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A distribuição de lucros de acordo com os regimes tributários brasileiros

A distribuição de lucros pela sociedade empresária é a maneira mais barata de remunerar o sócio, haja vista que são livres da tributação de imposto de rende, contudo, suas regras irão variar de acordo com o regime tributário adotado.

12/9/2022

I. INTRODUÇÃO

A distribuição de lucros, pelo menos na maioria dos casos, não possui tributação, eis que os tributos já foram recolhidos pela empresa. Entretanto, há que se ressaltar que o regime tributário escolhido influencia diretamente no pagamento dos impostos.

A título de exemplo, podemos citar que no regime tributário do lucro real onde a cobrança de alguns tributos se dá sobre o faturamento, como PIS, COFINS e ISS, porém o Imposto de Renda e a Contribuição incidem sobre o lucro final da empresa apurado pela contabilidade.

Já no lucro presumido, o IRPJ e CSLL serão calculados com base em uma estimativa de lucratividade, sendo considerada uma margem de lucro pré-fixada pela Receita Federal que varia de acordo com a atividade empresarial.

Assim, os tributos a serem pagos independem de haver lucro ou não, pois incidem sobre a margem presumida, de modo que mesmo que a empresa tenha prejuízos no período, precisa pagá-los.

Impende comentar ainda que o art. 32 da lei 4.357/64, que autoriza a emissão de Obrigações do Tesouro Nacional, altera a legislação do imposto sobre a renda, e dá outras providências, traz a proibição de distribuição de lucros quando existentes dívidas tributárias no âmbito federal, da.

Entretanto, a Receita Federal do Brasil – RFB, na Solução de Consulta 30, Cosit, de 27/3/18, sobre o referido dispositivo legal, posicionou-se da seguinte forma: a) sociedades limitadas com débitos com exigibilidade suspensa (parcelados, garantidos por penhora, objeto de liminar etc.) podem distribuir lucros; b) sociedades anônimas podem distribuir dividendos mesmo com dívidas; c) empresas devedoras de tributos estão proibidas de distribuir lucros aos sócios, sob pena de pagar 50% (cinquenta por cento)do valor indevidamente distribuído, a título de multa.

II. DA DISTRIBUIÇÃO DE LUCROS NO SIMPLES NACIONAL

Esse regime tributário exige especial atenção ao se falar em distribuição de lucros, na medida em que a lei Complementar 123/06 estabelece um limite máximo para distribuição dos lucros quando o empresário não tiver demonstrado esse faturamento em sua contabilidade. E é nesse ponto que reside a maior ‘pegadinha’ do Simples Nacional.

Recorde-se que que no Simples Nacional, os tributos são pagos mediante guia única denominada de Documento de Arrecadação do Simples Nacional - DAS, porém, se porventura for ultrapassado o valor teto, tanto o ICMS quanto o ISS são cobrados separadamente.

Consequência do estabelecimento de limites é que caso uma empresa realize divisão de lucros de valores acima das margens pré-fixadas pela legislação ou não tiver demonstrado esse faturamento em sua contabilidade, a isenção de pagamento de impostos sobre a distribuição de lucros deixará de existir.

Deste modo, se uma empresa optante do simples nacional distribuir um valor acima daqueles percentuais definidos na legislação e ainda se a contabilidade não realizar a escrituração completa das informações, o sócio poderá ter que pagar Imposto de Renda também na pessoa física, declarando os valores recebidos na declaração anual do Imposto de Renda pessoa física (DIRPF), como rendimentos tributáveis.

Ocorre que o art. 14 da LCP 123/06 estabelece que: “consideram-se isentos do imposto de renda, na fonte e na declaração de ajuste do beneficiário, os valores efetivamente pagos ou distribuídos ao titular ou sócio da microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional, salvo os que corresponderem a pró-labore, aluguéis ou serviços prestados.”

O seja, a LCP 123/06 dá com uma mão e retira com a outra, na medida em que o §4º-A do art. 26 dispensa e veda a exigência de escrituração fiscal digital ou obrigação equivalente da microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional, contudo, afirma no §1º do art. 14 que a isenção de imposto de renda fica limitada ao valor resultante da aplicação dos percentuais de que trata o art. 15 da lei no 9.249.

Vindo o § 2º  do referido artigo afirmar que, caso a pessoa jurídica queira distribuir lucro acima dos percentuais pré-fixados, deverá “manter escrituração contábil e evidenciar lucro superior àquele limite”, o que revela a necessidade das pessoas jurídicas, ainda que dispensadas, manterem escrituração contábil de seus negócios, para que possam usufruir da isenção de Imposto de Renda na integral distribuição de lucros.

A respeito da prefixação do percentual cujo lucro será presumido pelo fisco, tem-se que lei no 9.249/94 adotou como regra geral a presunção de lucro 8% do faturamento, estabelecendo ainda que para os serviços de revenda, para consumo, de combustível derivado de petróleo, álcool etílico carburante e gás natural a alíquota seria de 1,6%; a prestação de serviços de transporte, exceto o de carga, seria de 16%; e a) prestação de serviços em geral seria de 32%, excetuada as hipóteses da lei.

III. DISTRIBUIÇÃO DE LUCROS VS PRÓ-LABORE

Sempre que do resultado do balanço econômico da sociedade resultar lucro, os sócios poderão distribui-lo entre si ou optar por reinvesti-lo na sociedade empresária, hipótese em que haverá aumento do capital social.

A distribuição de lucros, enquanto fenômeno resultante da apuração mediante balanço econômico da sociedade que apresentou resultados positivos, consiste na sempre partilha entre os sócios, acionistas e investidores do faturamento gerado por uma empresa em um determinado período. Tal divisão é feita de acordo com as porcentagens de cada um na participação no negócio, salvo estipulação contratual em sentido diverso, sendo vedado, contudo, a exclusão total de participação nos resultados.

Para que ocorra a distribuição de lucros, deve o empresário ou a sociedade empresária observar algumas regras impostas pelas legislação.

Antes de prosseguir, importante dedilhar ainda que brevemente sobre a distinção entre distribuição de lucros e pró-labore, conceitos usualmente confundidos e (mal) utilizados pelos sócios, na medida em que estes instrumentos são os únicos capazes de transferir, legalmente, dinheiro da sociedade para os sócios.

Uma distinção que poderá ser adotada, grosso modo, é a de que a distribuição de lucros é feita com base na lucratividade da empresa em determinado período, sendo que o seu pagamento é feito aos sócios, investidores e acionistas, independentemente de terem trabalhado ou não no negócio, ao passo que o pró-labore é remuneração daquele que trabalhou para a sociedade empresária, é uma espécie de salário do administrador, ou seja exige daquele que o recebe uma contraprestação de serviços.

No que se refere à tributação, na distribuição de lucros não incidem tributos, já no pró-labore são cobrados Imposto de Renda e a também a Contribuição Previdenciária.

Em relação à periodicidade da distribuição dos lucros não há um dispositivo legal que a determine, por esta razão, esta deve ser definida no Contrato Social. Na sua ausência, é comum que ocorra após o fechamento do balanço da empresa, ou seja, uma vez ao ano.

Sobre a obrigatoriedade da divisão de lucros, a lei 6.404, de 14 de dezembro de 1976, que dispõe sobre a Sociedade por Ações, dispõe que, no mínimo, 25% (vinte e cinco por cento) dos lucros obtidos pela empresa sejam divididos entre sócios e investidores, sendo possível que este valor seja menor, desde que haja previsão no estatuto (nos termos do art. 17, § 1º, I, “b” e § 4º).

Já no caso das Sociedades Limitadas, a distribuição dos lucros aos sócios se dá na proporção da participação de cada um deles no capital da sociedade, ou seja, na proporção do valor total de suas quotas. A lei exige que o contrato social preveja expressamente como se dará a distribuição dos lucros entre os quotistas, não podendo este excluir ou privar nenhum sócio do direito de receber sua participação.

Outro ponto importante com relação à distribuição de lucros é que apenas empresas com escrituração contábil completa conseguirão comprovar os requisitos necessários à isenção completa de impostos sobre as retiradas.

Vale lembrar que nem todo o faturamento da empresa deve ser retirado e dividido, uma vez que a empresa precisa de capital para se manter, sem falar que os sócios e investidores devem pensar em formas de fomentar suas atividades, aplicando capital em estrutura física, modernização de suas instalações, capacitação de seus empregados, etc.

IV . CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante de tudo o que foi explanado, verifica-se que sempre do resultado do exercício social resultar em lucro, deverá a sociedade optar pela distribuição de lucros, de sua integralidade ou de parte dele, fazendo reserva do valor remanescente nos cofres da sociedade.

Optando pela distribuição de lucros, devem ser observadas algumas regras estipuladas pelo regime tributário escolhido pelo empresário para apurar os tributos devidos pelo exercício da atividade.

Caso a sociedade opte pela distribuição parcial, deve-se atentar se o saldo remanescente do lucro ficará no caixa da sociedade, a título de reserva de capital, ou se os sócios deliberarão por reinvestir este lucro na sociedade, hipótese em que deverão promover alteração em seu contrato social para elevar o capital social para que assim evite futura possível configuração de subcapitalização que pode resultar na desconsideração da personalidade jurídica pela evidenciação de confusão patrimonial.

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BRASIL. Lei nº 4.357, de 16 de julho de 1964. Autoriza a emissão de Obrigações do Tesouro Nacional, altera a legislação do imposto sobre a renda. Brasília, DF: Senado Federal, 1964.

BRASIL. Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações. Brasília, DF: Senado Federal, 1976.

BRASIL. Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995. Altera a legislação do imposto de renda das pessoas jurídicas, bem como da contribuição social sobre o lucro líquido. Brasília, DF: Senado Federal, 1995.

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Brasília, DF: Senado Federal, 2002.

BRASIL. Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006. Institui o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte. Brasília, DF: Senado Federal, 2006.

GULARTE, Charles. Distribuição de Lucros: O que é? Como fazer na sua empresa. Disponível em: https://www.contabilizei.com.br/contabilidade-online/distribuicao-de-lucros/. Acesso em: 30/08/2022.

MEDEIROS, Marco Aurélio. Afinal, pode distribuir lucros devendo tributos?. Disponível em: https://advmsa.com.br/afinal-pode-distribuir-lucros-devendo-tributos/amp/. Acesso em: 31/08/2022.

William de Oliveira Ramos
Mestrando em direitos fundamentais pela Universidade da Amazônia/UNAMA; Especialista em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas/FGV; especialista em Direito Processual Civil, Constitucional, Penal e Trabalhista pela Faculdade Maurício de Nassau de Belém; advogado sócio do escritório Ramos & Valadão Sociedade de Advogados.

Gabriela Carolina Santos Carballo
Bacharel em Direito pela Universidade da Amazônia - UNAMA; especialista em Direito Processual pela Universidade da Amazônia - UNAMA; Conselheira da OAB/PA Subseção Castanhal; advogada sócia do escritório Ramos & Valadão Sociedade de Advogados.

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