O Superior Tribunal de Justiça conheceu de agravo para dar provimento a recurso especial (AREsp 2.110.117, rel. RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, julgamento em 5/7/22) interposto contra decisão da 27ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (Apelação 1003632-16.2020.8.26.0002, rel. DAISE FAJARDO NOGUEIRA JACOT), que não conheceu do recurso por entender que a argumentação nele apresentada não guarda pertinência com a sentença, nem se contrapõe às razões de decidir, pois a recorrente se limitou a copiar o teor da petição inicial, com poucas modificações e singela adição de parágrafos iniciais e final, dedicado ao pedido recursal.
Contra a decisão, após a oposição de embargos de declaração rejeitados, a recorrente apresentou recurso especial, indicando a ofensa ao art. 1.010 do Código de Processo Civil, que contempla os requisitos necessários da apelação e não cogita de proibir a repetição de argumentos já desenvolvidos em manifestações anteriores ou mesmo a cópia de considerações precedentes. O importante, na esteira desta previsão, é que haja um combate aos fundamentos da sentença, com o que se cumpre o princípio da dialeticidade que consiste em criar um antagonismo ao que foi decidido, o que pode existir já no que anteriormente fora deduzido no processo e que não foi acolhido pela decisão, aproveitando-se, assim, o que antes se dissera.
Nessa linha de consideração, é preciso o que se encontra em Manoel Caetano Ferreira Filho, que ensina: “a pertinência das razões não deve ser analisada do ponto de vista meramente formal, como, por exemplo, verificar se o recorrente se limitou a transcrever argumentos constantes de petição anterior à sentença. Isso é irrelevante: às vezes petição anterior à sentença pode conter fundamentos que infirmem diretamente os motivos nela expostos para justificar seu dispositivo. O que importa é que as razões de apelação, ainda que simplesmente reproduza petição anterior ou apenas faça remissão a argumentos presentas em tal peça processual, enfrente e rebata os fundamentos da sentença” (Código de Processo Civil Anotado, 3ª edição, GZ, AASP e OAB/PR, 2018, pág. 1.449/1.450).
É certo que tanto se permita, pois se assegura em nosso sistema o duplo grau de jurisdição, de modo a se fazer possível reproduzir a mesma questão, na sua literal integralidade, pois há o direito de vê-la apreciada num segundo grau, mesmo se esses argumentos tenham sido já deduzidos no juízo inferior e até mesmo por ele expressamente rechaçados.
Ao especial, no caso, foi negado seguimento, sobrevindo o agravo nos próprios autos que foi conhecido, conhecendo-se, assim, o especial que foi provido. Enfatizou a decisão monocrática que o tema é pacífico no Superior Tribunal de Justiça, “no sentido de que a repetição dos argumentos trazidos na petição inicial ou na contestação não implica, por si só, ofensa ao princípio da dialeticidade, caso constem do apelo os fundamentos de fato e de direito evidenciadores da intenção de reforma da sentença”. Aduziu o relator precedentes de sua autoria e da relatoria de Nancy Andrighi e Sérgio Kikina.
Sem sombra de dúvida, não havia base de sustentação para o quanto entendeu a decisão do Tribunal Paulista, pois, além de se dever interpretar os requisitos de admissibilidade do recurso em sua estrita literalidade, de modo a não cercear o direito assegurado constitucionalmente de recorrer e ver as razões de seu recurso examinadas, é inegável que não se pode exigir do recorrente argumentos ou fundamentos novos, pois a decisão proferida sempre pode ser questionada à luz dos argumentos que se rejeitou até porque não se pode atribuir a quem decidiu o dom da infalibilidade.