Na tentativa de garantir o meta-princípio fundamental ao processo justo, o equilíbrio entre os direitos à segurança jurídica e à celeridade processual é permanentemente perquirido. Neste viés, a lei 14.195/21, em seu capítulo X, denominado “racionalização processual”, trouxe alterações ao Código de Processo Civil, a fim de acelerar a marcha procedimental.
A principal novidade se refere à citação, prevendo como preferencial sua ocorrência na forma eletrônica, alterando o art. 246 do CPC. Além disso, a decisão que determinar a citação deverá ser cumprida no prazo de 2 dias úteis, notemos o atual texto do caput:
Art. 246. A citação será feita preferencialmente por meio eletrônico, no prazo de até 2 (dois) dias úteis, contado da decisão que a determinar, por meio dos endereços eletrônicos indicados pelo citando no banco de dados do Poder Judiciário, conforme regulamento do Conselho Nacional de Justiça.
Até então, a forma mais usual de citação era a postal, com aviso de recebimento, o que envolve a confecção do mandado pelo cartório, seu envio aos correios, processamento e entrega pelo carteiro no endereço do réu, com o recebimento demonstrado pela firma aposta. Evidentemente, a citação por e-mail é muito mais ágil, acompanha a evolução do cotidiano da sociedade e atende ao distanciamento social, atualmente relevante, em razão da pandemia gerada pela covid-19.
Ainda, foi acrescentado parágrafo único ao art. 238 do CPC, para disciplinar que a citação seja efetivada no prazo de até 45 (quarenta e cinco) dias a partir da propositura da ação; inserido como dever das partes, procuradores e interessados, no rol do art. 77, inciso VII, informar e manter atualizados seus dados cadastrais perante os órgãos do Poder Judiciário; bem como previsto no inciso IX do art. 231, o dia do começo do prazo de defesa como o quinto dia útil seguinte à confirmação do recebimento da citação realizada por meio eletrônico.
Conforme a parte final do caput do art. 246, o objetivo da lei é criar um banco de dados, a ser regulamentado pelo CNJ, e nos parágrafos 5º e 6º do mesmo dispositivo menciona o compartilhamento dos endereços eletrônicos cadastrados junto ao sistema integrado da rede nacional para a simplificação do registro e da legalização de empresas e negócios (Redesim). No entanto, o banco de dados ainda não existe, pelo que impossibilitada à aplicabilidade imediata da legislação no ponto.
Em relação às empresas públicas e privadas, o texto original do §1º, do art. 246 do CPC/15, já previa o recebimento da citação eletronicamente, através dos sistemas de processos eletrônicos, razão pela qual obrigatória a manutenção de seus cadastros, excetuando as microempresas e as empresas de pequeno porte. No mesmo sentido, o §11 do art. 8º da resolução 234/16 do CNJ.
A alteração no § 1º do art. 246 realizada pela lei 14.195/21 apenas suprimiu a exceção quanto às microempresas e pequenas empresas. Logo, a Fazenda Pública, as empresas públicas e privadas, incluídas as micro e pequenas empresas sem registro no sistema da Redesim deverão ser citadas através do cadastro próprio havido no portal do processo eletrônico, enquanto as micro e pequenas empresas com registro no sistema redesim deverão ser citadas por e-mail, conforme disciplina o o § 5º do art. 246:
§ 5º As microempresas e as pequenas empresas somente se sujeitam ao disposto no § 1º deste artigo quando não possuírem endereço eletrônico cadastrado no sistema integrado da rede nacional para a simplificação do registro e da legalização de empresas e regócios.
Enviada a citação eletrônica, incumbirá a parte requerida confirmar o recebimento do e-mail no prazo de 3 dias úteis, o que inocorrendo, ensejará a realização da citação nas formas tradicionais, nos termos do § 1º-A do art. 246:
§ 1º-A A ausência de confirmação, em até 3 (três) dias úteis, contados do recebimento da citação eletrônica, implicará a realização da citação:
I - pelo correio;
II - por oficial de justiça;
III - pelo escrivão ou chefe de secretaria, se o citando comparecer em cartório;
IV - por edital.
Essa necessidade de confirmação de recebimento e a consequente citação na forma habitual, quando não acusado o recebimento, certamente compromete a almejada celeridade.
Ainda que a novel legislação determine ao réu que apresente justa causa para a ausência de confirmação do recebimento do e-mail de citação (§1º-B) e considere sua falta ato atentatório à dignidade da justiça, passível de multa de até 5% do valor da causa (§1º-C), tais medidas não são suficientes a garantir a agilidade pretendida pela lei.
De qualquer sorte, percebo a citação preferencial por e-mail como boa técnica de sumarização formal do processo, mas que ainda deverá avançar no viés da celeridade. Talvez, após a criação e funcionamento do banco de dados do Poder Judiciário, numa próxima alteração legislativa, seja interessante constituir como ato atentatório à dignidade da justiça, passível de multa, a própria falta de cadastro e não a ausência de justa causa pela não confirmação do recebimento do e-mail de citação.
1 § 1º O cadastro na Plataforma de Comunicações Processuais do Poder Judiciário é obrigatório para a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as entidades da administração indireta, bem como as empresas públicas e privadas, com exceção das microempresas e empresas de pequeno porte, para efeitos de recebimento de citações, constituindo seu domicílio judicial eletrônico, conforme disposto no art. 246, § 1º, da lei 13.105/15.