Antes de adentrar na análise da decisão em si, importante registrar o papel exercido pelo TCU no controle das agências reguladoras. A transferência da prestação de serviços públicos para a iniciativa privada confere ao TC o poder de fiscalização dos seus atos e controlar o cumprimento das leis e das orientações do poder competente1.
Cabe ao TCU avaliar as concessões em dois períodos: 1) na realização dos processos de outorga e 2) na execução contratual. Na fase de execução contratual se avalia o cumprimento das cláusulas contratuais, especialmente a qualidade dos serviços prestados, os investimentos e a tarifa praticada.
Nesse aspecto, em análise de uma representação proposta pela unidade técnica competente, o TCU encontrou falhas no contrato de concessão da BR-163 e determinou que a ANTT - Agência Nacional de Transportes Terrestres instaure processo administrativo para apurar o período que a concessionária passou a cobrar pedágio dos usuários2.
Na decisão, o TCU verificou que a ANTT permitiu a cobrança de pedágio antes que a concessionária tivesse concluído todas as obrigações do contrato. Nos termos contratuais, a concessionária não poderia cobrar pedágio sem cumprir algumas obrigações, como adotar medidas de segurança, realizar melhorias na via e entregar, nessa 3ª etapa, ao menos 10% da extensão total das obras de duplicação previstas no PER - Programa de Exploração da Rodovia.
Em vistoria in loco, a corte de contas verificou que faltavam itens básicos de segurança, problemas estruturais, falta de sinalização, entre outros fatores que impediriam o início da cobrança do pedágio. Mesmo assim, a ANTT autorizou o início da cobrança.
Na prática, gerou uma antecipação indevida da cobrança de pedágio em favor da concessionária e, por esse motivo, o TCU determinou o ressarcimento dos valores auferidos entre a data do início da cobrança de pedágio e a data em que as obras de duplicação foram efetivamente concluídas. Esse ressarcimento deve reparar o prejuízo causado aos usuários da concessão em decorrência da inobservância das cláusulas contratuais pactuadas.
Segundo o acórdão, em 2015 a concessionária arrecadou de pedágio o montante de R$ 122.414 mil3. Como a ANTT aprovou o início do pagamento do pedágio em 6/9/15, estima-se que para cada dia antecipado de cobrança de pedágio, os usuários da rodovia pagaram indevidamente para essa concessionária valor superior a R$ 1.000.000,00.
Verificada a existência de um desequilíbrio econômico-financeiro no contrato, vez que duplicação não foi concluída pela concessionária, a ANTT deve proceder com o reequilíbrio contratual, de modo a reverter os valores indevidamente cobrados pela concessionária antes da efetiva conclusão das obras de duplicação em 10% da extensão.
Além disso, o TCU também determinou à ANTT a realização de outro reequilíbrio econômico-financeiro, pois, previamente à assunção da rodovia, já havia trecho com múltiplas faixas e isso foi aproveitado pela concessionária para a redução de seus encargos.
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1 Vide Acórdãos 1.756/2004, 1.369/2006, 620/2008 e 2.010/2013 do plenário
2 https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/#/documento/acordaocompleto/*/NUMACORDAO%253A457%2520ANOACORDAO%253A2022%2520COLEGIADO%253A%2522Plen%25C3%25A1rio%2522/DTRELEVANCIA%2520desc%252C%2520NUMACORDAOINT%2520desc/0/%2520
3 Vide https://www.antt.gov.br/documents/359170/71ad347b-87dc-be38-782f-12a4d12ab2b4