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A estabilização da tutela provisória e a teoria do fato consumado na jurisprudência do STF

A estabilização da tutela provisória satisfativa de urgência foi uma das preocupações do legislador, ao criar regramento específico sobre o tema, desde que observadas certas circunstâncias, como, por exemplo, a ausência de manifestação de irresignação da parte que sofreu os efeitos decisão.

12/9/2022

1. Introdução

A morosidade na prestação jurisdicional é uma realidade inafastável na realidade brasileira. Assim, ante a impossibilidade de se aguardar o desfecho final do processo é que surgiram as tutelas provisórias de urgência.

Em outro dizer, as tutelas provisórias de urgência surgiram no ordenamento jurídico pátrio com o objetivo de, assegurando a duração razoável do processo, impedir que as partes sejam penalizadas pelo decurso do tempo enquanto não tiver sido concedida a prestação jurisdicional definitiva. Historicamente, as tutelas provisórias são divididas em cautelar e antecipada (ou satisfativa).

Tema afeto às tutelas provisórias é a sua estabilização, seja em decorrência do decurso do tempo, seja em razão da inércia da parte que sofreu os efeitos das decisões pautadas com base nessa técnica processual. Ela, a estabilização, própria da coisa julgada, sempre foi um anseio da doutrina no que se refere às tutelas provisórias. Não se tratava de pleito relativo a conferir às tutelas provisórias o atributo da coisa julgada, mas sim de se estabelecer regulamento próprio com o objetivo pacificar a situação jurídica por ela regulamentada.  

Até o advento do Código de Processo Civil de 2015, não havia tratamento legal sobre o tema da estabilização. O Código de Processo Civil de 1973 apenas previa a possibilidade de concessão das tutelas antecipada e cautelar, mas não nada tratamento acerca da possibilidade de sua estabilização. O novo Diploma, por sua vez, foi além e estabeleceu os requisitos, as hipóteses e o procedimento para se obter a estabilização da tutela provisória.

Fixadas tais premissas, o objetivo deste trabalho é examinar os efeitos do decurso do tempo em face ao pronunciamento judicial editado em caráter precário. Mais especificamente, examinar o posicionamento do Supremo Tribunal Federal em face de determinada situação jurídica que se protraiu no tempo em decorrência de decisão judicial, mas sem a previsão legal expressa acerca da estabilização da tutela provisória.  

Com efeito, à luz de um importante julgamento levado a cabo pelo Supremo Tribunal Federal (REx 608.482/RN), em sede de recurso extraordinário, buscar-se-á analisar a estabilidade das decisões judiciais precárias em cotejo com a teoria do fato consumado.

2. Tutela provisória. Generalidades

A partir da vigência do novo Código de Processo brasileiro, em março de 2016, passará a ter eficácia no ordenamento jurídico pátrio regramento próprio e específico para as tutelas provisórias.

Com efeito, novo Diploma Adjetivo destinou o Livro V para tratar exclusivamente das tutelas provisórias. Ao tratar do tema, as subdividiu em tutela provisória antecipada, tutela provisória cautelar, ambas espécies de tutela provisória fundada na urgência, e tutela provisória da evidência, fundada, esta última, exclusivamente no direito evidente alegado pela parte. Assim, a tutela provisória é o gênero do qual são espécies as tutelas de urgência cautelar e antecipada e a tutela de evidência.

Deve ser destacado que o legislador processual de 2015 perdeu relevante oportunidade de identificar de forma clara a separação entre as tutelas provisórias. Afirma-se isso, pois “antecipada”, nos exatos termos legais, é o provimento judicial que se constitui como meio de obtenção da tutela jurisdicional “que pode tanto satisfazer como acautelar os direitos”1. Isto é, o que o legislador identificou como “antecipada” no novo Código de Processo Civil, deveria sê-lo como tutela “satisfativa”, já que “antecipado” pode ser o provimento jurisdicional tanto cautelar como satisfativo.

Em outro dizer, a tutela antecipada não é característica exclusiva da tutela satisfativa (ou tutela antecipada, como quer o legislador de 2015), mas também da tutela cautelar. Ou seja, o provimento judicial antecipado – antes da sentença definitiva – pode tanto cautelar quanto satisfativo. Assim, não nos parece adequada a nomenclatura utilizada pelo novo código, uma vez que, repita-se, valeu-se da qualidade “antecipada” para identificar a tutela provisória satisfativa, mas olvidou-se que a tutela provisória cautelar, e não satisfativa, também pode ser concedida de forma antecipada, antes da sentença. Mas, enfim, considerando o direito posto, pode-se afirmar que no ordenamento jurídico brasileiro a tutela antecipada é sinônimo de tutela provisória satisfativa de urgência.

Continuando as considerações introdutórias acerca do instituto, tem-se que tutela definitiva é a espécie de provimento jurisdicional fundada em cognição exauriente em relação à qual não mais é oponível recurso, isto é, baseada em juízo pleno sobre a demanda pelo magistrado. Ao passo que a tutela provisória consiste no pronunciamento judicial fundado em cognição sumária, precário, portanto, e sem, eventualmente, haver a formulação de juízo aprofundado de valor sobre o tema posto a exame.

A provisoriedade é a característica própria da relação que se estabelece entre o provimento jurisdicional final e o antecipado, seja este último cautelar ou satisfativo. Nesse sentido leciona Daniel Mitidiero:

Firme a premissa de que a técnica antecipatória constitui simples meio para obtenção da tutela jurisdicional, que pode tanto satisfazer como acautelar os direitos, a relação de provisoriedade que se estabelece é entre o provimento antecipado oriundo da técnica antecipatória e provimento final prolatado posteriormente. Existe uma relação de identidade – total ou parcial – entre o provimento antecipado e o provimento final: o provimento antecipado constitui simplesmente a versão provisória do provimento final. Dito de maneira clara: o provimento cautelar antecipado é a versão provisória do provimento cautelar final, assim como o provimento satisfativo antecipado é a versão provisória do provimento satisfativo final. 2

Segundo o regramento dado pelo Código de Processo Civil de 2015, a tutela provisória possui as seguintes características:

  1. Trata-se de provimento jurisdicional fundado em juízo de cognição sumária, uma vez que o nível de cognição é mais superficial se comparado com a exauriente;
  2. É precária. Isto é, não goza de definitividade, podendo ser revista a qualquer tempo;
  3. Não produz coisa julgada. Pelo fato de se tratar de provimento precário, não tem aptidão para produzir coisa julgada.

Todavia, tal tratamento específico para as tutelas provisórias não foi dispensado pelo Código de Processo Civil de 1973 mesmo após as suas inúmeras ondas reformatórias. Naquele Codex a tutela antecipada era tratada em um único artigo inserido nas disposições gerais do título relativo ao processo e ao procedimento. Ao passo que as cautelares eram tratadas em livro especial como ações autônomas. Não havia previsão expressa acerca da tutela da evidência, embora já se admitisse que a previsão do §6º do art. 273 do CPC/733 seria manifestação desta técnica processual.

O destaque das características da tutela provisória ganha relevo para este estudo, pois é justamente nessa seara que se contrapõe a estabilização. Por ser provisória, a decisão antecipada, cautelar ou satisfativa, pode ser revista ou modificada a qualquer tempo, desde que sejam observados alguns requisitos, consoante examinaremos em tópico próprio a seguir. 

3. A estabilização das tutelas provisórias

O Código de Processo Civil de 1973, no art. 273, §§4º e 5º, em relação às tutelas antecipadas satisfativas, e no art. 807, em relação às tutelas cautelares, trata do tema relativo à provisoriedade das tutelas de urgência:

Art. 273. [...]

§ 4o A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada. 

§ 5o Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento

Art. 807. As medidas cautelares conservam a sua eficácia no prazo do artigo antecedente e na pendência do processo principal; mas podem, a qualquer tempo, ser revogadas ou modificadas.

A norma que se extrai a partir da exegese destes dispositivos é: uma vez concedida a tutela antecipada satisfativa ou a tutela cautelar, ela poderá ser revista a qualquer tempo, desde que haja, para tanto, decisão fundamentada, seja do próprio juízo, ante novo arcabouço probatório, ou de outro órgão jurisdicional de hierarquia superior ao prolator da decisão, quando provocado por meio do recurso cabível (agravo de instrumento, apelação etc.).

Sobre o tema, nos ensina Athos Gusmão Carneiro 

O provimento relativo à AT [antecipação de tutela] é suscetível de modificação por duas vias processuais:

  1. mediante recurso de agravo;
  2. através de nova decisão do magistrado singular, após pedido da parte para a revogação ou modificação da decisão anterior, ou para a concessão da AT antes indeferida. 4

Em relação à possibilidade de revisão da decisão que concede tutela provisória por meio do recurso extraordinário, Athos Gusmão Carneiro lembra que:

[...] o Supremo Tribunal Federal tem considerado incabível recurso extraordinário contra acórdão que concede tutela antecipada, 'uma vez que não há manifestação conclusivo sobre os dispositivos constitucionais em questão, não se configurando, assim, a hipótese do art. 102, III, a, da CF – que prevê a competência do STF para julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão contrariar dispositivo da Constituição’ (RE 315.052, Rel. Min. Moreira Alves, ac. de 28/5/02, inf. STF 270 – maio 2002). 5

Em uma palavra: em relação às tutelas de urgência, cautelar ou satisfativa (antecipada), a provisoriedade é a tônica e o “conhecimento limitado do objeto (em vista da sumária cognição) inviabilizaria um juízo conclusivo e estável”6.

A estabilidade, por sua vez, é atributo ínsito à coisa julgada. Como regra, somente uma decisão apta a produzir coisa julgada que poderá carregar o signo da estabilidade. A decisão judicial que concede uma tutela provisória por não possuir tal atributo, não pode, como regra, ser estabilizada.

Segundo Teori Albino Zavascki,

A tutela jurisdicional prometida na Constituição é tutela de cognição exauriente, que persegue o juízo mais aproximado possível da certeza jurídica; é tutela definitiva, cuja imutabilidade confere adequado nível de estabilidade às relações sociais; é, em suma, tutela que privilegia o valor segurança. A tutela-padrão podemos denominar tutela definitiva, como fazem os clássicos quando a diferenciam da tutela cautelar.7

Mas é possível se pensar em estabilidade da tutela provisória, mesmo considerando a sua precariedade (possibilidade de ser modificada ou reformada a quanto tempo)? A resposta a esta indagação exige a exposição e um breve escorço histórico.

Até o advento do Código de Processo Civil de 2015 não havia previsão expressa acerca da estabilidade da tutela provisória. O Estatuto Processual de 1973 era silente quanto ao ponto, prevendo, ao contrário, que tanto a tutela antecipada satisfativa quanto a tutela cautelar poderiam ser modificadas a qualquer tempo, conforme disposição expressa nos §§4º e 5º do art. 273 e no art. 807, respectivamente.

Aproveitando as ondas de reforma no processo civil brasileiro, em 2005, o Instituto Brasileiro de Direito Processual elaborou e encaminhou projeto de lei tratando da estabilização da tutela antecipada. No Senado, foi identificado pelo projeto de lei 186/05, de Relatoria do Senador Antero Paes de Barros, mas foi arquivado do ano de 2007. Segundo José dos Santos Bedaque, um dos autores do projeto, o seu objetivo era

[...] tornar definitivo e suficiente o comando estabelecido por ocasião da decisão antecipatória. Não importa se trata de antecipação total ou parcial. [...] É deixar que as próprias partes decidam sobre a conveniência, ou não, da instauração ou do prosseguimento da demanda e sua definição em termos tradicionais, com atividades instrutórias das partes, cognição plena e exauriente do juiz e a correspondente sentença de mérito. [...] Concedida a tutela antecipada, a cognição plena fica na dependência da provocação de qualquer das partes.8

Em termos práticos, o projeto de lei do Senado 186/05 objetivava instituir a seguinte sistemática, como bem destacado por Bedaque: “deferida a tutela antecipada, incidentalmente ou em procedimento prévio, e se omitindo as partes quanto ao prosseguimento do processo ou à propositura da demanda cognitiva, a decisão transitará em julgado”9.

Quanto à política legislativa, o projeto de lei alteraria os §§4º e 5º do art. 273 do CPC/73 para permitir a modificação da tutela antecipada somente na hipótese de não ter havido a preclusão criada pelos artigos que seriam inseridos no código, bem como estabelecer o contraditório prévio à sua prolação como regra que só poderia ser afastada em caso de extrema urgência.

Além disso, o projeto de lei também tinha por objetivo inserir no CPC/73 os arts. 273-A, 273-B, 273-C e 273-D, os quais, em essência, previam a tutela antecipada tanto como incidental ao processo quanto como antecedente a ele, bem como criava regras com vistas à preclusão da modificação da tutela provisória, tornando-a estável.10

Todavia, como dito, infelizmente o projeto de lei foi arquivado e, à época, deixou-se de criar regras para a estabilidade da tutela provisória.

Como o Código de Processo Civil de 2015, por outro lado, a partir de março de 2015, o ordenamento jurídico brasileiro poderá contar com regras específicas acerca da possibilidade de a tutela provisória de urgência tornar-se estável. O Livro V do novo Código traz regras claras quanto ponto:

Art. 304.  A tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303 [em caráter antecedente], torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso.

§ 1º No caso previsto no caput, o processo será extinto.

§ 2º Qualquer das partes poderá demandar a outra com o intuito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada nos termos do caput.

§ 3º A tutela antecipada conservará seus efeitos enquanto não revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito proferida na ação de que trata o § 2º.

§ 4º Qualquer das partes poderá requerer o desarquivamento dos autos em que foi concedida a medida, para instruir a petição inicial da ação a que se refere o § 2º, prevento o juízo em que a tutela antecipada foi concedida.

§ 5º O direito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada, previsto no § 2o deste artigo, extingue-se após 2 (dois) anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo, nos termos do § 1º.

§ 6º A decisão que concede a tutela não fará coisa julgada, mas a estabilidade dos respectivos efeitos só será afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar, proferida em ação ajuizada por uma das partes, nos termos do § 2º deste artigo.

A regra da estabilidade, por óbvio, aplica-se apenas à tutela provisória antecipada, em razão da sua satisfatividade. A tutela provisória cautelar prescinde de regra acerca da estabilidade, uma vez que a consequência do provimento acautelatório no mundo dos fatos, por não guardar pertinência com o direito material, dispensa regramento nesse sentido.

O fato é que, com o início da vigência do Código de Processo Civil de 2015, é possível afirmar que o direito brasileiro admite a possibilidade de a tutela provisória satisfativa de urgência, precária por natureza, tornar-se estável, desde que não haja atuação contrária da parte que sofreu as consequências da decisão. Isto é, a partir de então, não será somente a decisão judicial definitiva (sentença, por exemplo) que pode se tornar estável e trazer a pacificação social.

Uma advertência deve ser feita. A estabilização da tutela provisória não se confunde com a coisa julgada e tal circunstância não foi olvidada pelo legislador, pois previu expressamente no §6º do art. 304 do novo Código de Processo Civil a impossibilidade de a tutela provisória estabilizada formar a coisa julgada.

Pois bem. Com o advento do novo Código de Processo Civil, não remanescem dúvidas acerca da possibilidade de a tutela provisória de urgência satisfativa tornar-se, mas estável. Mas, ainda sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, ainda que houvesse omissão legislativa acerca do tema, não seria possível estabilizar determinada tutela provisória em face de longo decurso de tempo? Em outro dizer, será que nem mesmo o decurso de longo período teria o condão de conferir estabilidade à tutela provisória em homenagem ao princípio da confiança legítima?

O Supremo Tribunal Federal respondeu a estes questionamentos ao julgar o recurso extraordinário 608.482/RN, de Relatoria do Ministro Teori Zavascki. Naquela oportunidade, o instituto da estabilidade da tutela provisória foi tratado como vertente da teoria do fato consumado.

Embora sem expressa previsão legal, a teoria do fato consumado sempre foi invocada para tutelar situações em que o decurso do tempo tratou de consolidar as relações de direito material. A sua maior aplicação tem sido nas relações com o Poder Público.

No item seguinte estudaremos o julgamento do citado recurso excepcional e sua repercussão na estabilização da tutela provisória de acordo com as regras do Código de Processo Civil de 1973.

4. O julgamento do recurso extraordinário 608.482/RN

O Supremo Tribunal Federal, ainda sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, no ano de 2014, julgou o recurso extraordinário 608.482/RN, de Relatoria do Ministro Teori Zavascki, oportunidade em que a estabilização da tutela provisória foi colocada em discussão, ainda que sem regramento específico.

Discutiu-se naquele recurso excepcional qual deveria ser a prevalência: a precariedade da decisão interlocutória que antecipara os efeitos da tutela ou o decurso de tempo hábil criar confiança legítima, como derivação do princípio da segurança jurídica, no beneficiário da decisão?

Trataremos neste item dos desdobramentos fático-jurídicos do caso e das relevantes observações atinentes ao julgamento do Tribunal.

4.1 Resumo do caso

Determinada candidata prestou concurso público para o cargo de agente da Polícia Civil do Estado do Rio Grande do Norte no mês de setembro do ano 2000. O certame era dividido em 4 (quatro) fases nesta ordem: a primeira, prova escrita, a segunda, teste físico, a terceira, exame psicotécnico, a quarta e última, curso de formação.

A candidata foi aprovada na prova escrita, primeira fase, mas não obteve êxito na segunda, teste físico. Dentre as provas a serem cumpridas da fase do teste físico, os candidatos deveriam completar 20 (vinte) flexões abdominais. Pelo que consta dos autos, a candidata realizou 22 (vinte e duas) flexões, quando o fiscal da prova orientou que ela pudesse encerrar. Em princípio, a sua aprovação já era dada como certa, mas, instantes após a realização da tarefa, a banca examinadora julgou que 3 (três) das 22 (vinte e duas) flexões executadas não poderiam ser consideradas e, em vez de 22 (vinte e duas), somente poderiam ser contabilizadas 19 (dezenove) das flexões abdominais. A partir daí ela não mais poderia participar das outras fases do certame, pois havia considerada como reprovada no teste físico, segunda fase.

Inconformada com a situação, ingressou com ação cautelar. No bojo da demanda, requereu a prolação de decisão interlocutória com o objetivo de participar das demais fases no certame no estágio em que ele se encontrasse. A decisão foi proferida em caráter liminar, sem a oitiva do Estado do Rio Grande do Norte, no sentido de determinar ao réu que a admitisse já na quarta fase do concurso, que era o momento do certame contemporâneo à decisão. Destaque-se que a candidata saltou a terceira fase, em que se realizaria o exame psicotécnico.

A candidata participou regularmente da quarta fase do concurso, que era o curso de formação, tendo sido aprovada com nota máxima. Após o encerramento do curso de formação, foi requerida ainda no bojo da demanda cautelar, a extensão dos efeitos da decisão liminar antes deferida para que a candidata fosse empossada no cargo de agente da polícia civil do Estado. Apenas em face dessa decisão – extensão dos efeitos da decisão judicial anterior – é que o Estado demandado interpôs o recurso cabível, agravo de instrumento, mas sem sucesso na segunda instância. A posse ocorreu em janeiro de 2002.

É de se observar que, quando da prolação da primeira decisão liminar, o concurso encontrava-se na quarta fase e o pronunciamento judicial teve o condão de aprovar a candidata apenas na segunda etapa. É dizer, por força de decisão judicial, a terceira fase do certame, exame psicotécnico, não foi cumprida pela candidata. Por conta disso, quando do pedido de extensão da decisão para fins de lhe conferir o direito à posse, a candidata apresentou laudos médicos a demonstrar a sua aptidão do ponto de vista do exame psicotécnico.

Em agosto de 2007, 5 (cinco) anos e 7 (sete) meses após a posse precária - já efetivada por meio de comando judicial provisório -, sobreveio a sentença. O pronunciamento judicial definitivo confirmou as decisões interlocutórias antes deferidas para manter a candidata no cargo com base nos seguintes fundamentos: (i) deveria ser aplicada ao caso a teoria do fato consumado, uma vez que o decurso do tempo por mais de cinco anos teria o condão de estabilizar a relação jurídica de direito material; e (ii) considerando que a candidata obteve nota máxima na prova de educação física durante o curso de formação, tal fato seria indício suficiente de que ela possuía aptidão física para o cargo, superando a querela em relação à segunda fase cujo objetivo era avaliar justamente a capacidade física do candidato.

A Procuradoria do Estado do Rio Grande do Norte interpôs recurso de apelação em desfavor da sentença a fundamentar que: (i) ela teria violado o princípio da isonomia, uma vez que todos os demais candidatos haviam se submetidos ao exame psicotécnico – terceira fase do certame - e a candidata recorrida não; (ii) segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, não seria aplicável a teoria do fato consumado a situações ilegais, injustas ou inconstitucionais.

O acordão foi proferido pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte no ano de 2009, 7 (sete) anos após a posse e o ingresso em exercício, e confirmou a sentença, desprovendo o recurso estatal e ratificando os argumentos do juízo de primeiro grau.

Ao argumento de que o acórdão violara a regra do concurso público – já que a candidata, por força de decisão judicial, havia saltado a terceira fase do certame - encartada no art. 37, I e II, da Constituição da República, bem como o princípio da isonomia, o Estado do Rio Grande do Norte interpôs recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal.

Distribuído o caso à Relatoria do Ministro Teori Zavascki, sucessor do Ministro Ayres Britto na demanda, sob o n.º 608.482/RN, o extraordinário teve a sua repercussão geral reconhecida no ano de 2012, 10 (dez) anos após a posse e o exercício da candidata.

No ano de 2014, 12 (doze) anos após a posse e o exercício da candidata, o Supremo Tribunal Federal, por maioria de 7 (sete) votos a 2 (dois), capitaneado pelo Ministro Relator Teori Zavascki, deu provimento ao recurso excepcional para tornar sem efeito a posse, mas assegurando-se os vencimentos já auferidas pela candidata recorrida. O acórdão recebeu a seguinte ementa:

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO REPROVADO QUE ASSUMIU O CARGO POR FORÇA DE LIMINAR. SUPERVENIENTE REVOGAÇÃO DA MEDIDA. RETORNO AO STATUS QUO ANTE. “TEORIA DO FATO CONSUMADO”, DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA LEGÍTIMA E DA SEGURANÇA JURÍDICA. INAPLICABILIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Não é compatível com o regime constitucional de acesso aos cargos públicos a manutenção no cargo, sob fundamento de fato consumado, de candidato não aprovado que nele tomou posse em decorrência de execução provisória de medida liminar ou outro provimento judicial de natureza precária, supervenientemente revogado ou modificado. 2. Igualmente incabível, em casos tais, invocar o princípio da segurança jurídica ou o da proteção da confiança legítima. É que, por imposição do sistema normativo, a execução provisória das decisões judiciais, fundadas que são em títulos de natureza precária e revogável, se dá, invariavelmente, sob a inteira responsabilidade de quem a requer, sendo certo que a sua revogação acarreta efeito ex tunc, circunstâncias que evidenciam sua inaptidão para conferir segurança ou estabilidade à situação jurídica a que se refere. 3. Recurso extraordinário provido.
(RE 608482, Relator(a):  Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 7/8/14, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-213 DIVULG 29/10/14 PUBLIC 30/10/14)

Durante a sessão de julgamento, os Ministros ponderaram a existência do conflito entre o princípio da proteção confiança legítima (a candidata encontrava-se exercendo o cargo por mais de doze anos de boa fé e em decorrência de decisão judicial), como face subjetiva da segurança jurídica, e o princípio constitucional do concurso público (teria havido burla à regra do concurso público, uma vez que a candidata não havia submetida à terceira fase do certame).

Foram vencidos os Ministros Luiz Fux e Luís Roberto Barroso. Os posicionamentos defendidos pelos Ministros vencidos consistiam no fato de que deveria ser observada a segurança jurídica, já a manutenção da situação jurídica por mais de 12 (doze) anos, situação está criada por decisão judicial, criou na autora a legítima confiança de que a tutela provisória já estaria estabilizada.

O Ministro Roberto Barroso, inclusive, propôs interessante tese a ser firmada em sede de repercussão geral para as demandas similares àquele objeto de julgamento: “a) a permanência no cargo por mais de cinco anos; (b) a plausibilidade da tese jurídica que justificou a investidura e a ausência de conduta processual procrastinatória; (c) decisão de mérito proferida em segunda instância.”

Segundo o voto do Ministro divergente, a permanência no cargo por mais de cinco anos como requisito para a estabilização da demanda adviria do fato de que a lei 9.784/99, ao prever no art. 54 a impossibilidade de o Estado rever os seus atos que decorrerem efeitos favoráveis ao administrado após cinco anos não é oponível apenas ao Estado-administração, mas também ao Estado-juiz.

A plausibilidade da tese jurídica é autoexplicativa: as alegações do beneficiário da tutela antecipada devem permitir um juízo verossímil em relação à verdade real. A ausência de conduta procrastinatória respeita ao fato de a parte ter agido com boa-fé no processo, deixando de criar embaraços à demanda a fim de que o processo propositalmente se arrastasse por anos a fio.

Por fim, o fato de a decisão judicial ter sido proferida por um órgão colegiado de segunda instância conferia maior seriedade ao posicionamento jurisdicional. Aplicou-se por analogia a regra prevista na lei complementar 135/10 (Lei da Ficha Limpa), que exige que a decisão judicial com aptidão a conferir inelegibilidade ao candidato seja somente aquela proferida por um órgão colegiado, ainda que sem o trânsito em julgado, conforme redação conferida ao art. 1º, I, “e”, da lei complementar 64/90.          

Em brevíssima síntese, estes são os fatos jurídico-materiais indispensáveis para o deslinde do presente estudo.

4.2 Análise crítica do julgamento

Conforme visto, nos autos do recurso extraordinário 608.482/RN, o Supremo Tribunal Federal enfrentou o tema do fato consumado, como vertente da estabilização da tutela provisória, em contraponto à inobservância da regra constante de forma expressa no Texto Constitucional. Nessa ponderação de valores, o resultado final foi no sentido de que a consumação do fato não teria o condão de estabilizar a situação jurídica em exame, uma vez que “a execução provisória das decisões judiciais, fundadas que são em títulos de natureza precária e revogável, se dá, invariavelmente, sob a inteira responsabilidade de quem a requer, sendo certo que a sua revogação acarreta efeito ex tunc”11 e tais circunstâncias demonstram “sua inaptidão para conferir segurança ou estabilidade à situação jurídica a que se refere”12.    

A partir desse julgado o meio jurídico passou a divulgar que o Supremo Tribunal Federal não admitia a teoria do fato consumado como fundamento pacificador das relações sociais13. Todavia, a nosso sentir, não se pode afirmar categoricamente que o entendimento do STF é, de fato, este.

É que, no caso em exame, a situação posta acomodava uma evidente violação à regra constitucional expressa: a decisão judicial que assegurou à candidata recorrida a participação na quarta fase do concurso, saltando a terceira (exame psicotécnico), feriu frontalmente a regra do concurso público prevista no art. 37, II, da Constituição da República. Ora, ante um flagrante inconstitucionalidade, outra não poderia ser a conduta do Tribunal Maior, senão desconstituir aquela situação jurídica ilegítima.

Em outro dizer, não foi o fato de estar ou não estabilizada a tutela provisória que serviu de fio condutor para o julgamento, mas sim a inconstitucionalidade tutelada pelo acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte.

O caso examinado, assim, não pode servir de paradigma para afirmar se o STF reconheceu ou não a possibilidade de se estabilizar a tutela provisória em face de um longo transcurso de tempo. Esta observação, inclusive, foi destacada pela Ministra Rosa Weber em seu voto: “parece-me, em primeiro lugar, que talvez este caso concreto não seja o melhor para examinar a tese trazida pelo eminente Ministro Luís Roberto, porque ela não concluiu o concurso público”14.

Além disso, o fato de a demanda ter sido uma cautelar, não desnatura o objeto da decisão, que é manifestamente satisfativa. A decisão que determina a posse de determinado candidato, por óbvio não tem por objetivo assegurar o resultado útil do processo, que é a característica própria da demanda cautelar, mas sim satisfazer o bem da vida vindicado, tratando-se, pois, de tutela eminentemente satisfativa.

5. Conclusão

A estabilidade da tutela provisória não havia recebido do legislador qualquer tratamento específico. Apesar de movimentos da doutrina, o Código de Processo Civil de 1973 não fazia qualquer alusão ao instituto. O Código de Processo Civil de 2015 mudou esse paradigma e passou a prever de forma expressa a estabilização da tutela provisória satisfativa de urgência.

Embora o ordenamento jurídico foi lacônico, determinadas situações jurídicas eram pacificadas tão somente pelo decurso do tempo. Isto é, considerando a morosidade do judiciário brasileiro em entregar a prestação jurisdicional definitiva aos jurisdicionados, diversas relações jurídicas submetidas ao crivo judicial passaram a ser regulamentadas de forma quase que definitiva por meio de decisões interlocutórias que concediam tutela provisória satisfativa de urgência.

No caso submetido a julgamento no âmbito do Supremo Tribunal Federal por meio do recurso extraordinário 608.482/RN essa dinâmica fática não foi diferente. O juízo de primeiro grau satisfez a pretensão da autora por meio de tutela provisória satisfativa de urgência e a situação jurídica foi por ela regulada durante 12 (doze) anos até que o Supremo Tribunal Federal, em julgamento definitivo, pacificasse a questão.

Debateu-se, no caso, o conflito entre a proteção da confiança legítima consagrada por meio da teoria do fato consumado e a regra constitucional do concurso público. Nessa batalha de valores e regras prevaleceu esta última. O Supremo Tribunal Federal por maioria de votos entendeu que deveria prevalecer a regra posta no Texto Constitucional em face da segurança jurídica.

Em outras palavras, talvez até mesmo pela falta de regramento específico acerca da estabilidade das tutelas provisórias, o STF entendeu que não havia justificativa para a superação da regra constitucionalmente qualificada. Superou-se a proteção da legítima confiança plasmada pela teoria do fato consumado para fazer prevalecer a regra do concurso público.

Todavia, o que se percebe é que não se pode afirmar que o julgado examinado serviu de paradigma para a fixação do convencimento do STF acerca da teoria do fato consumado. É que, no caso, o acordão recorrido violou expressamente uma regra posta de forma expressa na Constituição da República, qual seja, a regra do concurso público prevista no art. 37, II, CRFB.

Não havia embate entre dois valores legítimos: de um lado havia o princípio da proteção da confiança, como corolário do princípio da segurança jurídica, e de outro havia uma situação fática tutelada pelo Tribunal de Justiça em manifesta contrariedade ao Texto Constitucional, já que a candidata havia pulado uma das fases do concurso público. Não há dúvidas de que está última circunstância tornava a situação fática ilegítima.

Por essa razão, como bem destacado pela Ministra Rosa Weber, o caso analisado não serve como paradigma para fixação de tese no sentido de que o Supremo é contrário à teoria do fato consumado, pois, repita-se, a situação jurídica que havia sido tutela pelo judiciário até então era ilegítima: consagrava uma burla à regra do concurso público.

Se o caso tivesse julgado já sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 certamente a solução dada pelo Tribunal seria diversa. É que, como visto, a estabilização da tutela provisória satisfativa de urgência foi uma das preocupações do legislador, ao criar regramento específico sobre o tema, desde que observadas certas circunstâncias, como, por exemplo, a ausência de manifestação de irresignação da parte que sofreu os efeitos decisão.

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1 MITIDIERO, Daniel. Antecipação de tutela. Da tutela cautelar à técnica antecipatória. 2ª ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, pág. 114.

2 Idem.

3 “Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: 

I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou 

II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu. 

[...]

§ 6o A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso.” 

4 CARNEIRO, Athos Gusmão. Da antecipação de tutela: exposição didática. 7ª ed., rev., atual. e ampl., Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010, págs.

5 Idem, pág. 139.

6 FLACH, Daisson. Estabilidade e controle das decisões fundadas em verossimilhança. In Tutelas de urgência e cautelares. Estudos em homenagem a Ovídio A. Baptista da Silva. ARMELIN, Donaldo (coordenador). São Paulo: Editoria Saraiva, 2010, pág. 298.

7 ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela. 5ª ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Saraiva, 2007, pág. 24.

8 BEDAQUE, Roberto dos Santos. Estabilização das tutelas de urgência. In: Estudos em homenagem à professora Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: DPJ Editora, 2005, pág. 674.

9 Idem, pág. 660.

10 Este era o inteiro teor da proposta de alteração legislativa:

Art. 273 [...]

§ 4º A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada, fundamentadamente, enquanto não se produza a preclusão da decisão que a concedeu (§1° do art. 273-B e art. 273-C).

§ 5º Na hipótese do inciso I deste artigo, o juiz só concederá a tutela antecipada sem ouvir a parte contrária em caso de extrema urgência ou quando verificar que o réu, citado, poderá torná-la ineficaz.”

Art. 273-A A antecipação de tutela poderá ser requerida em procedimento antecedente ou na pendência do processo.

Art. 273-B Aplicam-se ao procedimento previsto no art. 273-A, no que couber, as disposições do Livro III, Título único, Capítulo I deste Código.

§ 1º Preclusa a decisão que concedeu a tutela antecipada, é facultado, no prazo de 60 (sessenta) dias:

a) ao réu, propor demanda que vise à sentença de mérito;

b) ao autor, em caso de antecipação parcial, propor demanda que vise à satisfação integral da pretensão.

§ 2º Não intentada a ação, a medida antecipatória adquirirá força de coisa julgada nos limites da decisão proferida.

Art. 273-C Preclusa a decisão que concedeu a tutela antecipada no curso do processo, é facultado à parte interessada requerer seu prosseguimento, no prazo de 30 (trinta) dias, objetivando o julgamento de mérito.

Parágrafo único. Não pleiteado o prosseguimento do processo, a medida antecipatória adquirirá força de coisa julgada nos limites da decisão proferida.

Art. 273-D Proposta a demanda (§ 1° do art. 273-B) ou retomado o curso do processo (art. 273-C), sua eventual extinção, sem julgamento do mérito, não ocasionará a ineficácia da medida antecipatória, ressalvada a carência da ação, se incompatíveis as decisões.”

11 Excerto extraído da ementa do acórdão.

12 Idem.

13 Conforme "Liminar não garante posse definitiva em cargo público, decide STF", acesso em 15 de fevereiro de 2016 às 4hs56min.

14 Excerto extraído do voto da Ministra Rosa Weber no acórdão.

Edvaldo Barreto Jr.
Advogado. Sócio fundador do escritório Barreto Dolabella Advogados. Head da Área de Direito Publicitário e Contratações Públicas. Procurador do Distrito Federal. Mestre em direito. MBA em Marketing

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