Os cartórios são órgãos judiciais, públicos ou privados, que detém a custódia de documentos e que lhes dão fé pública, estes orgãos presumem a legalidade e veracidade desses documentos.1 Os Cartórios guardam os registros de ações e documentos, e nesse sentido, mantêm uma base de registros com informações das pessoas que realizam atos por meio de seus serviços. Sendo assim, são submetidos a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais.
O SURGIMENTO DA LGPD E A PREOCUPAÇÃO COM A SUA APLICAÇÃO
Antes da Lei Geral da Proteção de Dados (LGPD) não havia uma preocupação mais profunda com a proteção e o armazenamento desses dados pessoais, apesar de já existir a premissa do “Direito à privacidade” previsto no Art. 5°, inciso X da Constituição Federal de 1988, ele não se aprofundava na questão do tratamento de dados pessoais.
Mais adiante, houve o surgimento do Marco Civil da Internet2, que apesar de tratar com maior atenção a questão do uso da internet e trazer algumas previsões legais para o uso dos dados coletados na internet, dispondo sobre os Direitos e Garantias dos Usuários em seu Capítulo II, e se aprofundando um pouco mais que a Constituição Federal, ainda sim, havia uma lacuna enorme na proteção dos dados das pessoas físicas.
Somente com o surgimento da General Data Protection Regulation (GDPR) e a consequente promulgação da LGPD, os direitos atrelados aos dados pessoais ganharam maior importância, passando a existir artigos que estabeleceram de maneira precisa o que são dados pessoais, os quesitos para o seu tratamento - não só na internet e nos meios digitais - mas também nos meios físicos, por quaisquer pessoas jurídicas ou físicas.
Garantindo os direitos e garantias ligados ao titulares desses dados, e estabelecendo não só hipóteses para o seu tratamento, como também sanções aplicáveis aos agentes - controlador, operador e encarregado – no caso do tratamento realizado estar em desacordo com a lei.
Dessa maneira deu-se origem a um cenário de maior segurança jurídica, mas também de maior temor por parte das emrpesas públicas e privadas, que precisaram se adequar a essa nova legislação. uma vez que o disposto na lei se aplicava a ambas, como diposto no art 1° da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD):
Art. 1º Esta Lei dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural.
Mesmo a LGPD se aplicando a ambas pessoas jurídicas, ela traz algumas diferenças ao dispor do tratamento de dados realizado pelas empresas públicas e pelas empresas privadas.
OS CARTÓRIOS EXTRAJUDICIAIS E ONDE SE ENCAIXAM NA LGPD
Como exposto acima, os cartórios são órgãos judiciais, que podem ser públicos ou privados, quando privados, estes se caracterizam como Cartórios Extrajudiciais, e apesar de não serem classificados como públicos, esses órgãos ainda são regulamentados por meio de leis e seus serviços são realizados por delegação do poder público. Assim o Art. 236 da Constituição Federal de 1988 define que “os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.”
Por serem órgãos regidos pelo Poder público, eles se equiparam aos órgãos públicos, desse modo, no que diz respeito a aplicação da LPGD no tratamento de dados pessoais realizados pelos cartórios, não obedecerão como empresas privadas, mas sim como pessoas jurídicas de direito público.
O Artigo 23, Caput e § 4° da LPGD trás a previsão para esse tratamento:
Art. 23. O tratamento de dados pessoais pelas pessoas jurídicas de direito público referidas no parágrafo único do art. 1º da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011 (Lei de Acesso à Informação), deverá ser realizado para o atendimento de sua finalidade pública, na persecução do interesse público, com o objetivo de executar as competências legais ou cumprir as atribuições legais do serviço público [...]
§ 4º Os serviços notariais e de registro exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público, terão o mesmo tratamento dispensado às pessoas jurídicas referidas no caput deste artigo, nos termos desta Lei.
Como requerimento para realizar o tratamento desses dados, a LGPD determina que devem ser informadas as hipotéses em que o cartório, atuando no exercicio de sua competência, realize o tratamento. Essas informações precisam ser claras e estarem em conformidade a previsão legal, além disso, é indispensável que estas sejam exibidas em local de fácil acesso, como o site do própio cartório3.
Outra exigência é que as informações coletadas sejam compatíveis com a sua finalidade pública, e que para o seu tratamento seja indicada uma pessoa específica, este será o operador, que apenas realizará o tratamento seguindo orientações do controlador, pessoa que observará se esse tratamento está sendo feito de acordo com as normas.
Não obstante, os cartórios extrajudiciais deverão garantir o acesso do títular de dados às suas informações, garantindo seu direito de requerer alterações de informações que estejam incoretas, exclusão, anonimização e outros. Com a finalidade de assegurar os direitos fundamentais de acesso a informação e de proteção dos dados pessoais, previstos na Constituição Federal de 1988 em seu Art. 5º, incisos XIV e LXXIX. Da mesma forma deverão se reportar à Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), que os orientará sobre a maneira que a publicidade das operações de tratamento de dados será realizada.
Por fim, os cartórios ainda deverão fornecer acesso aos dados para a Administração pública, esse acesso deverá ser fornecido por meio eletrônico e atenderá a finalidade de permitir que o Poder público execute as competências legais que lhes são atribuídas e assim satisfaça o interesse público.
_____________
1 Salles, Carolina Meneghini Carvalho Matos. – Londrina : Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2018. 240 p.
2 BRAZIL, Lei 12.965, de 23 de abril de 2014.
3 BRASIL, Lei 13.709 de 14 de agosto de 2018, Art. 23, inciso I.