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Eleições 2022 – Um trabalho de futurologia

A volta da propaganda partidária pleiteada pelo Congresso mostra que TV e rádio ainda têm fundamental papel na consolidação de imagens, mas o próprio TSE já tenta desenhar melhores regras para o ambiente virtual no período de campanhas.

3/3/2022

(Imagem: Arte Migalhas)

Em fins de dezembro, o time de Relações Institucionais e Governamentais do Di Blasi, Parente & Associados realizou um webinário exclusivo a seus clientes com a jornalista Patricia Blanco, membro do conselho editorial da Folha de SP e CEO da Palavra Aberta, onde abordou-se tendências para as eleições 2022. Patricia mencionou algo extremante relevante na ocasião: “as eleições de 2018 nunca terminaram”. Com essa afirmação, reitera que nosso atual presidente governa em tom de campanha e, por isso também, observamos ao longo desta administração atitudes comuns ao pleito eleitoral: planos de governo baseados em curto prazo (manchetes), grande esforço empenhado em comunicação direta com eleitores e o sempre presente embate com qualquer oposição.

Em se tratando de política brasileira, já dizia o famoso slogan da rádio Bandnews – “em 20 minutos tudo pode mudar” – e, por isso, acreditamos que qualquer esforço em tentar prever resultados para esta campanha eleitoral é um exercício de futurologia. Aqui, apesar do Oxford English Dictionary traçar os primeiros vestígios de uso (em inglês) da expressão "futurista" em 1842, utilizaremos a definição cunhada pelo professor naturalizado alemão Ossip K. Flechtheim na década de 40, propondo-a, à época, como uma nova ciência da probabilidade. Nesse sentido, buscaremos ressaltar as principais probabilidades eleitorais do atual ano, tanto no Executivo quanto no Legislativo.

Tendências no Executivo

No último pleito eleitoral, presenciamos uma polarização muito grande entre simpatizantes por um modelo de uma “nova política” que rechaçasse o então status quo – velhos políticos perpetuando casos de corrupção seja ativamente ou coniventemente.  Jair Bolsonaro foi eleito justamente como personificação de uma nova política. A polarização de então permanece como tendência, mas hoje está sob uma ótica distinta.  A diferença entre nova e velha política se funde e abre espaço para uma polarização já conhecida do eleitorado, esquerda e direita, estampada nas recentes pesquisas eleitorais que destacam Lula e Bolsonaro como candidatos com maiores intenções de voto (mas também, com índices de rejeição bastante altos). Lula, apesar de ter sido alvo central de um dos maiores escândalos de corrupção da política brasileira, com mais de US$ 1,3 bilhão bloqueados no exterior em acordos internacionais, detém ao seu lado o apoio de grande parte da população que sofre com os impactos econômicos da pandemia, em especial no Nordeste brasileiro. Já Bolsonaro, criticado também por esquemas envolvendo rachadinhas em gabinetes e criticado por sua condução das crises, segue apoiado pelo eleitor “bolsonarista raiz” e evangélicos. A denominada “terceira via” atualmente ainda se encontra extremante pulverizada, com representantes dos mais diversos matizes políticos, que varia de novos entrantes como o do cientista político Luiz Felipe D’Avila e o ex-juiz Sérgio Moro, a políticos mais conhecidos como Ciro Gomes e João Doria. Desta forma, dificulta-se ainda mais sua consolidação, de fato, como uma opção viável ao populismo de esquerda ou de direita.

Outra forte tendência é a utilização do candidato a vice como peça política chave ao longo do processo eleitoral, à luz de Kamala Harris nas eleições presidenciais americanas, ou no papel apaziguador de José Alencar nas eleições de 2002 e de 2006 na chapa com Lula. Seja qual for o candidato, essa eleição será denominada pelo protagonismo dos vices e como estes poderão agregar ao nome principal da chapa. Ele (ou ela) terá papel fundamental para trazer confiança, apaziguar relações com o Legislativo e com a sociedade, agregando mais chances para a vitória nas urnas em outubro.

Tendências no Legislativo

O embate entre representantes da chamada velha política e aqueles que não se veem representados pelo sistema político atual se repete no Legislativo como tendência.

Esse choque tem desvantagens claras entre as partes, sendo a principal delas o acesso à recursos financeiros. Os ‘outsiders’ põem dinheiro do próprio bolso, realizam vaquinhas, mas têm pouco acesso aos bilhões do fundo eleitoral aprovado para o pleito deste ano. A exceção se dá para aqueles que podem ser bons puxadores de votos, como agentes da mídia e da TV.

Outro tipo de conflito que já começa a aparecer é quanto aos espaços dentro das legendas maiores ou com mais recursos do fundo eleitoral. Enquanto membros tradicionais de tais partidos pleiteiam a manutenção das suas candidaturas com amplo acesso à tais recursos, novos entrantes também esperam visibilidade e apoio financeiro. Um caso emblemático é o do Partido Liberal, nova legenda do presidente Jair Bolsonaro, que tem entre seus quadros políticos tradicionais e históricos, além de reconhecidos puxadores de votos, como o deputado Federal Tiririca. Com a chegada do presidente e de sua tropa, há o receio de que esses novos membros possam “roubar” os assentos já consolidados, dado que muitos foram eleitos com grande contingente de votos no pleito de 2018.

Essa reconsolidação de partidos mais tradicionais é também um destaque frente ao que aconteceu nas eleições de 2016 e 2018, quando partidos pequenos receberam nomes que acabaram conquistando cadeiras nos diferentes níveis federativos, tanto no Executivo quanto no Legislativo. Esse reposicionamento se deu, em parte, por conta das cláusulas de barreira, que limita recursos e espaços midiáticos para partidos que não atingissem determinada quantidade de votos e/ou cadeiras nas vagas legislativas. Mas também se deve ao fato daqueles que foram eleitos por tais partidos perceberem que o xadrez político se transforma o tempo todo e, para terem a mesma visibilidade inicial, precisariam estar em partidos com recursos, tempo de mídia (TV e rádio) e maior capilaridade.

Uma tática desses partidos nanicos para atrair novos quadros e se reposicionar no jogo foi mudar os seus nomes, retirando a palavra “partido” deles. A tentativa de passar a ideia de serem movimentos dissonantes daquilo que parece representar algo pejorativo não funcionou muito bem para eles, muito por conta de não terem identidade e de os entrantes não necessariamente pactuarem com os preceitos do partido e de seus pares afiliados. A tática, porém, foi incorporada por alguns partidos maiores, com objetivo similar, mas aí também tentando apagar certas lembranças da mente do eleitorado.

Além disso, nas eleições deste ano teremos a formalização das Federações Partidárias, mecanismo encontrado por deputados de legendas menores para sobreviverem ao rigor da cláusula de barreira. Ao contrário das coligações, essa nova fórmula exige que partidos se unam para os pleitos eleitorais, mas que tal parceria seja mantida durante os 4 anos de mandato. Com isso, as federações terão que ter um estatuto próprio, com regras claras sobre fidelidade partidária e sanções para aqueles que não seguirem orientações, como as de votação.

As Federações, para alguns, são um movimento anterior ao da fusão de partidos. Entre os partidos de esquerda, há uma tentativa de se formar uma federação com um número maior de legendas, das pequenas às maiores. Já alguns partidos de centro e centro-direita têm buscado selar parcerias que envolvam um partido pequeno e um grande. Não são aparentes ainda discussões entre partidos que compõem o chamado centrão. Essas legendas, por buscarem se alinhar mais à governos do que à conteúdos programáticos ou ideologias, preferem certa independência, até por contarem com satisfatório número de votos e cadeiras nos legislativos estaduais e Federal.

Na esfera Federal, os partidos tradicionais, federados ou não, continuarão exercendo o papel controlador que conquistaram no presente mandato. Não restam dúvidas de que a dependência do Executivo com o Congresso aumentou e a tal “governabilidade” é conduzida cada vez mais por esses grupos. Não há indicativos, conforme o que foi apresentado até hoje, de que haverá mudanças substanciais na distribuição de cadeiras legislativas, principalmente quanto às legendas que compõem o Centrão, que com os recursos vultosos do fundo eleitoral aprovado para estas eleições, até projetam o seu crescimento. Por isso, candidatos ao Executivo Federal à esquerda e à direita têm se preocupado em ter nomes aliados, pelo menos, no Senado Federal, casa com menor número de integrantes e que pode balizar essas relações, ainda que também tenha o seu preço.

Conclusões

Os partidos tradicionais retomaram sua força e terão nesse ano candidatos fortes para cargos nos Poderes Executivo e Legislativo, em estados e na esfera Federal. Ainda que para o legislativo as disputas internas possam crescer por conta do número inflado de nomes que foram para essas legendas em busca de recursos do fundo eleitoral, essas agremiações tendem a continuar ditando boa parte das regras do jogo governamental.

O que ainda não se sabe é como serão as campanhas caso perdure esse cenário pandêmico, já que somente eleições municipais ocorreram sob essas circunstâncias e, mesmo cidades grandes, oferecem maior proximidade entre candidatos e eleitores. Em disputas para cargos estaduais e federais, são longos percursos, agendas e pontos no mapa a serem visitados. Se não for possível que isso ocorra plenamente, conseguirão os candidatos, principalmente aos cargos de deputado e senador, transferir essas batalhas para o meio digital? Nomes mais tradicionais e mais acostumados ao corpo-a-corpo saberão surfar na onda das redes? E caso esse cenário se firme, será o suficiente para mudanças importantes nas composições das Assembleias e do Congresso?

Essas reflexões específicas nos levam para aquelas relacionadas ao poder dar mídias tradicionais versus novas mídias para campanhas eleitorais. A volta da propaganda partidária pleiteada pelo Congresso mostra que TV e rádio ainda têm fundamental papel na consolidação de imagens, mas o próprio TSE já tenta desenhar melhores regras para o ambiente virtual no período de campanhas.

A aposta é alta, tanto de partidos quanto do órgão eleitoral, pois, para o primeiro grupo, não há clareza se as novas tecnologias vão impactar negativamente em suas campanhas, não sabendo se os esforços de propaganda tradicional serão equivalentes. Já pelo lado do TSE, a incerteza é quanto a sua real capacidade de monitorar, fiscalizar e tomar medidas para aquilo que possa atrapalhar o equilíbrio eleitoral em um ambiente que, mesmo provido de regras, permite a reincidência e replicação de táticas de forma rápida, imediata e deixando poucos rastros.

Raquel Araujo
Head de Relações Institucionais e Governamentais no Di Blasi, Parentes & Associados.

Guilherme Lemes
Especialista em Relações Institucionais e Governamentais no Di Blasi, Parentes & Associados.

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