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Alegação de justa causa para rompimento de contrato de representação comercial é rechaçada pelo STJ

O que se tira de lição, através da análise do acórdão proferido no julgamento em menção, é que a tentativa de alegar justa causa na rescisão do contrato de representação comercial, não será bem aceita pelo Poder Judiciário.

17/1/2022

(Imagem: Arte Migalhas)

Não é novidade para os advogados atuantes na área de Contencioso Cível e Práticas Contratuais que o Contrato de Representação Comercial é encarado com enorme apreensão, justamente pelo fato desta modalidade contratual representar enorme passivo oculto, caso venha a ser rescindido pelas partes contratantes.

Por ser contrato típico, regulado por lei própria (lei 4.886/65), possui particularidades bastante específicas sobre a sua gestão, seja no que diz respeito aos direitos, deveres e obrigações atinentes a cada uma das partes, que precisam estar descritos na minuta contratual, seja nos reflexos que uma ruptura abrupta pode acarretar, em termos de multas e indenizações decorrentes desta rescisão.

Em verdade, basta uma simples leitura do artigo 27 da mencionada lei para se entender que a preocupação aviltada pelos especialistas tem fundamento: em caso de rescisão do contrato, sem justa causa, a parte representada terá de efetuar o pagamento de indenização ao representante, calculada em 1/12 sobre a somatória de toda a remuneração recebida, durante toda a duração contratual, sem contar o pagamento de multa pela rescisão antecipada. A situação se agrava, ainda mais, se a rescisão não houver sido comunicada previamente.

Por estas razões, este tipo de contrato e, mais ainda, os impactos econômicos advindos de sua rescisão constituem objeto de milhares de ações em franca tramitação nos Tribunais pátrios, justamente para se entender, caso a caso, as evidências de uma ruptura contratual por justa causa, que pudesse liberar a parte representada do pagamento das indenizações previstas na lei em comento.

No mais recente debate jurisprudencial sobre o tema, travado perante o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de Recurso Especial 1.838.752/SC discutiu-se sobre questões bastante específicas para a configuração de justa causa – ou não – para a rescisão de Contrato de Representação Comercial, na tentativa de evitar-se o pagamento da indenização elencada no artigo 27 da lei de Representação Comercial.

Buscava-se aclaramento judicial para entender se a recusa na assinatura de Termo Aditivo, prevendo a diminuição de alguns dos direitos advindos da representação pactuada, configurava justa causa para a rescisão do Contrato de Representação Comercial e, via de consequência, a inexistência do dever de pagar a indenização de 1/12 sobre a somatória das comissões auferidas durante toda a vigência da relação comercial (que perdurou por mais de 22 anos).

Na ocasião do julgamento, decidiu-se que a negativa na assinatura do Termo Aditivo, por parte da representada, não configuraria justa causa para a rescisão, tal qual sustentado pela representante, já que a notória redução dos direitos advindos da representação, tanto no que diz respeito à retirada de exclusividade, redução de área de atuação, demonstrariam mais o interesse em se buscar a rescisão do contrato, de maneia indireta, sem a necessidade de pagamento das indenizações legalmente previstas, do que o nítido interesse em reconfigurar a representação comercial em si.

Além disso, os ministros da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça pontuaram que a própria lei 4.866/65 determina que todas as obrigações das partes devem estar elencadas no contrato, de modo que, como no primeiro instrumento pactuado entre as partes não havia a previsão de que a representante teria que assinar aditivo contratual, com redução de direitos, no futuro, não haveria razão para se configurar como justa causa a sua recusa na assinatura das novas cláusulas que diminuíam seus direitos.   

O resultado do julgamento do Recurso Especial 1.838.752/SC dispara o alerta para as empresas e para os advogados militantes na área, que buscam minimizar riscos futuros, ou até mesmo estancar o aumento de um passivo oculto decorrente de contratos de representação comercial ativos, seja através da renegociação de cláusulas outrora contratadas, seja através da assinatura de termos aditivos.

Não se pretende, por óbvio, manter os contratos de representação comercial vigentes sob a proteção do manto da eternidade de suas cláusulas, já que podem representar um passivo altíssimo para os caixas das empresas representadas. Por princípio, ninguém será obrigado a manter-se contratado com o outro, caso não mais o deseje.

O que se tira de lição, através da análise do acórdão proferido no julgamento em menção, é que a tentativa de alegar justa causa na rescisão do contrato de representação comercial, através de manobras contratuais de alteração dos termos da originalmente pactuados, com notória redução de direitos dos representantes - que vêm sendo replicadas por grande parte do empresariado - não será bem aceita pelo Poder Judiciário.

Janaína De Castro Galvão
Especialista em direito processual e empresarial, advogada da área Cível e Resolução de Conflitos da Innocenti Advogados.

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