Todo empresário experiente entende que a carga tributária é um dos fatores que mais pesam sobre o faturamento das empresas. Essa tributação é um dos motivos que dificulta as operações de importações, aparecendo como uma barreira para as empresas.
O grande volume de impostos que se faz necessário pagar para importar produtos somado à burocracia do processo, acaba atrapalhando ou até mesmo gerando desinteresse para as empresas que atuam no ramo das importações.
Um desses tributos que contribui para a alta carga é o Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços (ICMS), que possui fundamento constitucional, no art. 155, II. É um imposto que possui uma ampla abrangência de incidência, sendo esta sobre mercadoria ou bens, serviços, ainda que iniciados no exterior.
Seguindo a determinação do constituinte, o ICMS é regulado especificamente através de lei complementar, a Lei Kandir. Tal lei disciplina que a cobrança desse tributo será de competência do DF e dos Estados brasileiros.
Por isso, é um imposto de fundamental importância para a arrecadação dos Estados e do DF. Entenderemos a seguir no texto como esse imposto pode ser reduzido pelos entes federativos através da concessão de isenções tributárias ou outros institutos com a finalidade de desonerar o contribuinte.
Nesse mesmo sentido, mostraremos o que são as chamadas subvenções, qual a relação com a guerra fiscal e as discussões que envolvem esse tema.
Benefícios fiscais
A alta carga tributária no Brasil nos leva a buscar caminhos para reduzir os custos, especialmente na importação. Por este motivo, os benefícios fiscais podem ser uma saída segura e eficaz para diminuir os gastos das suas operações.
Os benefícios fiscais podem ser descritos como um regime especial de tributação, que é criado e desenvolvido pela administração pública com o intuito de fomentar o crescimento de algum setor, atividade econômica ou região em particular, oferecendo determinadas vantagens.
Assim, eles têm como fim o fomento do crescimento de determinados setores da economia ou incentivar pessoas e instituições a tomarem certas atitudes, além de estimular a economia do país.
Podendo ser utilizado para promover o crescimento de determinadas regiões, através da geração de emprego e renda.
Tem ainda a possibilidade de incentivar a produção de certos produtos que estão em falta em um determinado país em um período de tempo, a fim de reduzir os preços desses produtos.
Utilizar benefícios fiscais pode ser bom para auxiliar sua empresa a diminuir a carga tributária incidente sobre suas operações de importação, através da redução da alíquota de determinado imposto ou a redução da base de cálculo utilizada para quantificar o valor a ser pago a título de imposto.
Pode ainda ser um auxílio para melhorar a gestão financeira de sua empresa através da melhor gestão de recursos, redução de custos e melhor planejamento financeiro.
Guerra fiscal
Os Estados buscam formas de alcançar um desenvolvimento através de políticas que aumentem a arrecadação com a concessão desses benefícios, um desses episódios é a guerra fiscal do ICMS.
A CF/88 afirma a competência concorrente entre União, Estados e DF para legislar sobre assuntos tributários. Dessa forma, tanto a União quanto os Estados podem estabelecer as regras para tributação em seu território.
Os impostos são importantes para os estados pois servem para a arrecadação, podendo os estados utilizar essa quantia para desenvolver a região ou destinar investimentos para alguma atividade.
Nessa perspectiva, é muito bom para os estados terem em seus territórios empreendimentos, como grandes empresas, que paguem bastante impostos, como é o caso de indústrias.
A maior arrecadação torna possível o desenvolvimento da região para a população e, no sentido econômico, mostrar ser um estado interessante para investimentos.
No caso do Brasil, um fator relevante no quesito de desenvolvimento é a desigualdade social entre as regiões, isso se explica muito pela formação do território brasileiro.
Historicamente, algumas regiões conseguiram se desenvolver primeiramente, detendo essas a maior produção e concentração econômica, enquanto outros territórios mantiveram uma estrutura mais agrária, com pouco desenvolvimento das atividades industriais.
Em busca de conseguir atingir os mesmos níveis de industrialização, alguns estados começaram a manipular as alíquotas de determinados tributos para atrair empresas.
Esse processo de disputa entre os Estados e DF, que consiste em conceder incentivos fiscais com o intuito de atrair investimentos para seus respectivos territórios, é chamado de guerra fiscal, também conhecido como guerra das isenções.
A competição entre os Estados ocorre essencialmente em relação ao tributo estadual que incide sobre a ICMS, com a redução da alíquota desse imposto.
Isso faz com que as empresas necessitem pagar menos impostos nas operações em que há a venda de produtos, de maneira que isso é interessante para as empresas, visto que torna possível ganhar mais e despender menos dinheiro para cumprir as obrigações fiscais.
O grande problema da guerra fiscal é que em face da redução generalizada havia uma grande oferta, assim as empresas passaram a escolher os locais com melhores infraestruturas, mercado consumidor e condições oferecidas.
Mais uma vez, retornava-se ao cenário de desigualdade inicial, pois só os locais mais estruturados conseguiam oferecer ao mesmo tempo a redução de imposto e boas condições para as empresas.
No longo prazo, portanto, as batalhas da “Guerra Fiscal” passam a ser vencidas somente pelos estados mais desenvolvidos, que têm maior poder financeiro, sendo, por isso, capazes de suportar o ônus das renúncias e, ainda assim, assegurar razoável qualidade dos serviços públicos. (FERNANDES, WANDERLEI; 2000)
Para mediar essa ação, o governo interviu com a edição da Lei Kandir (lei complementar 24 de 1975) que regulamenta o ICMS e resolveu a questão da constitucionalidade dos benefícios e isenções proporcionadas pelos estados e o DF. Do mesmo modo institui um órgão que ficaria responsável pelas discussões, o CONFAZ.
Assim, vemos que a busca de empreendimentos para as regiões nesse caso tornou-se vazia, necessitando por fim de uma regulação estatal que conseguisse equilibrar a situação.
De outra forma, os estados continuaram procurando outras formas dentro do ordenamento jurídico para conseguir atingir esse desenvolvimento, com as subvenções. Falaremos a seguir mais sobre esse instituto jurídico.
Subvenção: o que é?
Subvenção é um repasse do Poder Público em forma de auxílio ou ajuda pecuniária para instituições destinada a proteger ou ajudar no desenvolvimento de atividades e produtos para a satisfação de interesses públicos.
Com efeito, a subvenção, que pode ser concedida pela União, pelos Estados e pelos Municípios, busca duas finalidades: auxiliar nos custos e despesas operacionais e fomentar o desenvolvimento de determinados setores econômicos ou regiões nos quais haja o interesse público especial.
Mostramos então o conceito doutrinário:
Juridicamente, a subvenção não tem o caráter nem de paga nem de compensação. É mera contribuição pecuniária destinada a auxílio em favor de uma pessoa, ou de uma instituição, para que se mantenha, ou para que execute os serviços ou obras pertinentes a seu objeto. Ao Estado, em regra, cabe o dever de subvencionar instituições que realizem serviços, ou obras de interesse público, o qual, para isso, dispõe em leis especiais as normas que devem ser atendidas para a concessão, ou obtenção, de semelhantes auxílios, geralmente anuais. (SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico, 15ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 779).
ATALIBA e BANDEIRA DE MELLO considera subvenção o valor pago a empresa privada desde que a mesma atue em atividade de interesse público e desde que haja previsão em lei específica nesse sentido (Apud. COÊLHO, COELHO, LOBATO).
As subvenções são reguladas pela lei 4.320/64, lei que institui as normas gerais de direito financeiro, é uma subcategoria das despesas correntes. A lei, no §3º do art. 12 da lei 4.320/64, considera subvenções como “as destinadas a cobrir despesas de custeio das entidades beneficiadas”.
Traz a lei que as subvenções podem ser de duas espécies: a) subvenções sociais - que se destinam a instituições públicas ou privadas de caráter assistencial ou cultural, sem finalidade lucrativa e b) subvenções econômicas - que se destinam a empresas públicas ou privadas de caráter industrial, comercial, agrícola ou pastoril.
A subvenção econômica está regulada no art. 18 da lei 4.320/64, segundo esse dispositivo as subvenções econômicas se destinam:
a) A cobertura dos déficits de manutenção das empresas públicas, de natureza autárquica ou não, far-se-á mediante subvenções econômicas expressamente incluídas nas despesas correntes do orçamento da União, do Estado, do Município ou do DF.
Igualmente são consideradas subvenções econômicas pelo artigo quando possuem a finalidade de:
I. A cobrir a diferença entre os preços de mercado e os preços de revenda, pelo Governo, de gêneros alimentícios ou outros materiais;
II. Ao pagamento de bonificações a produtores de determinados gêneros ou materiais.
A subvenção é gênero, que tem como espécies: o subsídio, o incentivo fiscal e, por fim, a doação. De certo, também não há como confundir subvenção e remuneração, esta diz respeito ao pagamento pela prestação de um serviço.
Por outro lado, a subvenção é o auxílio econômico público que possui a finalidade de custear, em parte, atividade de interesse público exercida por empresa privada.
Essa subvenção também pode ser classificada como subvenção de custeio e subvenção de investimentos.
As subvenções de custeio ou também chamadas de correntes, são aquelas concedidas à pessoa jurídica para que as utilize para pagar os custos da empresa, servem para o custeio e para financiar as operações. Por fazer parte das operações da empresa por lei é determinado que o auxílio seja tributado.
De outro modo, as subvenções para investimentos é o auxílio para que a empresa invista no desenvolvimento de uma atividade ou região, assim, expandindo a atividade econômica da empresa visando atingir algum interesse público do Estado, esse tipo de subvenção não é tributada.
Tributação
Mas o que determina se o valor pago à empresa privada será tributado ou não? Para entender, é importante saber que o auxílio governamental para custeio é contabilizado como receita da empresa, ou seja, que é um conceito utilizado para se referir a entrada de dinheiro na empresa, a quantia que a empresa tem disponível.
No caso das subvenções de investimento, a quantia recebida do governo fica como reserva de capital para a empresa, isto é, não estará disponível para ser usada nas operações, somente servirá como reserva para as situações que tem previsão em lei.
Sendo assim, em uma situação menos abstrata, imaginemos um pagamento de salário decorrente de trabalho. A subvenção de investimento é um valor que não será utilizado, é a quantia que ficará de reserva, que pode ser colocada em uma conta no banco, um investimento ou até mesmo nos tradicionais cofres.
Para não haver a tributação, as subvenções para investimentos fica condicionada: a. ao registro em conta de reserva de capital; b. à não distribuição aos sócios; e c. à utilização da reserva para absorção de prejuízos ou incorporação ao capital, sendo vedada a restituição aos sócios da parcela do capital eventualmente aumentada pela incorporação da subvenção (COÊLHO, COELHO, LOBATO).
Enquanto isso, o que mais se assemelha com as subvenções de custeio seria o dinheiro disponível para pagar suas contas, utilizar para o lazer ou outra atividade, mas que não será poupado. Como há a movimentação do recurso, será tributado.
A seguir, mostraremos mais diretamente a contribuição das subvenções para o investimento para as empresas.
Subvenção para investimentos: entenda mais
Em suma, as subvenções para investimentos caracterizam-se pela destinação dos recursos à empresa para que sejam aplicados em sua expansão ou para que desenvolvam novas atividades econômicas.
No que diz respeito à fundamentação, inicialmente o conceito de subvenção surge no ordenamento a partir da lei 4.320/64. As de investimentos foram conceituadas através do decreto-lei 1.598/77 que reconheceu tratar-se de subvenções também a isenção ou redução de tributos, concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos.
O decreto trouxe a definição jurídica da figura das subvenções para investimento, introduzida no ordenamento jurídico com a publicação da Lei n. 6.404 (Lei das Sociedades Anônimas), de 15 de dezembro de 1976 29, considerando-as não computáveis no lucro real da pessoa jurídica, devendo ser registradas como reserva de capital, a qual não é passível de distribuição aos sócios(BEVILACQUA; CECCONELLO, 2019).
No ano seguinte, o parecer normativo CST 112/78 trouxe o conceito de subvenções para investimentos, bem como as razões da não tributação. Dessa forma:
2.8. O DL 1.598/77, na seção dedicada ao disciplinamento dos "Resultados Não Operacionais", fez incluir no § 2º de seu art. 38 as seguintes normas sobre as subvenções:
As subvenções para investimento, inclusive mediante isenção ou redução de impostos concedida como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos, e as doações não serão computadas na determinação do lucro real, desde que:
a) registradas como reserva de capital, que somente poderá ser utilizada para absorver prejuízos ou ser incorporada ao capital social, observado o disposto nos §§ 3º e 4º do art. 19; ou
b) feitas em cumprimento de obrigação de garantir a exatidão do balanço do contribuinte e utilizadas para absorver superveniências passivas ou insuficiências ativas.
2.9. A primeira consequência que se extrai do citado art. 38 é que as Subvenções para Investimento também são tributáveis, na qualidade de integrantes dos "Resultados não Operacionais". Para não serem tributáveis, devem ser submetidas a um tratamento especial, consistente no registro como reserva de capital, a qual não poderá ser distribuída.
2.10. A segunda consequência é que Subvenções, neste caso, já não está sendo empregada de maneira ampla e genérica, tal como o foi no art. 44 da lei 4.506/64. Ao se incluir a isenção ou redução de impostos como formas de subvenção, fica patente a intenção de identificar as Subvenções para Investimento com recursos oriundos de pessoas jurídicas de direito público.
Assim, vemos que para não tributação das subvenções de investimentos deve ser registrado como reserva de capital ou que tenha a finalidade de garantir que posteriormente as subvenções serão utilizadas como auxílio nas insuficiências de recursos(ativo) ou prováveis débitos(passivo) por causa do investimento, garantindo assim o equilíbrio da empresa.
Esse parecer ainda exige que haja a efetiva e específica aplicação do auxílio nos investimentos previstos na implantação ou expansão do empreendimento econômico, com isso, será preciso comprovar o uso, não bastando somente a mera afirmação de investimento.
Outros elementos que caracterizam a subvenção segundo o parecer são: a. intenção do beneficiário de destinar a ajuda econômica para investimento; b. o beneficiário da subvenção precisa ser a pessoa jurídica titular do empreendimento econômico.
Até o momento, pode-se entender, de forma clara, que o empresário irá receber a subvenção com o objetivo de ajudar as empresas no desenvolvimento de atividades e produtos para a satisfação de interesses públicos e precisa comprovar o uso.
Normalmente, o que ocorre é que esse dinheiro que ingressa no patrimônio das empresas será destinado a outra atividade e consequentemente será tributado. Mas no caso das subvenções para investimentos, o auxílio público servirá somente para reserva.
O parecer afirma que as Subvenções para Investimento, se registradas como reserva de capital, não serão computadas na determinação do lucro real, desde que obedecidas as restrições para a utilização dessa reserva (7.1; IV). Caso seja utilizado para outro fim que não esteja disposto em lei, não será mais considerado para investimento, devendo então ser tributado.
Compreendendo as abordagens gerais, focaremos agora no tema ICMS.
LC 160/17: o que mudou?
Antes das mudanças promovidas pela lei complementar, os incentivos de redução de ICMS eram considerados como subvenções de custeio, por isso, do valor era descontado do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica, da Contribuição Social Lucro Líquido e PIS/COFINS.
A lei complementar 160 ampliou a conceituação tributária das subvenções de investimentos ao alterar o art. 30 da lei 12.973/14. Os incentivos fiscais de ICMS passaram a ser considerados subvenção de investimentos.
Assim o acresce o §4º do seguinte texto:
§ 4º Os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao imposto previsto no inciso II do caput do art. 155 da Constituição Federal, concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal, são considerados subvenções para investimento, vedada a exigência de outros requisitos ou condições não previstos neste artigo.
E de mesmo modo, o §5º:
§ 5º. O disposto no § 4º deste artigo aplica-se inclusive aos processos administrativos e judiciais ainda não definitivamente julgados.
Então, entendemos que a partir dessa lei os incentivos e os benefícios fiscais concedidos pelos estados, principalmente no contexto de guerra fiscal, passam a ser considerados subvenções de investimento.
Isso vale somente para os processos em andamento ou novos, respeita-se assim com o §5º o ato jurídico perfeito da norma anteriormente vigente, que são os casos em que já houve consumação dos atos da lei vigente à época. Esse efeito gera muitas controvérsias nos tribunais, discussão que será apresentada a seguir.
Explica a doutrina que a edição dessa lei tem fundamento em relevante interesse social e segurança jurídica com vistas a propiciar estabilidade aos incentivos concedidos no âmbito da famigerada guerra fiscal. (BEVILACQUA; CECCONELLO, 2019).
Antes da edição da Lei, já havia entendimento do STJ sobre ser indevida a incidência dos tributos sobre os incentivos fiscais. Neste ponto, é possível entender a posição jurisprudencial através da seguinte ementa do processo EREsp 1517492 / PR:
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. ICMS. CRÉDITOS PRESUMIDOS CONCEDIDOS A TÍTULO DE INCENTIVO FISCAL. INCLUSÃO NAS BASES DE CÁLCULO DO IMPOSTO SOBRE A RENDA DA PESSOA JURÍDICA - IRPJ E DA CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO - CSLL. INVIABILIDADE. PRETENSÃO FUNDADA EM ATOS INFRALEGAIS. INTERFERÊNCIA DA UNIÃO NA POLÍTICA FISCAL ADOTADA POR ESTADO-MEMBRO. OFENSA AO PRINCÍPIO FEDERATIVO E À SEGURANÇA JURÍDICA. BASE DE CÁLCULO. OBSERVÂNCIA DOS ELEMENTOS QUE LHES SÃO PRÓPRIOS. RELEVÂNCIA DE ESTÍMULO FISCAL OUTORGADO POR ENTE DA FEDERAÇÃO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO FEDERATIVO. ICMS NA BASE DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS. INCONSTITUCIONALIDADE ASSENTADA EM REPERCUSSÃO GERAL PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (RE N. 574.706/PR). AXIOLOGIA DA RATIO DECIDENDI APLICÁVEL À ESPÉCIE. CRÉDITOS PRESUMIDOS. PRETENSÃO DE CARACTERIZAÇÃO COMO RENDA OU LUCRO. IMPOSSIBILIDADE.
[...]
IX - A tributação pela União de valores correspondentes a incentivo fiscal estimula competição indireta com o Estado-membro, em desapreço à cooperação e à igualdade, pedras de toque da Federação.
[...]
XII - O abalo na credibilidade e na crença no programa estatal proposto pelo Estado-membro acarreta desdobramentos deletérios no campo da segurança jurídica, os quais não podem ser desprezados, porquanto, se o propósito da norma consiste em descomprimir um segmento empresarial de determinada imposição fiscal, é inegável que o ressurgimento do encargo, ainda que sob outro figurino, resultará no repasse dos custos adicionais às mercadorias, tornando inócua, ou quase, a finalidade colimada pelos preceito legais, aumentando o preço final dos produtos que especifica, integrantes da cesta básica nacional.
[...]
XIV - Nos termos do art. 4º da Lei n. 11.945/09, a própria União reconheceu a importância da concessão de incentivo fiscal pelos Estados-membros e Municípios, prestigiando essa iniciativa precisamente com a isenção do IRPJ e da CSLL sobre as receitas decorrentes de valores em espécie pagos ou creditados por esses entes a título de ICMS e ISSQN, no âmbito de programas de outorga de crédito voltados ao estímulo à solicitação de documento fiscal na aquisição de mercadorias e serviços.
XV - O STF, ao julgar, em regime de repercussão geral, o RE n. 574.706/PR, assentou a inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, sob o entendimento segundo o qual o valor de ICMS não se incorpora ao patrimônio do contribuinte, constituindo mero ingresso de caixa, cujo destino final são os cofres públicos. Axiologia da ratio decidendi que afasta, com ainda mais razão, a pretensão de caracterização, como renda ou lucro, de créditos presumidos outorgados no contexto de incentivo fiscal. (Grifos Nosso)
Com efeito, a decisão considerou que os incentivos e benefícios fiscais são de competência estadual, não devendo a União tributar, pois estaria descumprindo com a repartição de competências tributárias e estimulando uma competição com os Estados.
À vista disso, firmou entendimento no sentido de que a tributação do valor concedido por subvenção para que as empresas possam investir e se desenvolver economicamente não alcançaria o resultado esperado. Além do mais, compreendeu que como o valor retorna aos cofres públicos, é inconstitucional a cobrança dos tributos.
Sendo assim, essa é uma decisão muito importante para os importadores, assim como a modificação da lei complementar 160/17, uma vez que desobriga o contribuinte a pagar impostos referentes ao auxílio governamental para investimentos.
Outro ponto da lei complementar, foi que essa lei estabeleceu os requisitos e procedimentos para convilidar os benefícios fiscais concedidos por alguns estados na situação de guerra fiscal que não teve a aprovação do CONFAZ – Conselho Nacional de Política Fazendária, e estão em desacordo com o art. 155, II, § 2º, inciso XII, alínea g, da CF/88.
Com essa lei, esses incentivos, antes considerados ilícitos, passam a ser considerados expressamente como subvenção para investimento, mesmo para os processos administrativos não encerrados.
Em razão disso, a própria lei complementar 160/17, traz em seu art. 10, que todos os incentivos fiscais de ICMS são considerados subvenção para investimento, inclusive aqueles concedidos sem convênio, desde que enquadrados no contexto desta lei complementar 160, pois serão considerados benefícios fiscais validados.
Art. 10. O disposto nos §§ 4o e 5o do art. 30 da Lei no 12.973, de 13 de maio de 2014, aplica-se inclusive aos incentivos e aos benefícios fiscais ou financeiro-fiscais de ICMS instituídos em desacordo com o disposto na alínea ‘g’ do inciso XII do § 2o do art. 155 da Constituição Federal por legislação estadual publicada até a data de início de produção de efeitos desta Lei Complementar, desde que atendidas as respectivas exigências de registro e depósito, nos termos do art. 3o desta Lei Complementar.
Essa medida de convalidação dos incentivos fiscais ilícitos, isto é, concedidos sem autorização do CONFAZ, permite a regularização da situação fiscal dos Estados e reduz a guerra fiscal de ICMS, mas desde que o incentivo tenha sido concedido antes desta lei complementar.
É preciso também que atenda todos os seus requisitos para a validação destes incentivos, dentre os quais estão a publicação em Diário Oficial e o depósito no CONFAZ da legislação que concede o incentivo.
Dessa forma, as principais mudanças da lei complementar 160/17 foram a inclusão de dispositivos que afirmam que os incentivos e os benefícios fiscais são subvenções de investimento, portanto não sendo tributado e que atingiria os benefícios, ainda que eles tenham sido concedidos sem autorização do CONFAZ, proporcionando uma convalidação.
Decisões do CARF
A alteração provocada pela lei complementar 160 de 2017, que representou ruptura na jurisprudência até então formada no CARF.
Antes da lei, o órgão entendia que os benefícios fiscais concedidos ilegalmente não se encaixavam no conceito de subvenção de investimentos. A partir do processo 13116.722113/2015-07, na qual afastou a incidência de tributos sobre os incentivos e benefícios fiscais.
O caso em questão diz respeito a uma indústria do setor farmacêutico que teria se beneficiado do FOMENTAR – Fundo de Participação e Fomento à Industrialização do Estado de Goiás. Esse fundo foi implementado pela lei Estadual 9.489/84, e regulamentado pelo decreto Estadual 3.822/92.
Por meio deste, a contribuinte teria se beneficiado de um empréstimo de até 70% do valor devido à título de ICMS ao Estado, com a condição de que esse recurso fosse utilizado para expandir suas atividades na economia local.
As instâncias inferiores entenderam que o caso seria uma subvenção de custeio, devendo por isso ser tributada. Em decisão reconheceu o texto da lei complementar, considerando os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao ICMS como subvenções para investimento
[...]Cuidou de equiparar juridicamente quaisquer incentivos fiscais de ICMS convalidados pela lei complementar como subvenção para investimento, frise-se, desde que sejam de ICMS e desde que estejam no contexto da lei complementar 160/17.
No que se refere ao efeito retroativo, a 1º turma do CARF entendeu a partir do acórdão 9101-003.841, considerou que o § 5º no art. 30, da lei 12.973/14 seria aplicável aos processos pendentes, tendo aplicação retroativa imediata, abrangendo os processos administrativos em curso, sendo que os benefícios fiscais de ICMS, aprovados pelo CONFAZ, são considerados como subvenções de investimentos e devem ser excluídos da incidência do IRPJ e da CSLL.
O que se verifica ainda é que há muitos embates sobre as mudanças provocadas pela lei 160/17 e o CARF ainda mostra ter uma posição conservadora quanto a questão da tributação e da diferença entre os tipos de subvenções, de custeio e investimento.
Portanto, ao longo deste artigo é possível perceber que é um tema de grande relevância e pertinência para o direito tributário e provavelmente ainda irá gerar outros debates. Entendemos então que as mudanças legislativas possibilitam uma modificação no entendimento sobre as reduções e isenções de ICMS concedidas pelos estados, aumentando ainda mais as vantagens de se utilizar um benefício fiscal nas operações.