Migalhas de Peso

Novas perspectivas laborais e reforma trabalhista

As experiências internacionais de flexibilização das relações trabalhistas demonstram e evidenciam melhoras positivas. Buscam, então, reduzir as desigualdades e vulnerabilidades no mundo do trabalho.

24/5/2022

Breve introdução

A retomada do desenvolvimento econômico e o combate ao desemprego requerem alterações marcantes nas relações entre empresários e empregados, o que permite maior flexibilização dos direitos laborais, criando novos contratos de trabalho. Urge, assim, a necessária Reforma Trabalhista.

A lei Federal 13.467/17 encontra amparo em nossa CF/88, como veremos, e trouxe consigo a Reforma Trabalhista. Neste contexto, há, em primeiro lugar, o dever de proteção dos direitos humanos pelo poder Judiciário, inclusive, os direitos fundamentais sociais trabalhistas. Com isso, deve ser assegurado o amplo acesso a este poder por aqueles que necessitarem, garantindo decisões justas e equânimes em suas relações laborais.

Ainda não custa lembrar também da possibilidade do recurso ao instituto da arbitragem. Com razão, a arbitragem é um meio alternativo para solução de conflitos privados. Conta com um árbitro especializado, com soluções mais rápidas, com custo menor, sendo, por fim, um processo sigiloso. É, portanto, uma ferramenta alternativa que pode ser invocada em alguns casos.

Além disso, existe a necessária fiscalização e o controle das relações trabalhistas pelo MPT – Ministério Público do Trabalho, que desempenha papel fundamental diante do regime democrático e do bem-estar da sociedade brasileira.

A Reforma Trabalhista se preocupa com o aspecto social. Promove o combate ao desemprego, como dito, e reduz a informalidade, para além do discurso, beneficia condições dignas de trabalho e formas de contratação. Faz também o diálogo e efetiva a proteção social com melhoramentos nas negociações coletivas, estabelecendo melhores relações com sindicatos. Procura, portanto, trazer maior desenvolvimento e competitividade em suas relações.

Assim, a flexibilização das relações trabalhistas não traz insegurança ao trabalhador. Pelo contrário, as experiências internacionais de flexibilização das relações trabalhistas demonstram e evidenciam melhoras positivas. Buscam, então, reduzir as desigualdades e vulnerabilidades no mundo do trabalho.

Depois dessa breve introdução, caminhamos rumo às novas perspectivas de trabalho. Juntos!

Novas perspectivas laborais

Após a introdução anterior, importa trazer à tona, em primeiro lugar, a importante questão da saúde e segurança do trabalhador. Não é de hoje que se fala sobre o burnout (estresse, doença mental provocada pelo excesso de trabalho), tendo sido, até mesmo, reconhecido pela OMS – Organização Mundial da Saúde, como um distúrbio de saúde que requer atenção especial.

Sendo assim, é preciso criar canais seguros de comunicação nas empresas (segurança psicológica) para tratar do tema, de forma aberta e sem recriminação. Também relevante é promover o acesso a tratamentos médicos e psicológicos, além de atividades físicas, alimentação saudável, meditação e práticas de bons hábitos.

Neste rumo, é igualmente relevante um meio ambiente do trabalho saudável, que a empresa tenha uma cultura organizacional inclusiva, plural, diversificada e acolhedora. Deve, assim, ter uma boa acústica, sem ruídos excessivos, com qualidade sonora e, por que não, uma música ambiente agradável. As empresas devem, portanto, promover a qualidade de vida, de modo que seja possível conciliar as vidas pessoal e profissional dos trabalhadores.

Com a chegada da pandemia, as relações trabalhistas sofreram impactos consideráveis. Exemplo disto é o teletrabalho e o home office. Antes de avançarmos, porém, cabe diferenciar os dois institutos. Para isso, recorremos ao magistério de Paulo Sergio João e Natalia Biondi Gaggini (In: A importância da adequação terminológica: Home office e teletrabalho. Migalhas. 15/7/20).

O autor e a autora alertam, de início: “Nas relações trabalhistas e no direito é de extrema relevância que o termo utilizado não seja ambíguo nem vago sob pena de dar significado diverso à figura jurídica a que se refere e, consequentemente, produzir efeitos jurídicos não pretendidos ou, pelo menos, informar o interlocutor de forma equivocada” (grifos do Migalhas).

João e Gaggini, assim, elucidam: “No caso, apesar de ambos identificarem a prestação de serviços remota, o teletrabalho é modalidade de contrato, enquanto o home office é a forma de cumprimento de jornada de trabalho” (grifos nossos).

Realmente, antes disso, havia desconfianças pelos gestores acerca dessa modalidade de trabalho. Porém, o tempo nos mostrou que se trata de prática trabalhista produtiva e bem vista. Com razão, o trabalho híbrido (presencial e remoto) possibilita não só melhores condições trabalhistas com o equilíbrio entre vida pessoal e profissional, como também considerável aumento da produtividade e da obtenção de resultados. Para tanto, é necessário que as empresas fiscalizem e monitorem tais relações, além de estipularem metas plausíveis que possam ser cumpridas pelos funcionários.

Quanto ao uso das redes sociais no trabalho – antes costumava-se bloquear, hoje, porém, podem ser ferramentas extremamente úteis às empresas. Com efeito, redes profissionais como o LinkedIn, podem auxiliar, por exemplo, na realização de networking e relações com outros profissionais, pares e também clientes, além da busca por informações relevantes e esclarecimentos em consultas e conversas com contatos da sua rede. Seu uso, assim, deve ser estimulado, com moderação e bom senso.

Outro aspecto relevante se trata da economia do bico, “crowdwork” e trabalho “on-demand” – a economia do bico compreende duas formas de trabalho: o “crowdwork” e o trabalho “on-demand”, através de aplicativos.

O “crowdwork” realiza por plataformas online micro tarefas monótonas e que não exigem grande qualificação. Já o trabalho “on-demand”, através de aplicativos relaciona-se com a prática de atividades trabalhistas tradicionais, como tarefas administrativas de escritórios. Através do aplicativo, o prestador de serviço e o consumidor identificam oferta e demanda, o trabalho é realizado diante de uma necessidade trazida e é realizado o pagamento depois do trabalho.

Hoje em dia, vários países refletem acerca da obstrução ou atraso na tomada de ações preventivas ou mitigatórias depois de avisos de potenciais prejuízos à coletividade alertados por cientistas ou trabalhadores. Dois resultados imediatos podem impactar com dano a sociedade. O primeiro, o custo humano e social para tratamento de intoxicações e acidentes, por exemplo. O segundo, as ameaças, os assédios e os constrangimentos pelos quais os trabalhadores que fazem denúncias são impactados pelos autores dos danos, afetando a vida familiar desses indivíduos, o que igualmente atrapalha a comunicação de novos avisos e denúncias, retroalimentando o ciclo de adoecimento e danos (EUROPEAN ENVIRONMENTAL AGENCY, 2013).

Neste rumo, os avisos, as denúncias e os alertas realizados são denominados whistleblowing. Tratam-se, portanto, de importantes instrumentos, que procuram coibir acidentes danosos, ameaças e constrangimentos sofridos pelos trabalhadores. É importante, assim, criar canais de comunicação seguros, que permitam, em última instância, o bem-estar dos empregados.

Tendo visto algumas novas perspectivas, vamos em frente! Vejamos agora um panorama sob o enfoque internacional das relações trabalhistas.

Panorama internacional das relações trabalhistas

No âmbito internacional, as relações laborais encontram suporte e apoio nos alicerces da Declaração Universal dos Direitos Humanos, na Carta das Nações Unidas, na Carta da OEA, no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos e Sociais, na própria Carta da OMC e também na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica).

Neste sentido, vale dizer que na Constituição brasileira se encontram aspectos nevrálgicos para o entendimento da ferramenta do direito internacional, bem como das relações internacionais do Estado brasileiro, como exemplo os princípios internacionais que nosso país adota, o tipo de Estado que o Brasil se constitui, as cláusulas pétreas e o modo pelo qual os tratados internacionais passam a ter vigência em nossas terras brasileiras. (In: Carlos Roberto Husek. Curso Básico de Direito Internacional Público e Privado do Trabalho. 2015, p. 73)

Husek leciona sobre o sistema de proteção internacional dos direitos humanos. Para tanto, aponta: “Com a criação da ONU – Nações Unidas, a Declaração Universal dos Direitos Humanos pela Assembleia Geral da ONU, em 1948, os indivíduos passaram a ser o centro das atenções internacionais”. (In: Husek, idem, p. 73)

O autor, então, expõe que, além da própria ONU, com seus órgãos, constituem esse sistema diversos “tratados internacionais (convenções, declarações, pactos) [...], garantidos pela aplicação dos Estados em seus territórios e pela Justiça Internacional”. (In: Husek, idem, p. 88)

No que se refere às organizações internacionais, cabe mencionar a OIT – Organização Internacional do Trabalho. Segundo o autor, “é uma das organizações internacionais, e como tal, se insere dentro das chamadas pessoas jurídicas internacionais, criadas por intermédio de tratado internacional por vontade dos Estados)”. (In: Husek, idem, p. 90)

Deste modo, cumpre destacarmos a relevância da OIT, para a defesa dos direitos fundamentais sociais trabalhistas, na esfera internacional, servindo como guia para sua aplicação efetiva na seara interna dos Estados.

Depois dessas considerações sobre as relações internacionais trabalhistas, partimos em direção à análise constitucional dos direitos trabalhistas.

Topografia constitucional das relações trabalhistas

Após analisarmos os aspectos internacionais do direito trabalhista, vamos ver, neste momento, o prisma constitucional das relações de trabalho. Avante!

Cláudia honório aborda a Proteção ao Trabalho na Constituição da República Federativa do Brasil. (In: Em Defesa da Constituição, Primeiras impressões do MPT sobre a “reforma trabalhista”). Traremos, assim, algumas considerações sobre o assunto.

A autora lembra que a nossa CF/88 quer dizer um “marco jurídico e político pátrio” de “restauração democrática e institucionalização de direitos fundamentais” (grifos da autora).

Investigaremos agora a topografia constitucional relativa aos dispositivos de interesse.

De início, temos o art. 1º, inciso III, que defende a dignidade da pessoa humana enquanto um fundamento de nossa República Federativa. Com efeito, este fundamento é verdadeiro alicerce que orienta, guia todo o ordenamento jurídico, inclusive, as relações trabalhistas.

Nos termos do art. 1º, inciso IV, temos a procura constante da conciliação entre os valores sociais do trabalho e a livre iniciativa. Temos, assim, uma balança que busca equilibrar e concretizar os aspectos sociais e econômicos, que convivem no dia-a-dia em nossa sociedade, também no tocante às relações trabalhistas.

A seguir, temos os objetivos fundamentais da República brasileira, elencados no art. 3º, da CF/88. Dentre eles, temos a valorização da pessoa humana e o parâmetro para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, para erradicação da pobreza e da marginalização, bem como a redução das desigualdades sociais e regionais, promovendo o bem de todos, sem preconceitos de qualquer ordem, ou ainda, qualquer forma de discriminação, além da garantia do desenvolvimento nacional, o que, certamente, também se aplica às relações laborais.

Adiante, nossa Constituição Republicana sedimenta e protege os direitos fundamentais sociais, nos termos dos arts. 5º e 6º. Neste sentido, com fundamento no art. 5º, § 1º, os direitos e garantias fundamentais possuem aplicação imediata. Deste modo, em apertada síntese, quer dizer que se deve retirar de tais normas a maior eficácia possível, com o objetivo de garantir às pessoas, no caso em tela, a plena prática de seus direitos sociais trabalhistas no cotidiano, promovendo justiça social.

Conforme o art. 6º, da Constituição, temos o trabalho enquanto direito fundamental social. Além disso, temos também as disposições normativas localizadas entre os arts. 7º e 11, da Lei Suprema, todos com o fim de melhorar a condição de vida dos trabalhadores.

Neste momento, destaco o art. 170, da Carta Maior, que prescreve que a ordem econômica se baseia na valorização do trabalho humano e da livre iniciativa. Então, objetiva a todos existência digna, de acordo com os ditames da justiça social, notando, inclusive, a busca do pleno emprego, em equilíbrio, como já vimos, com as demandas do mercado.

Igualmente, o art. 193 da Lei Máxima prevê a prioridade do trabalho na Ordem Social. E também o art. 205, do mesmo diploma normativo, explicita a qualificação para o trabalho como uma das metas da educação, em paralelo com o pleno desenvolvimento do ser humano e de seu desenvolvimento para exercer a cidadania.

A autora, assim, dispõe: “Todo esse sistema de proteção normativa e valorativa do ser humano, ao mesmo tempo em que se constitui como núcleo básico de todo o ordenamento jurídico brasileiro, também produz eficácia dirigente para o Estado, de atuação para realização dos princípios, objetivos e direitos fundamentais; fixação de parâmetro de constitucionalidade material dos atos estatais; eficácia irradiante, conduzindo a interpretação das normas; vinculação dos particulares à sua observância; fixação de deveres de proteção pelo Estado; imposição de criação de organizações e procedimentos para efetividade dos direitos fundamentais em jogo”. (grifos da autora)

Diante do exame acima acerca dos olhares constitucionais sobre as relações trabalhistas, passamos, neste instante, a investigar algumas notas sobre a Reforma Trabalhista.

Notas sobre a Reforma Trabalhista

Depois de analisarmos o enfoque constitucional das relações trabalhistas, vamos trazer aqui algumas notas sobre a Reforma Trabalhista. Vejamos!

A Reforma Trabalhista promoveu várias mudanças na legislação laboral. Para mencionar algumas, mais relevantes, trago a criação de novas modalidades de contratos de trabalho, como exemplos, o do trabalhador intermitente e do autônomo; a regularização do home office; a negociação imediata de certos direitos entre empresários e empregados; a possibilidade de fracionamento de férias; a demissão convencionada e o término da contribuição sindical obrigatória, sem falar das várias modificações na legislação processual trabalhista. (in: Weigand Neto & Domingues de Souza. Reforma Trabalhista: Impacto no Cotidiano das Empresas, Trevisan Editora, 2018)

Após citarmos algumas alterações nas relações trabalhistas, rumamos em direção a breves considerações finais.

Breves considerações finais

Vivemos novos tempos. No passado, todo o arcabouço legislativo trabalhista se justificava diante das condições insalubres e exploratórias dos trabalhadores, que possuíam péssimas condições de vida e de trabalho.

Hoje, as circunstâncias e o contexto são outros. Não há mais jornadas abusivas e trabalho feminino e infantil com abusos trabalhistas. Na verdade, sabemos que, infelizmente, em certos casos, há ainda, nos tempos atuais, exploração e trabalho escravo.

Porém, isto não se aplica às relações trabalhistas costumeiras. Para estas, urge a aplicação da Reforma Trabalhista. A lei vem em boa hora, para facilitar e beneficiar as relações trabalhistas, protegendo os direitos dos trabalhadores, com acesso à Justiça, quando necessário, e pela relevante fiscalização do MPT, como vimos.

Portanto, observamos, diante do exposto, a conformidade da Lei da Reforma Trabalhista com os direitos, princípios e valores constitucionais, objetivando a tutela do trabalhador, sem prejuízo, como visto, da sua coadunação com o direito internacional do trabalho.

Para crescer economicamente e enfrentar o desemprego, o país, nossas terras brasileiras, necessita da reforma em pauta. E, por fim, mas não menos relevante, não se deve fazer uso político desse assunto em tempos de eleições. Caso contrário, se estaria fazendo mero e nocivo populismo, que prejudicaria os interesses maiores do povo e da nação brasileira.

Nicholas Maciel Merlone
Advogado | Professor na Pós-graduação do Senac & Escritor. Mestre em Direito Político e Econômico pelo Mackenzie. Bacharel em Direito pela PUC/SP. Autor de artigos, ensaios e análises.

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