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Acórdão do TJ/SP reverte sentença por ausência de prova pericial demonstrando violação a dispositivo do Ibama

É de extrema importância que um trabalho de adequação às normas administrativas seja realizado e mantido constantemente atualizado, especialmente no que toca a normas e regulamentos regionais.

14/2/2022

(Imagem: Arte Migalhas)

Em acórdão proferido no dia 10 de janeiro, a 2ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo decidiu por absolver pescador que teria se utilizado de instrumentos proibidos, conduta prevista como crime no art. 34, parágrafo único, II, da lei 9.605/98 (Apelação Criminal 1500150-16.2020.8.26.0515).

Embora se trate de processo em face de um indivíduo, o precedente apontado na decisão traz à tona discussão de extrema importância que, segundo nosso entendimento, repercute também para empresas – que podem ser processadas por crime ambiental – e empresários. Isso porque o fundamento da decisão foi a ausência de comprovação de violação de norma complementadora de norma penal em branco, assim chamados os tipos penais que têm sua conduta complementada por outra norma, geralmente de natureza administrativa, como é o caso de boa parte dos crimes ambientais.

Neste sentido, o acórdão do TJSP aqui discutido se fundamentou na ausência de materialidade da conduta, visto que não houve comprovação, por meio de perícia, de que o instrumento utilizado pelo pescador era proibido pela normativa do Ibama que regula esse tema, especificando quais são os “instrumentos proibidos”, tais como uma determinada rede, arpão etc.

Entendimento semelhante se aplicaria, entre tantos outros exemplos, ao crime previsto pelo art. 54 da Lei de Crimes Ambientais, que tipifica a conduta de causar poluição “em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora”. A imputação desse crime, muito comumente dirigida a empresas, depende necessariamente da indicação do dispositivo que define o limite de poluição permitido, e qual o parâmetro que ensejaria a afetação da saúde humana, a flora e a fauna. Outro exemplo é o art. 60 do mesmo diploma, que não estabelece em quais casos é ilegal construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar obras ou serviços potencialmente poluidores, indicando apenas que estará caracterizado o crime se a conduta ocorrer “contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes”. 

A preponderância de normas penais em branco dentro da Lei de Crimes Ambientais ocasiona dois problemas principais, relacionados à insegurança jurídica, para as empresas que buscam atuar em território nacional. 

Por um lado, nem sempre a jurisprudência pátria é tão rígida em relação à constatação da materialidade dos crimes ambientais quanto foi o julgado do TJ/SP em referência. Não é incomum que se depare com denúncias e até sentenças em que não há comprovação ou mesmo indicação ao dispositivo legal ou regulamentar infringido, cabendo à defesa fazer um juízo de abstração para que possa rebater as alegações contra ela formuladas. 

De outro, como a lei penal não especifica qual seria a complementação adequada para cada tipo penal, o trabalho de prevenção é também dificultado. A legislação ambiental brasileira é extremamente extensa, complexa e confusa, havendo leis nacionais, estaduais e municipais que se complementam, sobrepõem e até contrariam. Isso gera problemas especialmente para aquelas empresas que se estendem por mais de uma cidade ou estado e acabam tendo conhecimento de determinados dispositivos apenas quando acionadas pelo Poder Judiciário, seja na seara administrativa, cível ou criminal. 

Assim, é de extrema importância que um trabalho de adequação às normas administrativas seja realizado e mantido constantemente atualizado, especialmente no que toca a normas e regulamentos regionais. Para remediação, enquanto não há respaldo defensivo legal ou jurisprudencial, resta torcer para que a jurisprudência siga a orientação do acórdão do TJSP inclusive em casos que envolverem pessoa jurídica, para que a norma penal em branco não perpetue como um instrumento de autoritarismo e poder. 

João Daniel Rassi
Sócio da SiqueiraCastro.

Beatriz Trevisan
Sócia da SiqueiraCastro.

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