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A importância da formação do profissional de compliance

É fundamental que os interessados pesquisem e se informem sobre a qualidade e a reputação, tanto da instituição que ofereça cursos de formação e capacitação de profissionais de compliance, como do corpo docente que ficará encarregado das respectivas disciplinas e módulos de ensino.

18/3/2022

(Imagem: Arte Migalhas)

Conforme amplamente divulgado, no mês passado foi promulgada a EC 115, que incluiu o inc. LXXIX, no art. 5º, da Constituição Federal, assegurando a proteção de dados pessoais, inclusive dos meios digitais, como direito fundamental. Ademais, ela atribuiu à União as competências para organizar e fiscalizar a proteção e o tratamento de dados pessoais, nos termos da lei geral de proteção de dados (lei 13.709/18 ou LGPD).

Dessa forma, com a constitucionalização da proteção de dados e o seu status de cláusula pétrea, o papel do compliance1 se torna mais do que necessário. Isso porque, a ausência de um programa de compliance para assegurar o adequado tratamento de dados e prevenir os riscos de vazamento ou uso indevido por pessoas naturais e jurídicas que se enquadrem na LGPD poderá acarretar graves prejuízos.

Ao lado desse setor, o compliance se apresenta como igualmente necessário em outras áreas de atuação empresarial, notadamente onde existam riscos decorrentes das atividades econômicas. Cite-se, por ex., a prevenção de lavagem de dinheiro no sistema financeiro nacional, a evitação de comportamentos anticoncorrenciais, a tutela do meio ambiente, a segurança do trabalhador e do consumidor, a prevenção dos riscos de corrupção, dentre outros.

No setor público, o compliance ou integridade2 também é uma realidade, como se pode verificar das recentes resoluções administrativas dos poderes públicos. Cite-se, por ex., a Resolução 757, de 15/12/21, que instituiu o Programa de Integridade do STF Tem-se como propósito implementar um conjunto de medidas e ações institucionais sistematizadas voltadas para a prevenção, detecção, punição e remediação de irregularidades administrativas, condutas ilícitas e desvios éticos naquele Tribunal.

Diante de tantas transformações, todas convergindo para a adoção e o aprofundamento do compliance no país, é dever do meio acadêmico e científico preparar o público interessado para esta nova realidade. Com efeito, de pouco vale avançarmos com importantes mecanismos normativos que consagram, direta ou indiretamente, os programas e planos de compliance, se não ocorrer o devido treinamento e qualificação dos profissionais que irão atuar nos diversos setores onde ele se faz presente.

Dessa forma, além do problema atinente aos chamados compliance de “fachada” ou “cosmético” – consistente na criação de um programa apenas “no papel”, como um marketing empresarial, sem que isso implique em mudanças nas práticas deletérias –, soma-se o problema dos pseudos “especialistas” que se arvoram a ministrar aulas e treinamentos sobre compliance, quando, na verdade, não têm a devida qualificação para tanto.

Ao lado do desperdício de tempo e de dinheiro, mal investidos em cursos de duvidosa credibilidade – veiculados nas redes sociais –, os alunos mal instruídos no tocante ao conteúdo, aos pilares, às finalidades e aos efeitos dos programas de compliance, dificilmente conseguirão uma boa colocação no mercado de trabalho, associando-se, a isso, o risco de serem agentes replicadores de informações equivocadas sobre a temática, em uma espécie de espiral negativa.

Portanto, é fundamental que os interessados pesquisem e se informem sobre a qualidade e a reputação, tanto da instituição que ofereça cursos de formação e capacitação de profissionais de compliance, como do corpo docente que ficará encarregado das respectivas disciplinas e módulos de ensino. 

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1 Compliance pode ser definido como sendo o conjunto de medidas de autocontrole e de autovigilância, adotadas por empresas e organizações públicas, consoante as diretrizes fixadas na lei em sentido amplo, para que seus dirigentes e funcionários cumpram com as normativas, tanto internas como externas, com o objetivo de se evitar a ocorrência de infrações de diversas ordens, inclusive as de natureza criminal. O compliance também compreende os protocolos de investigação de infrações já ocorridas, sancionando-se, internamente, os seus responsáveis, bem como comunicando tais ocorrências aos órgãos fiscalizadores estatais. Dentre as diversas medidas inerentes aos programas de compliance, figuram: (1) a implantação de códigos de ética e políticas de boa-governança, (2) a avaliação dos riscos empresariais, (3) o estabelecimento do oficial de compliance, e (4) a disponibilização do canal de denúncias aos empregados e ao público externo. (SOUZA, Artur de Brito Gueiros. Direito Penal Empresarial: Critérios de atribuição de responsabilidade e o papel do compliance. São Paulo: LiberArs, 2021, p. 76-77).

2 Sobre a questão terminológica – compliance, conformidade ou integridade –, vide SOUZA, Artur de Brito Gueiros. Op. cit., p. 73 e segs.

Artur Gueiros
Professor titular de direito penal da UERJ. Coordenador do curso de compliance do CEPED. Procurador Regional da República e coordenador acadêmico do CPJM. Escritório/Empresa: Centro de Estudos e Pesquisa no Ensino do Direito - UERJ.

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