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A nova incorporação de conjunto de casas isoladas ou geminadas na lei 14.382

A incorporação do conjunto de casas geminadas ou isoladas veio em boa hora para dar mais uma opção segura ao desenvolvimento imobiliário e habitacional do país, aproximando o cidadão brasileiro da efetivação do direito de moradia.

25/7/2022

A nova lei 14.382 de 2022 dá destaque à modalidade de incorporação imobiliária prevista no art. 68 da lei 4.591/64 (Lei de Incorporação Imobiliária) que vem atraindo a atenção tanto dos empresários quanto dos advogados e registradores da área.

Trata-se da incorporação imobiliária para construção de conjuntos de casas isoladas ou geminadas,  prevista no art. 68 da Lei 4.591 de 1964, cuja redação foi alterada para adequação às demandas atuais. Veja-se a nova redação:

A atividade de alienação de lotes integrantes de desmembramento ou loteamento, quando vinculada à construção de casas isoladas ou geminadas, promovida por uma das pessoas indicadas no art. 31 desta lei ou no art. 2º-A da Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979, caracteriza incorporação imobiliária sujeita ao regime jurídico instituído por esta Lei e às demais normas legais a ele aplicáveis.

§ 1º A modalidade de incorporação de que trata este artigo poderá abranger a totalidade ou apenas parte dos lotes integrantes do parcelamento, ainda que sem área comum, e não sujeita o conjunto imobiliário dela resultante ao regime do condomínio edilício, permanecendo as vias e as áreas por ele abrangidas sob domínio público.

§ 2º O memorial de incorporação do empreendimento indicará a metragem de cada lote e da área de construção de cada casa, dispensada a apresentação dos documentos referidos nas alíneas e, i, j, l e n do caput do art. 32 desta Lei.

§ 3º A incorporação será registrada na matrícula de origem em que tiver sido registrado o parcelamento, na qual serão também assentados o respectivo termo de afetação de que tratam o art. 31-B desta Lei e o art. 2º da Lei nº 10.931, de 2 de agosto de 2004, e os demais atos correspondentes à incorporação.

§ 4º Após o registro do memorial de incorporação, e até a emissão da carta de habite-se do conjunto imobiliário, as averbações e os registros correspondentes aos atos e negócios relativos ao empreendimento sujeitam-se às normas do art. 237-A da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973 (Lei de Registros Públicos).” (NR)

Comentamos a seguir o texto com epígrafes para maior dinâmica.

Uma incorporação que não gera um condomínio.  Essa incorporação se distingue das demais reguladas pela lei 4.591/64. Isto porque, diferentemente da incorporação para implantação de prédio, grupo de prédios, casas ou de terrenos (lotes enquanto unidades autônomas), as casas isoladas ou geminadas que compõem o conjunto não se sujeitam ao regime condominial especial, pois são dotadas de autonomia, que assegura sua fruição independente da existência de serviços comuns ou de partes comuns que as interliguem, tendo cada uma delas acesso direto às vias públicas de circulação e outras áreas atribuídas ao domínio público.

Não obstante a inexistência do organismo social condominial, nada impede que o empreendedor ou os seus moradores organizem-se sob a forma de associação de moradores prevista no art. 36-A1 da lei 6.766.

Objeto da incorporação: comercialização de casas caracterizada pela venda de terreno vinculada à construção da unidade imobiliária. O que caracteriza a incorporação do conjunto de casas é a venda de futuras unidades imobiliárias que serão independentes - independentes porque não haverá entre elas o regime condominial, sequer áreas em comum. Na oferta pública da incorporação do novo art. 68 vende-se o lote de terreno e a futura acessão (construção) de maneira conjunta, pois ambos, terreno e construção, são integrantes da unidade imobiliária à venda na incorporação que será concretizada.

Natureza residencial ou não residencial. Embora a lei fale de casas, é sabido que toda a 4.591 ao falar de casas não se refere somente ao uso residencial, sendo admitido o seu uso também não residencial. Assim, poderá ser admitido o uso misto ou não-residencial, além evidentemente do residencial, conforme o zoneamento e demais regras municipais para tal empreendimento.

Prévio registro do loteamento. O novel artigo 68 fala que tal incorporação será sobre lotes integrantes de desmembramento ou loteamento. Por uma leitura literal, é necessário que os lotes em que tais casas serão construídas tenham sido regularmente fruto de um parcelamento do solo urbano previamente ao registro da incorporação. Pelo princípio da continuidade registral, o empreendedor, após aprovar o parcelamento, deverá registrá-lo, na forma do artigo 18 da lei 6.766/79 (Lei Federal de Parcelamento do Solo Urbano), para, em um lote ou mais oriundos desse parcelamento, desenvolver a incorporação nos moldes do artigo 68 da 4.591.

Aspecto interessante é que a incorporação poderá ser registrada na matrícula mãe do loteamento em face de parte (ou totalidade) de seus lotes, mesmo antes do Termo de Verificação de Obras emitido, o que também poderá dialogar com as disposições municipais nesse sentido.

Caso abertas matrículas dos lotes destinados à incorporação, nelas poderá ser averbada notícia mencionando a existência do registro da correspondente incorporação na matrícula mãe. Concluídas as construções, serão averbadas em cada uma das matrículas dos lotes.

Lote stricto senso?  Ainda sobre a expressão loteamento e desmembramento do texto legal do artigo 68, alternativamente, pode-se ler de maneira mais abrangente a expressão desmembramento do texto legal, para aqui também se admitir a incorporação sobre lotes frutos de um desdobro, que não tenha exigido o registro especial do art. 18 da 6.766. Não faria sentido a interpretação stricto senso, já que o desdobro é também forma de desmembramento (vide 167, II e 176, §3º ambos da Lei 6.015).

Do ponto de vista do direito imobiliário e urbanístico, a preocupação tem de ser com o atendimento das condições urbanas para tal empreendimento. O município, ao aprovar o projeto objeto da incorporação reconhece por tal ato que há os equipamentos urbanos (infraestrutura) e comunitários (caso necessário) condizentes com as casas a serem construídas, sendo portanto menos importante a forma de fracionamento da propriedade anterior para que tal incorporação se concretize (como sabido, em muitos centros urbanos há “lotes” com infraestrutura adequada que não foram objeto de loteamento e desmembramento).

Em visão mais abrangente, portanto, a expressão “lotes” poderia ser substituída por terrenos com infraestrutura aptos à futura construção (art. 2º e parágrafos da 6.766), entrecortados pelas vias públicas de acesso.

Benefícios típicos da incorporação. Por ser uma incorporação imobiliária, a atividade descrita no art. 68 poderá ser submetida ao regime do patrimônio de afetação, com o benefício ao empreendedor do regime especial de tributação (RET). Também de se admitir a possibilidade de desistência (art. 34 da 4.591) e o faseamento, lançando o empreendimento por etapas.

Novas figuras do incorporador. A lei 4.591 elenca quem pode ser o incorporador em seu artigo 31. Mas para essa modalidade há uma novidade, admitindo-se também como incorporador os empreendedores descritos no artigo 2-A da Lei Federal de Parcelamento do Solo Urbano. Com isso, se permite que o parceiro de terrenista possa ser o incorporador desses lotes, sem a necessidade de vínculo dominial cuja lógica domina o artigo 31 da 4.591. Evidentemente que, nesse caso, o parceiro precisará da procuração com os poderes adequados para a incorporação sob mandato.

Diálogo com a legislação municipal. Os municípios poderão ter normas próprias para esse tipo de empreendimento, de modo que uma única licença possa abarcar a construção de todas as casas. E mais, é possível que haja hipótese legal de um parcelamento do solo urbano com essa licença de construção, na atipicidade da competência municipal para, sob o chapéu de sua Política Urbana, regular o uso, ocupação e parcelamento do solo urbano. Isto já ocorre em diversas cidades (ex. “urbanização integrada” em Salvador e Campo Grande). Cada legislação municipal demandará uma interpretação de melhor utilização, tal qual já ocorre hoje com empreendimentos do Casa Verde Amarela (Programa Minha Casa Minha Vida) em que são contratadas casas isoladas ou geminadas.

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A incorporação do conjunto de casas geminadas ou isoladas veio em boa hora para dar mais uma opção segura ao desenvolvimento imobiliário e habitacional do país, aproximando o cidadão brasileiro da efetivação do direito de moradia.

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Esse é um segundo texto de uma série coordenada pelo autor Bernardo Chezzi sobre a nova legislação de registros públicos referente à lei 14.382/22. Confira o texto prévio, com considerações gerais de mudanças no Registro de Imóveis.

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1 Art. 36-A.  As atividades desenvolvidas pelas associações de proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos ou empreendimentos assemelhados, desde que não tenham fins lucrativos, bem como pelas entidades civis organizadas em função da solidariedade de interesses coletivos desse público com o objetivo de administração, conservação, manutenção, disciplina de utilização e convivência, visando à valorização dos imóveis que compõem o empreendimento, tendo em vista a sua natureza jurídica, vinculam-se, por critérios de afinidade, similitude e conexão, à atividade de administração de imóveis. (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)

Parágrafo único.  A administração de imóveis na forma do caput deste artigo sujeita seus titulares à normatização e à disciplina constantes de seus atos constitutivos, cotizando-se na forma desses atos para suportar a consecução dos seus objetivos. (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)

Bernardo Chezzi
Advogado, mestre pela FGV-SP, especialista em direito imobiliário, urbano-ambiental, notarial, registral e em tecnologia por diversas instituições. É fundador do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário e atual Vice-Presidente, membro do Conselho Jurídico da CBIC, assessora juridicamente a Associação dos Registradores de Imóveis de São Paulo (ARISP), da Bahia (ARIBA), atuando também como assessor jurídico do Registro de Imóveis do Brasil.

Melhim Namem Chalhub
Advogado. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário - IBRADIM, do Instituto dos Advogados Brasileiros e da Academia Brasileira de Direito Civil.

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