Nas últimas semanas, muito tem se falado a respeito do aumento dos preços dos combustíveis. Enquanto alguns atribuem o desmesurado acréscimo à inabilidade do governo Federal ao enfrentar a questão unicamente pela via legislativa, outros, por sua vez, imputam ao afamado ICMS - imposto de competência dos Estados - a insociável responsabilidade pelo aumento significativo dos preços, visivelmente praticado nos postos de combustível de todo o país.
Não fosse suficiente todo este enfoque recheado de suposições, a temática acaba ainda mais inflada pelo contexto político que comumente se instaura devido à proximidade das eleições, fazendo ecoar, de forma bastante evidente, a falta de enfrentamento eficaz da questão; algo extremamente necessário diante da multiplicidade existente na composição do preço dos combustíveis, o que, em especial, também envolve a sistemática da substituição tributária, metodologia não regular de recolhimento do ICMS e que o presente artigo pretende aclarar.
Diante desse cenário inquieto, no último dia 22 de junho foi votado e aprovado pelo plenário do Senado Federal o projeto de lei complementar (PLP) 18/22, posteriormente convertido na lei complementar 194, de 23/6/22.
Com o objetivo de reduzir os preços para o consumidor final, a referida lei complementar classificou os combustíveis como produtos essenciais, e vedou a fixação de alíquotas em patamar superior àquele das operações em geral1, mantendo o percentual máximo de 17% a 18% e afastando alíquotas mais elevadas.
No entanto, o questionamento que deve ser feito, e que, aliás, vem sendo amplamente discutido, é se referida política pública efetivamente refletirá no preço final dos combustíveis, ou seja, no valor praticado ao consumidor final, pelos estabelecimentos revendedores.
Seguindo direto ao ponto, na tentativa de equacionar a questão, o que não pode ser deixada de lado é a forma pela qual o ICMS incidente sobre os combustíveis é recolhido, surgindo, então, a complexa sistemática da substituição tributária. Referida metodologia de cobrança e de recolhimento consiste, em termos genéricos, na eleição de um terceiro, denominado substituto tributário, que apesar de não ser o praticante do fato gerador, acaba por se relacionar com este na medida em que faz parte da cadeia operacional e tributária do produto, no caso, os combustíveis.
Em se tratando dos combustíveis, e não ocorrendo a operação de importação, o substituto tributário são as refinarias da Petrobrás, as quais se incumbem da responsabilidade pelo recolhimento relativo a toda cadeia operacional e tributária que o produto irá percorrer. Para realizar o cálculo do ICMS-ST (substituição tributária), as refinarias levam em consideração o chamado PMPF - Preço Médio Ponderado ao Consumidor Final, fornecido pelas Secretarias de Fazenda dos Estados da Federação, a cada 15 dias.
O referido preço médio ponderado é composto por diversos fatores, dentre eles, a cotação do petróleo, o próprio custo para o refino, a margem de lucro na cadeia operacional de produção, assim como a concorrência e a comercialização do combustível; isto sem contar que no caso da gasolina, há o adicional de etanol, previsto pela legislação específica do setor, e cujo preço é livremente negociado entre as usinas de álcool e os distribuidores.
É possível observar, portanto, que se por um lado o PMPF influencia no preço cobrado praticado ao consumidor final, sob outra ótica, é justamente este último que, na quinzena subsequente, somado a todos os fatores acima mencionados, acabará por influenciar na composição do próprio PMPF, formando-se um círculo vicioso que em nada contribui para a redução do preço praticado junto ao consumidor final.
Em outras palavras, por mais que se pretenda com projeto de lei 18/22 estabelecer uma alíquota única com o intuito de reduzir o preço final do combustível, há de ser considerado que o ICMS-ST é calculado muito antes de o combustível chegar ao posto, bem como que o preço final ao consumidor está atrelado a fatores outros que em nada se relacionam com a alíquota do imposto praticada, como a cotação internacional do barril de petróleo, além dos custos operacionais existentes e da própria margem de lucro aplicada pelos próximos integrantes da cadeia operacional e tributária, na qual existe a possibilidade de livre negociação.
De modo comparável, a forma de cobrança do imposto Federal é completamente diferente da maneira pela qual é cobrada o imposto estadual. Os impostos Federais incidentes nos combustíveis, quais sejam, CIDE – alíquota zerada já há algum tempo -, PIS e COFINS, incidem de forma monofásica, ou seja, a tributação é concentrada no início da cadeia operacional, o que acaba por mitigar os fatores que podem elevar o preço do combustível, inerentes à sistemática da substituição tributária.
Portanto, ao cobrar o ICMS sobre uma base de cálculo variável, independentemente da alíquota a ser aplicada, é bastante razoável chegar à conclusão de que não necessariamente a limitação da alíquota contribuirá para a redução dos preços finais dos combustíveis, medida essa que provavelmente restará inócua, não alcançando o tamanho da expectativa gerada em torno da temática.
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1 Nos termos da legislação de cada Estado, a alíquota geral do ICMS varia de 17% a 18% nas operações internas.