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Ilegalidade do cheque caução exigida pelos hospitais em caso de emergência

Prática abusiva praticada por hospitais que pode ter consequências no âmbito cível e criminal.

25/7/2022

A exigência de cheque caução para atendimento emergencial infelizmente é uma prática muito comum em diversos hospitais particulares causando inúmeros transtornos e constrangimentos aos familiares e pacientes que se encontram em situação de vulnerabilidade e de coação psicológica.

Geralmente, as justificativas das instituições de saúde para a exigência indevida estão relacionadas a não cobertura do procedimento pelo plano de saúde e aproveitando-se da vulnerabilidade da situação, acaba exigindo um cheque caução num valor exorbitante ao usuário.

Em uma situação de emergência ou urgência não seria razoável exigir que o paciente ou os familiares pensem a respeito da proposta abusiva feita pelo hospital(preço, prazo, condições de pagamento ou até mesmo serviços desnecessários ou até inadequados) e acaba-se obrigando a essa prestação extremamente abusiva com o risco de ver o seu atual estado de saúde ser agravado.

No âmbito jurídico isso é chamado de estado de necessidade, trata-se de um vício de consentimento em que uma pessoa, em extrema necessidade, temerosa de um agravamento do seu estado de saúde ou de um familiar, aceita obrigação exorbitante, que é conhecida pela outra parte, se aproveitando desta situação para cobrar abusivamente da vítima.

Art. 156. Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa

Parágrafo único. Tratando-se de pessoa não pertencente à família do declarante, o juiz decidirá segundo as circunstâncias.

Esse tipo de conduta abusiva, inclusive pode gerar uma indenização por danos morais.

"1. Cuida-se de demanda de indenização por dano moral decorrente da exigência de pagamento antecipado e cheque caução para internação de menor com trauma craniano em UTI. O réu se insurgiu contra a sentença que o condenou ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00, sob alegação de que não houve comprovação de condicionamento da internação da paciente ao oferecimento de caução, ausência de comprovação de dano aos autores e que a situação experimentada se tratou de mero dissabor. 2. A resolução normativa 44 de 4 de julho de 2003, em seu art. 1º, veda, em qualquer situação, a exigência, por parte dos prestadores de serviços contratados, credenciados, cooperados ou referenciados das Operadoras de Planos de Assistência à Saúde e Seguradoras Especializadas em Saúde, de caução, depósito de qualquer natureza, nota promissória ou quaisquer outros títulos de crédito, no ato ou anteriormente à prestação do serviço. 3. O fato do pai ter sido informado da negativa de atendimento pelo plano de saúde somente após a indicação da necessidade de internação na UTI, não retira o caráter emergencial e condicionante do atendimento, vastamente demonstrado pela documentação juntada aos autos. 4. A negativa de cobertura pelo plano de saúde não justifica a requisição de cheque caução pelo Nosocômio, até porque a exigência de qualquer garantia para o atendimento hospitalar é expressamente vedada pela Resolução Normativa 44/03, da Agência Nacional de Saúde Suplementar. [...] 6. Comprovada a entrega de dois cheques no valor de R$ 50.000,00 cada, sendo um destinado a caução e o outro a antecipação do pagamento da internação da menor (...), caracteriza abuso de direito do hospital. 7. Por outro lado, a conduta capaz de causar abalo moral a ser indenizável é aquela que configura uma violação de direito de personalidade. Constata-se, assim, que no contexto fático em que se deram os acontecimentos narrados pelos autores, no qual, condicionou-se a internação da filha com trauma craniano à emissão de dois cheques no valor de R$ 50.000,00 cada, extrapola o mero aborrecimento experimentado nas relações contratuais cotidianas, configurando assim violação no direito da personalidade. 8. No que tange ao quantum fixado (R$ 5.000,00), o mesmo atende os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, não podendo ser considerado excessivo quando considerada a situação de vulnerabilidade dos autores frente ao hospital requerido." Acórdão 1181704, 07567520420188070016, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, 2º Turma Recursal dos Juizados Especiais Distrito Federal, data de julgamento: 26/6/19, publicado no DJE: 4/7/19.

Saiba que essa conduta é considerada crime, conforme previsto no art. 135-A Código Penal, podendo o infrator cumprir pena de 3 meses a um ano e a pena pode ser ampliada se houver agravantes como, por exemplo, o óbito do paciente.

Art. 135-A. Exigir cheque-caução, nota promissória ou qualquer garantia, bem como o preenchimento prévio de formulários administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar emergencial:

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.

Parágrafo único. A pena é aumentada até o dobro se da negativa de atendimento resulta lesão corporal de natureza grave, e até o triplo se resulta a morte.

O responsável pelo crime é quem deu essa orientação dentro do hospital, mas o funcionário que atendeu o paciente e repassou a informação também pode responder criminalmente, na medida de sua culpabilidade.

Ao ser vítima dessa conduta, além de ajuizar ação buscando a reparação, o paciente poderá fazer o boletim de ocorrência, lembrando que as áreas civil e penal são autônomas, ou seja, o fato de ser absolvida na área penal não quer dizer que seja absolvida na área civil.

Bruno Fernandes da Silva
Advogado formado pela Universidade Estácio de Sá desde 2014, aprovado no XVII exame da OAB/RJ, atuo nas áreas: cível, consumidor e direito de família

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