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Adequação de campanhas eleitorais à LGPD: uma nova realidade

Seja devido a necessidade normativa, seja para salvaguardar à segurança da campanha eleitoral, é certo que candidatos e sua equipe devem estar atentos às disposições da LGPD no pleito de 2022.

21/7/2022

Da disputa eleitoral de 2020 para a que se dará em 2022, a aplicação da lei Geral de Proteção de Dados, lei 13.709/18, passou por grande processo de amadurecimento, o que traz consequências diretas às campanhas eleitorais. Nesse sentido, desde a última eleição, as sanções previstas na LGPD entraram em vigor, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados foi constituída e a sociedade civil, empresas e tribunais perpassam por processo de aculturamento da lei.

A lei Geral de Proteção de Dados, como se depreende do próprio nome, é uma lei principiológica, que aborda diretrizes, princípios e normas gerais a respeito do tratamento de dados pessoais. Ainda que inexista uma lei específica voltada à proteção de dados no contexto eleitoral (o que está em processo de formulação na União Europeia1), as campanhas eleitorais estão sujeitas à LGPD e devem se adequar aos seus preceitos. Como disposto no art. 3° da LGPD, a lei se aplica a “qualquer operação de tratamento realizada por pessoa natural ou pessoa jurídica de direito público ou privado”. Portanto, garantir que campanhas eleitorais estejam alinhadas aos princípios e regras contidos na lei se faz elemento de grande importância para manutenção da legalidade nas atividades de tratamento de dados pessoais ali realizadas.

Está previsto no art. 10, § 4º, da resolução 23.671/21, do Tribunal Superior Eleitoral, que a LGPD deve ser respeitada “para fins de propaganda eleitoral”. No § 5º, do mesmo artigo, está disposto da necessidade de “candidatos, partidos, federações e coligações” indicarem encarregado pelo tratamento de dados pessoais. Por fim, o art. 41 dispõe que “aplica-se, no que couber, o disposto na lei 13.709/18”. Incontestável, portanto, a sujeição dos agentes de campanha ao disposto na LGPD.

Vale lembrar que o TSE, em parceria com a Autoridade Nacional de Proteção de Dados, publicou guia orientativo denominado “Aplicação da lei Geral de Proteção de Dados por agente de tratamento no contexto eleitoral2 ”. O guia, dentre outros pontos, relaciona os princípios de privacidade e proteção de dados às condutas observadas em campanhas e indica ações de mitigação de riscos a serem adotadas. As práticas apontadas no guia certamente compõem parte do que os tribunais eleitorais e a ANPD esperam das campanhas eleitorais, de modo que, mesmo sem vinculação legal, é certo que deve orientar e servir de referência para candidatos.

De todo modo, mesmo caso a adequação da campanha à LGPD ocorra apenas por obrigação legal, esta traz reflexos práticos muito positivos e que fortalecem à higidez democrática nacional. Uma campanha eleitoral adequada representa maior segurança tanto ao candidato que investe nessa prática, como ao seu eleitor.

Primeiramente, no que tange ao candidato, este se vê com menos riscos reputacionais e financeiros caso sua campanha se adeque à LGDP. Eventual vazamento de dados pessoais ou o tratamento desses sem que haja uma base legal para tal, impacta diretamente a imagem do candidato para com o cidadão. A título exemplificativo, não é raro o recebimento de mensagens de texto sugerindo o voto a determinado político e, majoritariamente, o cidadão mais se incomoda de que seu número esteja sendo utilizado sem autorização, do que passa a votar no remetente. Com a LGPD em vigor, espera-se resistência ainda maior ao envio de e-mail marketing, spams e inserção inautorizada em grupos de aplicativos de mensageria.

O tratamento irregular de dados pessoais, pode ocasionar, também, danos financeiros aos candidatos. Primeiramente, pois eles podem se tornar réus em ações, em virtude da adoção de condutas abusivas. A representação advocatícia, por si só, já é onerosa, todavia, ainda é possível que o candidato venha a ter de reparar determinado cidadão monetariamente. O candidato pode ser, também, réu em representações, diante de determinado tratamento de dados irregular em sua campanha.

Do ponto de vista do eleitor, a consonância de candidatos e suas campanhas à LGPD perpassa pela operacionalização dos direitos previstos no art. 9° da Lei. Um cidadão se sente mais seguro e confortável que seus dados sejam tratados, caso saiba que a campanha é adequada e segue diretrizes de proteção, por exemplo, com uso de senhas fortes, segmentação de acesso e adesão a sistemas de segurança em dispositivos móveis.

Campanhas eleitorais competitivas, majoritariamente, tratam dados pessoais e não se espera que candidatos deixem de assim fazer. Desde já, no período das pré-campanhas, é possível vislumbrar a judicialização da legalidade das diversas listas de correligionários e potenciais apoiadores que rondam os pré-candidatos, sem que haja consonância ao disposto na LGPD. O art. 4°, I, da Lei prevê sua inaplicabilidade quando o tratamento dos dados é realizado por pessoa natural para fins exclusivamente particulares e não econômicos. Certamente há margem argumentativa de que o uso de dados em campanhas não é contemplado por tais hipóteses, todavia este fato é apenas uma amostra da discussão que há por vir nos tribunais eleitorais.

Pleitos eleitorais hígidos são elementos imprescindíveis para fomento e manutenção da democracia de um país. Nota-se que leis de proteção de dados pessoais trazem encargos àqueles que buscam se adequar, todavia são de grande importância para aculturação, na sociedade, de práticas que tornam o tratamento de dados pessoais mais verificável e dentro do que o cidadão titular de dados pessoais espera.

Portanto, salientar aspectos normativos e vantagens competitivas ao candidato cuja campanha é alinhada aos dispositivos da LGPD é elemento importante para convencimento de que a LGPD seja posta em prática, todavia não é o ideal para fomento à aculturação de uma lei. É preciso que não só candidato, como também o eleitor, percebam o valor de uma lei que traz maior segurança e transparência ao tratamento de dados pessoais. A democracia é aspecto caro ao cidadão e, sem dúvidas, campanhas em consonância à LGPD corroboram diretamente na higidez dos pleitos eleitorais, já que, diante da adoção de medidas de privacidade e proteção de dados em campanhas, a prática passa a ser vista como referência e passa a fomentar um ambiente de competição por votos mais justo, igual e com maior autonomia de escolhas ao eleitor.

Henrique Almeida Bazan
Advogado. Sócio Bazan & Quirino Advocacia. Fellow Programa Youth Brasil.

Patrícia Henriques Ribeiro
Advogada. Juíza Titular e Ouvidora do TRE/MG. Encarregada pelo tratamento de dados pessoais e membro do Comitê Gestor de Proteção de Dados (CGPD) do TRE/MG. Professora da Faculdade Milton Campos.

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