suas funções como gestor do negócio público, observando o que disciplina os princípios inerentes a sua atividade para atender o interesse público.
A respeito do que preconiza esses princípios não fica somente na esfera da Administração Direta e Indireta, mas também aos entes que a Administração Pública delega suas funções.
Segundo Justen Filho:
Utiliza-se, geralmente, a expressão Administração Pública para fazer referência ao conjunto de entes e organizações titulares da função administrativa. Mas a expressão pode ser interpretada em diversos sentidos.
Numa acepção subjetiva, Administração Pública é o conjunto de pessoas, públicas e privadas, e de órgãos que exercitam atividade administrativa.
Em sentido objetivo, Administração Pública é o conjunto dos bens e direitos necessários ao desempenho da função administrativa.
Sob um enfoque funcional, a Administração Pública é uma espécie de atividade, caracterizada pela adoção de providências de diversa natureza, visando á satisfação imediata dos direitos fundamentais. (FILHO, 2006, pág. 91).
Registra-se por oportuno, que o Gestor Público deve atuar em nome da coletividade sendo um exímio fiscalizador do interesse coletivo, todavia, essa fiscalização deve ser pautada em diretrizes decorrentes de princípios previstos na Constituição Federal, bem como respaldado no bem estar social.
A Constituição Federal, em seu art. 37 elenca os princípios explícitos da Administração Pública: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (...)”.
Tendo sido empregado como pilar da elaboração do Estado Democrático de Direito, o princípio da legalidade vem determinado no inciso II, art. 5º da CF, sendo que: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.
Desta maneira, a Administração Pública, deve exercer suas funções com base no que disciplina as normas, ou seja, deve atuar segundo a lei, nos limites da lei e na forma da lei.
Com relação ao princípio da eficiência, tem-se a ideia de que a Administração Pública deverá atuar da melhor forma possível, ou seja, deve buscar os melhores resultados no interesse dos seus administrados. Este princípio é aplicado lado a lado com o da economicidade, ou seja, os recursos públicos devem ser aplicados com racionalidade.
Sobre o tema, Lucas Rocha Furtado:
A eficiência requer do responsável pela aplicação dos recursos públicos o exame de relação de custo/benefício da sua atuação. O primeiro aspecto a ser considerado em termos de eficiência é a necessidade de planejamento, de definição das necessidades e a indicação das melhores soluções para o atendimento da necessidade pública. (…)
O primeiro passo para o desenvolvimento de atividade de modo eficiente corresponde á necessidade de planejamento dos gastos públicos; o segundo passo a ser dado está ligado á definição das metas; e o terceiro passo corresponde ao exame dos custos necessários á realização das metas.(...) (FURTADO, 2007, pág. 113)
Do mesmo modo, o supracitado dispositivo legal recepciona e concretiza o princípio da economicidade e eficiência, que em razão dos ditames constitucionais, devem ser aplicados nos atos expedidos pela Administração Pública, conforme prevê os arts. 70, 37 e 74, II, da Constituição Federal.
Ademais, a intenção do legislador constituinte foi estabelecer, que o Poder Público aloque os recursos públicos, bem como prestem serviço público de maneira racional, isto é, sem que ocorra gastos excessivos com o dinheiro público, este dinheiro deve ter duração maior possível, tanto em qualidade, quanto é quantidade, conforme bem observa Paulo Soares:
O que se quer neste momento fixar é a idéia-chave de que a economicidade reflete uma opção estratégica do constituinte de 1988 pela racional fundamentação das decisões politicamente motivadas concernentes á alocação do conjunto escasso de recursos públicos á disposição dos agentes delegados da sociedade, na sua primordial missão de atender, da melhor maneira possível, aos legítimos e urgentes anseios individuais e coletivos presentes em nossa perversa realidade socioeconômica. (BUGARIN, 2004, p. 117).
Neste sentido, economicidade, num plano político-econômico, se vincula ao necessário, e ainda não consolidado, processo de avaliação das decisões públicas sob o prisma de análise de seus custos e benefícios para a sociedade, ou para a comunidade a que se refere.
Na mesma linha de raciocínio, convém transcrever o pensamento de Marçal Justen:
Um dos aspectos essenciais do direito administrativo reside na vedação ao desperdício ou má utilização dos recursos destinados á satisfação de necessidades coletivas. É necessário obter o máximo de resultados com a menor quantidade possível de desembolsos. (JUSTEN FILHO, 2006, p. 85).
Por tudo isso, observa-se a ocorrência de uma celeuma em razão da proteção desses valores pela Constituição Federal. Desta forma, para solução desta celeuma, tem-se a utilização de princípios para a interpretação dessas normas recepcionadas pela Constituição Federal, em especial o princípio a técnica exegética de ponderação de interesses, bem como o da concordância prática ou da harmonização.
Neste passo, o interprete deverá analisar o caso concreto com proporcionalidade e razoabilidade, de maneira que possa realizar a interpretação da melhor forma possível, haja vista, que não a hierarquia entre bens e valores conflitantes.
De acordo com o princípio da concordância prática, quando da ocorrência de bens e valores protegidos e assegurados pela Constituição Federal, o intérprete deverá aplicar uma solução ao caso concreto, de maneira que essa solução favoreça a todos esses bens em conflitos, impossibilitando a renúncia de uns em relação aos outros. No caso em tela tem-se um conflito entre o direito de propriedade constitucionalmente assegurado, art.5º, XXII, bem como a existência de três bens também assegurados pela Constituição Federal (economicidade, eficiência e intangibilidade da obra e/ou serviços públicos).
Desta forma, é justamente esse termo empregado pelo legislador constituinte que é encontrada a solução do conflito desses bens e valores, e deve ser encontrada analisando os casos individualmente, tendo em vista o emprego da ponderação de interesses e harmonização.
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ALEXY, R. Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo, SP: Malheiros Ed, 2008.
ÁVILA, Humberto. TEORIA DOS PRINCÍPIOS – DA DEFINIÇÃO À APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS JURÍDICOS. 13ª ed., revista e ampliada. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 85.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm >. Acesso em: 08 agosto 2022.
BUGARIN, Paulo Soares. O Princípio da Economicidade na Jurisprudência do Tribunal de Constas da União. Belo Horizonte: Fórum, 2004.
FURTADO, Lucas Rocha. Curso de direito administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2007.
JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 2ª ed. rer. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006.