A liberdade de imprensa é um direito fundamental que visa assegurar aos cidadãos o direito à informação por intermédio das mais diversas fontes e veículos, sem que haja, em regra, interferência do Estado nesse sentido. Isto posto, depreende-se que a liberdade de imprensa se incumbe de deveres particulares, já que são empresas privadas, e, também, deveres sociais e democráticos.
Em razão disso, tal direito se encontra expressamente previsto nos art. 5º e 220 da Constituição Federal do Brasil de 1988, in verbis:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; (...)
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; (...)
XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional. (...)
Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.
§ 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.
§ 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística. (...)
Dos citados dispositivos, depreende-se, em síntese, que existe uma verdadeira preocupação do Estado Democrático de Direito em assegurar a liberdade de imprensa e, consequentemente, o direito à informação aos cidadãos.
Todavia, não se trata de direito absoluto e ilimitado, vez que estão previstos o direito de resposta e as responsabilidades dos veículos de comunicação para com a sociedade, a fim de evitar possíveis abusos no exercício do direito.
Assim, tem-se que para a democracia tal direito é de suma importância, pois garante à população o acesso às informações relevantes e verídicas e possui ligação estreita com o exercício do poder político e econômico. A informação é a base do processo democrático, afinal.
Nesta linha, o papel da imprensa no período eleitoral se mostra fundamental, eis que cabe a esta o papel de veicular as notícias relacionadas tanto a situação atual do país, quanto aos partidos políticos e seus candidatos, além de outros acontecimentos relevantes ao período eleitoral.
De tal modo, observa-se que os meios de comunicação social, ainda que busquem transmitir as informações da forma mais isenta possível, possuem grande influência na formação de opinião dos cidadãos.
Por esta razão, preocupado com a qualidade, quantidade e distribuição da informação ao cidadão em período eleitoral, visando sobretudo assegurar a igualdade entre os participantes do pleito, o legislador infraconstitucional entendeu por bem estabelecer limites e certas restrições quanto à veiculação de notícias referentes aos candidatos e partidos políticos.
Neste vértice, acertadamente salientou o doutrinador Fávila Ribeiro (1998):
Devem os meios de comunicação ser tratados como Poder Social, como efetivamente o são, não podendo ser comparados com o homem no exercício de sua liberdade individual. Não há poder, como tal, que possa prescindir de controle, deixando ao vácuo o sistema de defesa dos interesses coletivos, pois é próprio de sua natureza expandir-se o quanto seja tolerado, e se o controle não for aplicado, na justa medida e com presteza, o clima de irresponsabilidade se instaura, testemunhando a inocuidade da ordem jurídica, corrompida pela complacência à impunidade (RIBEIRO, 1993, p. 48).
Referida regulamentação se encontra expressa no Capítulo V da Resolução 23.610/19, que dispõe sobre a propaganda eleitoral, utilização e geração do horário gratuito e condutas ilícitas durante a campanha eleitoral. A saber:
Art. 42. São permitidas, até a antevéspera das eleições, a divulgação paga, na imprensa escrita, e a reprodução na internet do jornal impresso, de até 10 (dez) anúncios de propaganda eleitoral, por veículo, em datas diversas, para cada candidata e candidato, no espaço máximo, por edição, de 1/8 (um oitavo) de página de jornal padrão e de 1/4 (um quarto) de página de revista ou tabloide (lei 9.504/97, art. 43, caput).
§ 1º Deverá constar do anúncio, de forma visível, o valor pago pela inserção (lei 9.504/97, art. 43, § 1º).
§ 2º A inobservância do disposto neste artigo sujeita as pessoas responsáveis pelos veículos de divulgação e os partidos políticos, as federações, as coligações ou as candidatas e os candidatos beneficiadas(os) à multa no valor de R$1.000,00 (mil reais) a R$10.000,00 (dez mil reais) ou equivalente ao da divulgação da propaganda paga, se este for maior (lei 9.504/97, art. 43, § 2º). (Redação dada pela Resolução 23.671/21)
§ 3º Ao jornal de dimensão diversa do padrão e do tabloide, aplica-se a regra do caput deste artigo, de acordo com o tipo de que mais se aproxime.
§ 4º Não caracterizará propaganda eleitoral a divulgação de opinião favorável a candidata, candidato, partido político, federação ou coligação pela imprensa escrita, desde que não seja matéria paga, mas os abusos e os excessos, assim como as demais formas de uso indevido do meio de comunicação, serão apurados e punidos nos termos do art. 22 da Lei Complementar no 64/1990. (Redação dada pela Resolução 23.671/21)
§ 5º É autorizada a reprodução virtual das páginas do jornal impresso na internet, desde que seja feita no sítio eletrônico do próprio jornal, independentemente do seu conteúdo, devendo ser respeitados integralmente o formato gráfico e o conteúdo editorial da versão impressa, atendido, nesta hipótese, o disposto no caput deste artigo.
§ 6º O limite de anúncios previsto no caput deste artigo será verificado de acordo com a imagem ou o nome da(o) respectiva(o) candidata ou candidato, independentemente de quem tenha contratado a divulgação da propaganda.
Art. 43. A partir de 6 de agosto do ano da eleição, é vedado às emissoras de rádio e de televisão, em sua programação normal e noticiário: (...)
II - veicular propaganda política;
III - dar tratamento privilegiado a candidata, candidato, partido político, federação ou coligação; (...)
Dos citados dispositivos, extrai-se, em síntese, a disciplina da divulgação da propaganda eleitoral, contendo suas possibilidades e limitações, a fim de garantir uma disputa igualitária e delimitar os direitos dos candidatos e dos meios de comunicação.
Assim, a fim de evitar vantagens econômicas e quaisquer influências de partido ou candidato, a legislação prevê a propaganda eleitoral gratuita nas empresas de rádio e televisão, proibindo a propaganda eleitoral e partidária paga nesses meios.
Ademais, em recente discussão o STF decidiu, por maioria, pela manutenção da proibição da propaganda eleitoral paga na internet, além de impor limitação à publicidade eleitoral em impressos (art. 42, caput da Resolução 23.610/19).
Resta clara, portanto, a preocupação da legislação eleitoral com eventual desequilíbrio na disputa. Isto porque, levando-se em consideração o imenso potencial de convencimento que a imprensa possui frente à população consumidora das notícias, evidentemente a veiculação exacerbada de propagandas tanto positivas quanto negativas de determinados candidatos e partidos poderia influenciar o resultado das eleições de forma injusta.
Nesse sentido, disserta Suzana de Camargo Gomes (1998):
É inegável que a propaganda é uma das formas de liberdade de expressão, de liberdade de pensamento, pelo que representa um direito a ser resguardado, mas, por outro lado, ergue-se também o direito dos cidadãos, dos eleitores no caso específico em tela, de serem protegidos contra métodos falsos de induzimento e persuasão, que possam levá-los à adoção de comportamentos distorcidos (GOMES, 1998, p. 174-175).
[...] não se trata de censura prévia a coibir a propaganda que apresente um nítido conteúdo nocivo à sociedade, mas de um controle de molde a evitar, sempre que possível, os exageros e o cometimento de infrações eleitorais, sendo que os excessos praticados nessa área ensejarão responsabilidade, inclusive criminal, com apuração perante a Justiça Eleitoral. (GOMES, 1998, p. 177)
Em outras palavras, verifica-se grande preocupação da Justiça Eleitoral para com eventual “manipulação das massas”, a favorecer determinado candidato ou partido, por intermédio dos veículos de comunicação, provocando o total desequilíbrio da disputa. Portanto, o que se tem é a verdadeira harmonização dos princípios fundamentais em relação ao processo eleitoral.
Deste modo, tem-se completamente viável a relativização do direito de imprensa no período eleitoral, vedando, em algumas situações, a propaganda eleitoral paga, já que tal liberação caracterizaria uma vantagem para os partidos detentores das maiores verbas e feriria diretamente a igualdade de disputa.
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GOMES, Suzana de Camargo. A justiça eleitoral e sua competência. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.
Limites constitucionais ao exercício da liberdade de imprensa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3445, 6 dez. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23177. Acesso em: 22 abr. 2022.
Resolução 23.610, de 18 de dezembro de 2019. Disponível em: https://www.tse.jus.br/legislacao/compilada/res/2019/resolucao-no-23-610-de-18-de-dezembro-de-2019. Acesso em 22 abr. 2022.
RIBEIRO, Fávila. Abuso de poder no direito eleitoral. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993.
SOARES, Marcos Antônio Striquer. Delimitação dos princípios básicos para a realização de propaganda eleitoral com vistas ao aperfeiçoamento da democracia. Revista de Direito Público. Londrina, v. 5, n. 2, p. 123-140, ago. 2010.