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Setores de aviação civil e portos do Brasil no foco da OCDE

Dada a importância do setor de transportes para a economia e concorrência como um todo, não há dúvidas sobre a relevância dos mercados portuário e de aviação civil.

19/10/2022

Em setembro, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em colaboração com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), publicou o Relatório de Avaliação Concorrencial da OCDE do Brasil, no qual avaliou como a defesa da concorrência pode ajudar a desenvolver ainda mais os setores portuário e de aviação civil no Brasil.

A partir de consultas feitas ao Ministério da Infraestrutura, bem como à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e à Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), o organismo internacional identificou 550 barreiras potencialmente prejudiciais à concorrência em tais mercado. Assim, propôs 368 recomendações com vistas a minimizar os impactos negativos de tais barreiras. A OCDE ainda avaliou que, em uma estimativa conservadora, a implementação das sugestões indicaria benefícios econômicos entre R$ 700 milhões e R$ 1 bilhão por ano em favor dos consumidores.

Destaques aviação civil

Da análise do trabalho, chamam atenção algumas recomendações. No âmbito do mercado de aviação civil, a OCDE recomendou, por exemplo, que o Brasil garantisse a efetiva aplicação de um regime de livre acesso a infraestruturas de abastecimento de combustível de aviação, especialmente em grandes aeroportos internacionais. Já sobre o setor portuário, o organismo internacional aconselhou o país a endereçar a falta de segurança jurídica relacionada à cobrança das taxas portuárias relativas à movimentação de contêineres, simplificando o marco legal vigente por meio de dispositivos transparentes, não discriminatórios e objetivos para a cobrança de referidas taxas, incluindo aquelas relacionadas à taxa de SSE/THC2.

O setor de aviação é recorrentemente avaliado pelas autoridades concorrenciais. No âmbito do controle de estruturas, por exemplo, destaca-se a atuação do CADE na análise da formação de uma aliança estratégica, por meio de uma joint venture para compartilhamento de voos, entre a Delta Air Lines e a Latam diante da dificuldades enfrentadas pelas empresas aéreas por causa da pandemia do coronavírus. Ademais, cumpre ressaltar que o tema do acesso à infraestrutura de abastecimento de combustível de aviação em aeroportos, relacionada a uma das principais recomendações feitas pela OCDE no setor, está atualmente em pauta no Tribunal Administrativo do CADE.

Apesar de ainda estar pendente de julgamento, o Processo Administrativo 08700.001831/2014-27 trata de investigação iniciada a partir de representação apresentada pela Gran Petro Distribuidora de Combustível Ltda., em desfavor da Air BP Brasil Ltda., da BR Distribuidora S.A., da Concessionária do Aeroporto Internacional de Guarulhos S.A. e da Raízen Combustíveis S.A., em virtude de possíveis práticas anticompetitivas implementadas no sentido de limitar o acesso de terceiros ao mercado de combustíveis de aviação. Por fim, também vale mencionar que, em 2017, houve a publicação, pela autoridade antitruste, do Caderno sobre o mercado de transporte aéreo de passageiros e cargas.

Destaques portos

Igualmente, em relação ao setor portuário, o CADE também tem se manifestado de modo frequente, tendo, inclusive, contestado a regulação da Antaq relacionada à cobrança do de SSE/THC2, tema destacado pela própria OCDE em seu relatório como ponto de atenção no Brasil.

Apesar de a Antaq considerar lícita a cobrança de referida taxa, exigida pelos operadores portuários das instalações portuárias alfandegadas, nas quais é feita a armazenagem de cargas, o CADE já se manifestou reiteradas vezes quanto à ilegalidade e abusividade de referida cobrança.

Cumpre mencionar que, atualmente, tramita na Superintendência-Geral do CADE o Inquérito Administrativo 08700.003945/2020-50, que apura uma suposta prática de abuso de posição dominante consubstanciada em condutas discriminatórias por parte das empresas A.P. MØLLER - Maersk A/S, Maersk Brasil Brasmar Ltda. e MSC Mediterranean Shipping Company S.A. em favor da Brasil Terminal Portuário S.A.

A investigação ainda teve desdobramentos no leilão da área do Cais do Saboó (chamada de STS-10), que está na iminência de acontecer: a Associação Brasileira de Terminais e Recintos Alfandegados (ABTRA), representante do feito, solicitou ao CADE a concessão de medida preventiva que impedisse qualquer agente econômico ligado, direta ou indiretamente, a quaisquer dos grupos econômicos das Representadas de participar da concorrência, sob pena de a suposta discriminação ora investigada gerar dano irreparável à concorrência em decorrência do aumento do poder de mercado das Representadas.

Não obstante o CADE tenha entendido não ser competente para conceder medida preventiva que interfira nos critérios para a participação de agentes econômicos no leilão da área STS-10, a autoridade antitruste elaborou e encaminhou à Antaq uma nota técnica contendo uma análise concorrencial de referida outorga para guiar as decisões da autoridade portuária na condução do processo licitatório em questão, o que demonstra a intensa cooperação existente entre as autoridades. Por fim, destaca-se a publicação de dois importantes trabalhos pelo CADE sobre o tema do setor portuário: o Caderno sobre o mercado de serviços portuários, publicado em 2017, e o Caderno sobre o mercado de transporte marítimo de contêineres, publicado em 2018. 

Dada a importância do setor de transportes para a economia e concorrência como um todo, não há dúvidas sobre a relevância dos mercados portuário e de aviação civil. Nas palavras do Presidente da OCDE, Frédéric Jenny, durante o National Competition Day, realizado no dia 27/9, os setores em questão são fundamentais para a melhoria da economia no Brasil, pois eles permitem a movimentação de pessoas e mercadorias. Nesse sentido, espera-se que, a partir das recomendações feitas pela OCDE, referidos mercados se tornem ainda mais atrativos para investidores e, por consequência, mais prósperos e aquecidos, merecendo uma atenção ainda mais cautelosa por parte dos agentes econômicos e do próprio CADE.

Flávia Chiquito dos Santos
Head da área de Direito Concorrencial e Antitruste do Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados.

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