Concessão do auxílio por incapacidade temporária por análise documental
O primeiro aspecto a ser observado reside na introdução do § 14 ao art. 60 da lei 8.213/91, dispositivo legal onde está previsto o benefício de auxílio por incapacidade temporária para o trabalho (antigo auxílio-doença):
§ 14. Ato do Ministro de Estado do Trabalho e Previdência poderá estabelecer as condições de dispensa da emissão de parecer conclusivo da perícia médica federal quanto à incapacidade laboral, hipótese na qual a concessão do benefício de que trata este artigo será feita por meio de análise documental, incluídos atestados ou laudos médicos, realizada pelo INSS.
Este novo § 14 é bem interessante e pode ser bastante positivo para dinamizar a concessão do auxílio por incapacidade temporária para o trabalho.
A partir de ato normativo do Ministro do Trabalho e da Previdência serão definidas as condições em que a realização de perícia médica será dispensada no trâmite para a concessão do referido benefício por incapacidade. Nesses casos, a concessão do benefício advirá apenas de análise documental (laudos e atestados médicos) a cargo do INSS.
É importante consignar que os princípios constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa também se aplicam ao processo administrativo (art. 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal).
Diante deste ponto, compreendemos que a dispensa da realização de perícia médica e parecer conclusivo a cargo dos Peritos Médicos Federais somente poderá ocorrer nas situações em que a documentação médica já for suficiente e razoável para a concessão e implementação do benefício por incapacidade temporária para o trabalho.
Havendo insuficiência da documentação médica a demonstrar a incapacidade para o trabalho, não será caso de indeferimento do benefício, mas de realização de perícia médica que avalie esse quadro de modo mais efetivo.
Esse entendimento que declinamos aqui nada mais é que a internalização da experiência havido pelo INSS nos momentos mais agudos da crise sanitária, com as APS fechadas e a permissão de realização de concessão de determinados benefícios mediante apreciação de simples prova documental, ficando a necessidade de perícia médica delimitada apenas para as hipóteses de dúvida quando à comprovação da incapacidade laboral (lei 14.131/21).
O art. 60, § 14, da lei 8.213/91, foi regulamentado pela Portaria Conjunta MTP/INSS 7/22 e mais recentemente pela Portaria INSS 22/22.
Sempre é válido registrar que a regulamentação administrativa deverá ser apreciada e interpretada com a perspectiva de que o poder regulamentar apenas e tão somente deve viabilizar a execução das leis (artigo 84, inciso IV, da Constituição Federal), não lhe competindo estabelecer novas obrigações aos segurados.
Inclusão do auxílio-acidente no programa de revisão periódica
O segundo ponto relevante da lei 14.441/22 diz respeito às mudanças no art. 101 da lei 8.213/91:
Art. 101. O segurado em gozo de auxílio por incapacidade temporária, auxílio-acidente ou aposentadoria por incapacidade permanente e o pensionista inválido, cujos benefícios tenham sido concedidos judicial ou administrativamente, estão obrigados, sob pena de suspensão do benefício, a submeter-se a:
I - exame médico a cargo da Previdência Social para avaliação das condições que ensejaram sua concessão ou manutenção;
II - processo de reabilitação profissional prescrito e custeado pela Previdência Social; e
III - tratamento dispensado gratuitamente, exceto o cirúrgico e a transfusão de sangue, que são facultativos.
Aqui, passa-se a fazer menção à nova nomenclatura trazida pela Emenda Constitucional 103/09: “incapacidade para o trabalho” no lugar de “invalidez” ou “doença”.
Incluiu-se no rol daqueles que devem se submeter a perícias médicas periódicas os beneficiários do auxílio-acidente.
No mais, mantêm-se, com simples alteração de redação e estrutura do art. 101 da lei 8.213/91, as exigências para que os beneficiários se submetam a processo de reabilitação profissional ou tratamento dispensado gratuitamente. Em relação ao exame médico, especificou-se sua finalidade como sendo a avaliação das condições que ensejaram a concessão ou manutenção do benefício por incapacidade.
Importante assinalar que a lei 14.441/22, tal qual a Medida Provisória 1.113, deixou intocadas as hipóteses de dispensa de perícia contidas no art. 101, § 1º, da lei 8.213/91 (pessoas com mais de 60 anos, portadores do vírus HIV/AIDS e pessoas com mais de 55 anos e afastadas do trabalho há mais de 15 anos).
Foram introduzidos os §§ 6º e 7º ao art. 101 da lei 8.213/91, que permitem que a realização do exame médico para constatação da permanência da incapacidade para o trabalho seja feita via remota, nos termos do art. 60, § 14, do mesmo diploma legal:
§ 6º A avaliação de que trata o inciso I do caput deste artigo poderá ser realizada de forma remota ou por análise documental, observado o disposto no § 14 do art. 60 desta Lei e no § 7º deste artigo.
§ 7º Ato do Ministro de Estado do Trabalho e Previdência disporá sobre as hipóteses de substituição de exame pericial presencial por exame remoto e as condições e as limitações para sua realização.
A princípio, não vemos óbice para a realização dos exames periódicos se dar por via remota, desde que sejam respeitadas todas as garantias dos segurados e o princípio do devido processo legal, conforme expusemos acima em relação ao art. 60, § 14.
Recursos administrativos para o CRPS
No processo de conversão em lei da Medida Provisória 1.113 não vingou a transferência de competência dos recursos administrativos referentes à decisão sobre capacidade laboral para o âmbito da Subsecretaria de Perícia Médica Federal, conforme pretendia art. 126-A, então inserido na lei 8.213/91, abaixo transcrito:
Art. 126 - A. Compete à Secretaria de Previdência do Ministério do Trabalho e Previdência, por meio da Subsecretaria de Perícia Médica Federal, o julgamento dos recursos das decisões constantes de parecer conclusivo quanto à incapacidade laboral e à caracterização da invalidez do dependente, na forma do regulamento.
Parágrafo único. A atribuição para o julgamento dos recursos a que se refere o caput será dos integrantes da carreira de Perito Médico Federal e o julgador será autoridade superior, de acordo com a hierarquia administrativa do órgão, àquela que tenha realizado o exame médico pericial.
Portanto, tal competência recursal permanece na órbita do CRPS – Conselho de Recursos da Previdência Social.
BPC: avaliação biopsicossocial
O art. 20, da lei 8.742/91, recebeu a inclusão do § 6º-A, que passou a permitir a celebração de parcerias do INSS com entidades da iniciativa privada e do setor público para a realização da avaliação social necessária à concessão do BPC:
§ 6º - A. O INSS poderá celebrar parcerias para a realização da avaliação social, sob a supervisão do serviço social da autarquia.
Conforme o art. 20, § 6º, daquele diploma legal, a concessão do BPC depende de avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2º do próprio art. 20, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do INSS.
O art. 20, § 7º, já dispunha que, na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, ficava assegurado o seu encaminhamento ao município mais próximo que contasse com tal estrutura.
Complementando esta dinâmica, o recém introduzido § 6º - A permite que tais exames sejam efetuados também mediante parcerias que serão supervisionadas pelo serviço social do INSS.
Auxílio-inclusão para PcD
A lei 8.742/93 também foi alterada no que consiste no auxílio-inclusão para as PcD. A concessão desta passa a ser automática, nos termos do art. 26-B, §§ 2º e 3º:
§ 2º O auxílio-inclusão será concedido automaticamente pelo INSS, observado o preenchimento dos demais requisitos, mediante constatação, pela própria autarquia ou pelo Ministério da Cidadania, de acumulação do benefício de prestação continuada com o exercício de atividade remunerada.
§ 3º Na hipótese do § 2º deste artigo, o auxílio-inclusão será devido a partir do primeiro dia da competência em que se identificou a ocorrência de acumulação do benefício de prestação continuada com o exercício de atividade remunerada, e o titular deverá ser notificado quanto à alteração do benefício e suas consequências administrativas.
Segurados especiais pescadores artesanais
Embora muitas pessoas identifiquem os segurados especiais somente aos trabalhadores rurais, é necessário lembrar que também os pescadores são enquadrados nesta categoria de segurado do RGPS.
A lei 14.441/22 trouxe uma medida que não constava da redação original da Medida Provisória 1.113, referente à forma de organização das colônias de pescadores, alterando a lei 11.699/08, que é sua norma de regência:
§ 2º As colônias têm liberdade de se organizarem em mais de uma federação estadual, e estas em mais de uma confederação nacional.
§ 3º Se houver mais de uma federação estadual ou confederação nacional, nos termos do caput e do § 2º deste artigo, o disposto nesta Lei aplica-se igualmente a todas as colônias e confederações desde que tenham representatividade mínima de 20% (vinte por cento), respectivamente, das colônias e das federações existentes.
Permite-se às colônias de pescadores se organizarem em mais de uma Federação por Estado, e estas em mais de uma Confederação nacional, indicando-se também a margem mínima de representatividade exigida para seu funcionamento.
Ampliação do alcance da Operação Pente Fino
A lei 13.846/19 (Operação Pente Fino) também foi alterada e passam a ser suscetíveis de inclusão no Programa Especial não somente os requerimentos iniciais, mas também recursos administrativos e revisões, bem como processos administrativos com prazo de conclusão expirado:
Art. 1º. (...)
I - o Programa Especial para Análise de Benefícios com Indícios de Irregularidade (Programa Especial), com o objetivo de analisar processos que apresentem indícios de irregularidade ou potencial risco de realização de gastos indevidos na concessão, no recurso ou na revisão de benefícios administrados pelo INSS; e
§ 2º Integrará o Programa Especial, observado o disposto no § 1º do art. 2º, a análise de processos administrativos de requerimento inicial e de revisão de benefícios administrados pelo INSS com prazo legal para conclusão expirado e que represente acréscimo real à capacidade operacional regular de conclusão de requerimentos, individualmente considerada, conforme estabelecido em ato do Presidente do INSS.
Houve também mudança em relação à atuação dos Peritos Médicos Federais no âmbito do Pente Fino:
§ 4º Integrarão o Programa de Revisão:
I - o acompanhamento por médico perito de processos judiciais de benefícios por incapacidade; e
II - o exame médico pericial presencial realizado nas unidades de atendimento da Previdência Social quando o prazo máximo cujo prazo máximo de agendamento de perícia médica for superior a quarenta e cinco dias.